Anamatra como frente de luta

AutorHugo Cavalcanti de Melo Filho
Páginas141-142
18.
AnAmAtrA Como frente de lutA
Hugo Cavalcanti de Melo Filho
(1)
(1) Juiz do Trabalho, Titular da 12ª Vara do Trabalho do Recife (TRT da 6ª Região). Graduado em Direito pela Universidade Federal de
Pernambuco (1991). Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco (2002). Doutor em Ciência Política pela
Universidade Federal de Pernambuco (2013).
Não há uniformidade na doutrina trabalhista quando
o assunto é a função do Direito do Trabalho. Há quem en-
tenda que seria a harmonização entre o capital e o traba-
lho. Outros sustentam que a função do Direito do Trabalho
seria a emancipação da classe trabalhadora. Discordo de
tias concepções. A harmonização entre o capital e o traba-
lho não é possível, dado o antagonismo insuperável que
preside a relação. Por outro lado, o Direito do Trabalho,
infelizmente, não dá conta de emancipar a classe trabalha-
dora, no modelo de produção capitalista. A rigor, apenas a
superação do padrão salário, com a socialização dos meios
sociais de produção poderia promover tão profunda e ra-
dical transformação.
Sendo, o Direito do Trabalho, como é produzido nos
marcos do institucionalismo burguês, constitui, na verda-
de, instrumento de dominação de classe, verdadeira chan-
cela estatal à exploração do trabalho pelo capital.
Ainda que possa parecer paradoxal, o Direito do Traba-
lho, por eu caráter interventor no âmbito da autonomia da
vontade, cumpre um papel relevante no modelo capitalista
de produção, porque se, a um tempo, regula a exploração
do trabalho e a apropriação da mais-valia, a outro, impõe
limite a esta exploração, em permanente busca da fixação
de parâmetros civilizatórios na relação naturalmente de-
sequilibrada entre capital e trabalho. A função do Direito
do Trabalho, portanto, é delinear contornos de dignidade
para o trabalhador, o que faz com maior ou menor eficácia,
em cada momento histórico e em cada ambiente. Aí está a
relevância da defesa dos mais elevados níveis de tutela, o
fundamento da luta contra a desregulamentação e a flexi-
bilização das relações sociais.
No período de 2001 a 2003, em que presidi a Asso-
ciação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho –
Anamatra, o Brasil atravessava um período de forte pressão
do capital no sentido da flexibilização. Ainda no ano de
1996, o governo brasileiro, num gesto inusitado, denun-
ciou a Convenção n. 158 da Organização Internacional do
Trabalho, ratificada pelo Brasil doze anos antes, eu tratava
da garantia contra a dispensa arbitrária ou sem justa casa
e previa indenização compensatória par o trabalhador des-
pedido nestas hipóteses.
Com a Lei n. 9.601, de janeiro de 1998, foram am-
pliadas as possibilidades de contratação a prazo. O mesmo
diploma instituiu o chamado banco de horas, com o que
foi estabelecido o prazo de compensação do excesso de
jornada para até um ano, sem pagamento do adicional de
horas extraordinárias.
No mesmo ano de 1998, a Medida Provisória n. 1.709
criou o contrato de trabalho com jornada de tempo parcial,
mediante remuneração proporcional à duração semanal da
jornada. Também em 1998, foi inserida a hipótese de sus-
pensão temporária coletiva do contrato de trabalho, diante
de causas econômicas ou reorganização ou crise da empre-
sa. A Emenda Constitucional n. 20, de 1998, restringiu o
benefício do salário-família aos trabalhadores considera-
dos de baixa renda.
Já em 2000, a Lei n. 9.958 instituiu as Comissões de
Conciliação Prévia, mecanismo alternativo de resolução
de conflitos trabalhistas, que se revelou um fator perverso
de fraude dos direitos dos trabalhadores. No mesmo ano,
a Emenda Constitucional n. 28, equiparou o trabalhador
rural ao urbano, no que concerne ao prazo prescricional,
reduzindo significativamente as possibilidades de cobran-
ça judicial de direitos sonegados aos rurícolas.
Além disso, a ideia fixa de desregulamentar as relações
de trabalho de forma definitiva foi acelerada a partir de 1995.
O propósito inicial era o de transformar os direitos trabalhis-
tas garantidos constitucionalmente em itens de negociação
coletiva. Em novembro de 1998, foi enviada ao Congresso
Nacional Proposta de Emenda Constitucional para alterar o
art. 7º da Constituição, a fim de que a matéria negociada
pelos atores sociais prevalecesse sobre a norma positivada.
Como não houve espaço político para a alteração ra-
dical, em nível constitucional, principalmente em face do
quórum qualificado exigido para a aprovação de emendas
à Constituição, o governo resolveu trilhar o caminho fácil
da lei ordinária: uma singela alteração e um único artigo
da CLT, com efeito praticamente idêntico, a prevalência do
negociado sobre o legislado. Foi o PL n. 5.483/2001, apro-
vado na Câmara dos Deputados ao custo de mais de seis
milhões de reais, distribuídos entre parlamentares e dóceis
sindicalistas, conforme noticiaram os jornais da época.

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