Constituição e ambiente: Errância e simbolismo

AutorCarla Amado Gomes
CargoProfessora Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Páginas9-29
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Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.9 n.17 p.9-29 Janeiro/Junho de 2012
RESUMO
O texto faz um balanço de 30 anos de vigência do artigo ambiental da Cons-
tituição Portuguesa de 1976 (artigo 66) e suas implicações na evolução do
tecido legislativo, apontando debilidades e propondo algumas alterações.
Palavras-chave: Direito ao ambiente. Ambiente. Dano ecológico. Proteção
constitucional do meio ambiente.
CONSTITUTION AND ENVIRONMENT:
Wandering and symbolism
ABSTRACT
TThis paper analyzes 30 years of the Environmental Article of the Portu-
guese Constitution of 1976 (Article 66) and its implications for the evolu-
tion of the legislative text as it points out weaknesses and proposes some
changes.
Key words: Environmental Law. Environment. Ecological Damage. Cons-
titutional Protection of the Environment.
CONSTITUIÇÃO E AMBIENTE:
Errância e simbolismo*
Carla Amado Gomes
Professora Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Professora Convidada da Faculdade de Direito da Universidade
Nova de Lisboa - Portugal.
End. Eletrônico: carlamadogomes@fd.ul.pt
* Este artigo foi escrito para assinalar a passagem de 30 anos sobre a entrada em vigor da Constituição
de 1976. A ideia surgiu a propósito de uma breve intervenção que tivemos na mesa redonda do 2º
Encontro Luso-Brasileiro de Direito Constitucional (a convite do Sr. Prof. Doutor Jorge Miranda),
promovido pelas Associação Portuguesa de Direito Constitucional e Associação Pimenta Bueno,
realizada na Faculdade de Direito de Lisboa no dia 27 de janeiro de 2006, subordinado ao tema
Ambiente e Constituição.
CONSTITUIÇÃO E AMBIENTE: Errância e simbolismo
10 Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.9 n.17 p.9-29 Janeiro/Junho de 2012
1 INTRODUÇÃO
O acolhimento do valor Ambiente pela ordem jurídica constitu-
cional debuta em Portugal pela mão da Constituição de 1976. Com efeito,
se é verdade que na Constituição de 1822 o artigo 223º/V apontava para a
necessidade de as Câmaras Municipais procederem ao plantio de árvores
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positivo mais do que um incentivo ao desenvolvimento rural1. Do mesmo
modo se deve descartar qualquer intenção ecológica no artigo 52 da Cons-
tituição de 1933, no qual se apelava à proteção dos “monumentos natu-
rais”: a disposição visava a preservação do patrimônio cultural2 e, quando
muito, tinha subjacente uma perspetiva estética da natureza. O artigo 66
da Constituição de 1976 foi, com efeito, o primeiro artigo ambiental no
panorama constitucional português.
Aproveite-se, no entanto, para sublinhar a tendencial irrelevân-
cia constitucional da consagração da tarefa de conservação e promoção
ambiental, de duas perspetivas. Por um lado, há importantes exemplos de
Estados que prosseguiram e prosseguem políticas de proteção do ambiente
sem terem alçado tal objetivo ao nível constitucional: desde logo, os Es-
tados Unidos da América, com a aprovação do National Environmental
Policy At, em 1969 (mais conhecido por NEPA), suporte da primeira atua-
ção dos poderes públicos concertada em sede ambiental — Estado que não
aproveitou nenhum dos vinte e seis aditamentos para incorporar a proteção
do ambiente na idosa Constituição de 17873. Mas também a Alemanha,
que, desde o início da década de 1970, vem desenvolvendo uma consistente
política ambiental, só “formalmente” acolhida na lei Fundamental de Bona
na revisão constitucional de 1994, da qual nasceu o artigo 20A4. Ou ainda,
embora menos representativo, o caso do Brasil, que aprovou em 1981 a Lei
6.938, de 31 de agosto, pioneira na abordagem transversal e integrada das
questões ambientais, tendo vindo a reconhecer formalmente a importância
da proteção do ambiente no artigo 225 da Constituição de 1988. Estes são
1Na opinião de MIRANDA (2000, p. 534), a tutela constitucional ambiental teria na Constituição de
1822 esse “curioso” antecedente.
2 Cf. o Acórdão do STA de 15 de janeiro de 1960, in Col. Ac. STA, 1960, p. 55 segs.
3 A seção 101. c) do NEPA reconhece a todos os cidadãos o direito a desfrutar de um ambiente saudável
e incumbe-lhes a responsabilidade de contribuir para a conservação do meio ambiente. Embora tenha
havido algumas tentativas de introduzir o direito ao ambiente na Constituição Federal, todas se gora-
ram até agora Cf. CARBALLEIRA RIVERA, 1995, p. 511 segs, 516 segs.
4 Sobre o artigo 20A, SCHULZE-FIELITZ, 2000, p. 69 segs, passim.

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