As relações de gêneros e os sujeitos que atuavam, atuam, no comércio de drogas ilícitas

AutorAndré Masao Peres Tokuda - Wiliam Siqueira Peres
CargoDoutorando pela Universidade Estadual Paulista 'Júlio de Mesquita Filho' em Assis, SP, Brasil - Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Páginas104-124
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.15, n.2, p.104-124 Mai.-Ago. 2018
ISSN 1807-1384 DOI: 10.5007/1807-1384.2018v15n2p104
Artigo recebido em: 18/04/2017 Aceito em: 21/12/2017
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons
AS RELAÇÕES DE GÊNEROS E OS SUJEITOS QUE ATUAVAM, ATUAM, NO
COMÉRCIO DE DROGAS ILÍCITAS
André Masao Peres Tokuda
1
Wiliam Siqueira Peres
2
Resumo:
Este artigo visa problematizar sobre a interferência das relações de gêneros,
especificamente as masculinidades, na busca dos sujeitos pelo comércio de drogas
ilícitas. Utilizamos o método cartográfico para mapear as histórias existenciais de oito
pessoas que estavam presas, problematizando sobre as experiências vividas por
essas até serem condenadas no art. 33 do Código Penal brasileiro. Com os resultados
das cartografias pode-se colocar que são múltiplas as linhas que interferem na entrada
no comércio de drogas, no entanto as relações de gêneros tiveram destaque, a
necessidade de se provar “homem de verdade” foi um dos fatores mais presentes nas
falas dos participantes. Assim, discutimos a necessidade da Psicologia se distanciar
de posicionamentos limitados, por exemplo, de que as ações infracionais tenham suas
causas em patologias, ou somente é uma questão de desigualdade social, sendo mais
problematizadora das diversas linhas que atravessam e constroem os sujeitos.
Palavras-chave: Psicologia Social. Comércio de drogas. Masculinidade. Psicologia
Jurídica. Gênero e Sexualidade.
1 INTRODUÇÃO
Este artigo é resultado de pesquisa de iniciação científica, que teve apoio da
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Nesse trabalho
problematizamos sobre a entrada dos sujeitos no comércio
3
de drogas ilícitas - cabível
de aprisionamento no art. 33 da Lei n. 11.323/06, que instituiu o Sistema Nacional de
Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) - a partir de revisão bibliográfica e de
entrevistas realizadas com oito pessoas do sexo masculino que estavam presas em
uma unidade penitenciária de regime fechado no estado de São Paulo, sentenciadas
com base no artigo citado acima.
1
Doutorando pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" em Assis, SP, Brasil. E-
mail: andremasao@hotmail.com
2
Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Pós-Doutorado em
Psicologia e Estudos de Gênero pela Universidade de Buenos Aires , Argentina. Professor na
Graduação e Pós-graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho,
em Assis, SP, Brasil E-mail: pereswiliam@gmail.com
3
Com a leitura de “A cidade nas fronteiras do legal e ilegal” de Vera da Silva Telles (2010), acreditamos
que a utilização do termo comércio de drogas ilícitas fica mais apropriado do que tráfico, pois partimos
do pressuposto que apesar de ser considerada uma atividade ilícita, é vista como um trabalho, muitas
vezes ficando no imaginário de algumas pessoas como uma pequena ilegalidade, um bico contra o
desemprego e trabalhos mal pagos.
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De início, vale colocar a importância de artigos e pesquisas neste campo,
devido ao fato de parte da população viver, atualmente, com sentimentos de
insegurança e medo, em decorrência das notícias sobre as altas taxas de crimes que
são vinculadas pela “mass media”, essa também ajuda no processo de criminalização
das pessoas de baixa renda, pois em sua grande maioria as notícias apontam
territórios ocupados por essa população como de alta periculosidade, ou são
colocados como “berço da criminalidade”, não problematizando a desigualdade
econômica e social e as estruturas de gêneros e sexualidades existentes em nosso
país, sendo variáveis importantes para o cometimentos de crimes e atos de violência.
O medo e a violência estão presentes em todas as classes sociais e
econômicas, seja pelo receio da violência cometida por assaltantes, que é explorado
pela “mass media”, ou, em muitos casos (principalmente na classe pobre e com
pessoas negras), temor com a violência das instituições do Estado (polícia), que são
poucos ou quase não mostrados em emissoras de televisão, ou jornais
(FEFFERMANN, 2006; FIORELLI; MANGINI, 2012; 2008; LIMA, 2009).
Assim, a partir dessas discussões buscamos problematizar o que pode levar o
sujeito ao comércio de drogas, iniciando o projeto de pesquisa pela revisão
bibliográfica. Deste modo, podemos apontar que muitas hipóteses foram e são criadas
sobre o cometimento de atos criminais, nos quais diversos parâmetros são apontados:
biológicos (o fator genético, neurológico, bioquímico e psicofisiológicos), psicológicos
e sociais, que para alguns pesquisadores é somente uma característica da sociedade
contemporânea (GARLAND, 2008; SERAFIM, 2003). Feffermann aponta que:
As razões e forma de ingresso no tráfico de drogas são numerosas e estão
relacionadas também com as histórias individuais destes jovens. O fato é que
o tráfico é uma oferta cotidiana a estes jovens, a escolha disponível. (2006,
p. 237).
Segundo Feffermann (2006), muitos sujeitos e o próprio Estado apontam as
famílias como os grandes culpados pelo o aumento da violência, criando a ideia de
“famílias desestruturadas”, servindo apenas como forma de estigmatizar composições
familiares que fogem da ideia da burguesia, de “família nuclear” e “família normal”.
Por outro lado, Jean Bergeret (1990) apresenta a teoria da “violência
fundamental”, tomando-a como pulsão que gera energia, ela é canalizada pelas
pulsões libidinais para objetos e objetivos definidos (o que se aproxima com a teoria
de Freud (1996) sobre a sexualidade, na qual aponta que exista um desvio das
energias sexuais das metas sexuais). De acordo com essa leitura, quando tal energia

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