A Avaliação de Descapacidade ou do Dano Corporal: Um problema de ética

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas193-201

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1 Introdução

Realizar uma avaliação, em qualquer área, nunca é uma tarefa fácil.

Mais difícil, ainda, é quando se trata de proceder à determinação de um dano corporal que origina deficiências permanentes que levam à descapacidade física ou funcional do examinado.

O profissional avaliador convive, todos os dias, com desafios oficiais quando enfrenta decisões éticas que poderiam alterar, drasticamente, o curso de sua carreira e da vida dos examinados.

Emitir um Parecer ou lavrar um Laudo leva ínsito o conceito de tomar uma decisão. E tomar decisões, em última instância, nada mais é do que enfrentar e solver dilemas.

Com efeito, deve-se ter presente que ao profissional guindado a Avaliador – Médico, Odontólogo ou outro –, além do amplo conhecimento exigido na área científica em que atua, lhe é imposto (e a maioria das vezes ele não sabe disso, nem nunca lhe foi informado) um pesado ônus ético e moral.

O leitor menos avisado pode, em um primeiro impulso, questionar:

• o que é que tem a ver realizar uma avaliação médico-legal, ou odonto-legal, com a ética ou com a moral ?

• isso não é algo fosfórico, que apenas serve para “enrolar” e fazer aparecer o trabalho como mais complicado do que ele realmente é ?

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Aquele profissional por cuja cabeça tenham passado esses pensamentos, mesmo que seja em forma de flash, pense bem, pense duas vezes, se pretende e se tem condições de ser um Perito.

Por quê ?

Porque se o Perito tem princípios e valores para decidir, avaliar e julgar então, necessariamente, está submetido ao campo da Ética.

E por que a moral está sendo mencionada ?

Porque a Moral nada mais é do que a aplicação, na prática, “in concreto”, dos princípios éticos.

2 Ética e moral

Por mais que os humanos sejam seres gregários, isto é, que tendem, naturalmente, a viver em sociedade, a História demostra que, desde a Antiguidade, a convivência grupal não tem sido fácil. Daí a necessidade de estabelecer regras para impor limites naturais a essa convivência. E essa foi uma tarefa que exigiu séculos até os filósofos normatizarem o conjunto de princípios, normas e regras que deveriam ser seguidos para que se estabelecesse um relacionamento entre os valores morais e a conduta humana, conjunto esse que se transformou num ramo da filosofia: a Ética, a partir do ethos (costume), extraído da maneira concreta de viver, vigente na sociedade.

Em Grécia, na época clássica, Aristóteles (Estagira, 384 a.C.
– Atenas, 322 a.C.) doutrinou sobre a Ética, discutindo as ideias de seu mestre Platão, apenas passando do idealismo para o realismo: a ideia fundamental de Aristóteles, tanto quanto para seu mestre Platão, era o Bem Supremo. E esse bem supremo era identificado com a felicidade ou eudemonia (em grego). Mas a felicidade não como uma forma abstrata, ideal, mas “a felicidade como uma forma de viver bem e conduzir-se bem em convivência”.

A Ética, pois, é o conjunto de princípios teóricos e valores da nossa conduta na vida comunitária. É aquilo que orienta a capacidade de decidir, julgar e avaliar com autonomia.

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Mantendo-nos fiéis à finalidade desta obra e para sermos práticos – adotando o pragmatismo de Cortella (2014) –, devemos ter presente que a Ética é um conjunto de princípios e valores que Perito (bem como qualquer ser humano autônomo e livre) usará para responder, na execução do seu mister, as três grandes perguntas da vida humana: Quero ? Devo ? Posso ?

Olhando desde esse ponto de vista, resulta fácil compreender que a Ética, conquanto seja algo comum aos seres humanos, ela é personalíssima, isto é, cada pessoa tem a sua ética, seu conjunto de princípios, e age em consequência dos mesmos.

Pode acontecer, entretanto, que a ética de alguém contrarie os princípios éticos que um grupo de pessoas compartilha e aceita. Diz-se, então, que essa pessoa é antiética, o que não quer dizer que “não tenha ética”, e sim apenas que seu conceito de ética não é o mesmo que o daquele grupo.

E o que é a moral do Perito ?

Como...

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