Administrativo e Constitucional

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MINISTÉRIO PÚBLICO, NO EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL, PODE TER ACESSO A ORDENS DE MISSÃO POLICIAL

Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial n. 1.365.910/RS Órgão Julgador: 2a. T.

Fonte: DJ, 28.09.2016

Relator: Ministro Mauro Campbell Marques

EMENTA

Administrativo. Constitucional. Recurso especial. Mandado de segurança. Controle externo da atividade policial pelo ministério público. Arts. 129, VII, da CF e 9º, II, da LC n. 75/1993. Ordem de missão policial (OMP). Atividade-fim policial configurada. Recurso es-pecial parcialmente provido.

  1. No caso concreto, o Ministério Público Federal impetrou mandado de segurança contra ato ilegal do Delegado-Chefe da Delegacia de Polícia Federal em Santo Ângelo, que teria obstado, em razão dos termos da Resolução 1ª da Polícia Federal, a disponibilização de documentos e informações requisitados pelo Parquet Federal no exercício da atividade de controle externo da atividade policial, especificamente:

    1. relação de servidores e contratados em exercício na unidade, com especi-ficação daqueles atualmente afastados (em missão, reforço, operação, etc.); b) relação de coletes balísticos da unidade (especificando os vencidos e os dentro do prazo de validade); c) pasta com or-dens de missão policial (OMP) expedidas nos últimos 12 (doze) meses; d) os seguintes livros (relativos aos últimos 12 meses): sindicâncias e procedimentos disciplinares.

  2. O Parquet Federal, nesta Cor-te Superior, apresentou petição (fis. 575/579) na qual noticiou que, dentre os pedidos de acesso aos documentos e informações formulados no mandado de segurança e que haviam sido obstados pelo órgão policial, "o único ponto que ainda apresenta resistência da Polícia Federal é a prestação de informações e apresentação dos documentos relativos às ordens de missão policial" (OMP)".

  3. Assim, no tocante aos pedidos es-pecificados nas alíneas a, b e d acima indicadas, deve ser reconhecido que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal não mais divergem sobre a possibilidade de requisição de tais informações. Além disso, é necessário consignar que o Ministério Público também exerce a ampla fiscalização da adminis-tração pública, inclusive da Polícia Federal, por meio da Lei de Improbidade Administrativa, entre outras normas de controle administrativo.

  4. No tópico remanescente do pe-dido inicial, indicado no item c (pasta de ordens de missão policial - OMP), o principal ponto a ser examinado na presente controvérsia passa pela análise do conceito de atividade-fim policial.

  5. O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público está previsto expressamente no art. 129, VII, da Constituição Federal e disciplinado na Lei Complementar 75/93.

  6. A ordem de missão policial (OMP) é um documento de natureza policial e obrigatório em qualquer missão de policiais federais e tem por objetivo, entre outros, legitimar as ações dos integrantes da Polícia Federal em caráter oficial. As denominadas ordens de missão policial, relacionadas à atividade de investigação policial, representam direta intervenção no cotidiano dos cidadãos, a qual deve estar sujeita ao controle de eventuais abusos ou irregularidades praticadas por seus agentes, ainda que realizadas em momento posterior, respeitada a necessidade de eventual sigilo ou urgência da missão.

  7. Por outro lado, a realização de qualquer investigação policial, ainda que fora do âmbito do inquérito policial, em regra, deve estar sujeita ao controle do Ministério Público. Importante consignar que tal atividade, por óbvio, não está sujeita a competência fiscaliza-tória do Tribunal de Contas da União ou da Controladoria-Geral da União, como afirmado pela Corte de origem.

  8. O Conselho Nacional do Minis-tério Público - CNMP, com o objetivo de disciplinar o controle externo da atividade policial pelo Ministério Público, editou a Resolução n. 20/2007, e estabeleceu nos arts. 2º, V e 5º, II, respectivamente: "O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público tem como objetivo manter a regularidade e a adequação dos procedimentos empregados na execução da atividade policial, bem como a integração das funções do Ministério Público e das Polícias voltada para a persecução penal e o interesse público atentando, especialmente, para: a correção de irregularidades, ilega-

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    lidades ou de abuso de poder relacionados à atividade de investigação criminal"; "Aos órgãos do Ministério Público, no exercício das funções de controle externo da atividade policial caberá: ter acesso a quaisquer documentos, informatizados ou não, rela-tivos à atividade-fim policial civil e militar, incluindo as de polícia técnica desempenhadas por outros órgãos (...)" (sem destaques no original).

  9. Portanto, é manifesto que a pasta com ordens de missão policial (OMP) deve estar compreendida no conceito de atividade-fim e, consequentemente, sujeita ao controle externo do Ministério Público, nos exatos termos previstos na Constituição Federal e regulados na LC 73/93, o que impõe à Polícia Federal o fornecimento ao Ministério Público Federal de todos os documentos relativos as ordens de missão policial (OMP).

  10. Provimento parcial do recurso especial.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o se-guinte resultado de julgamento:,

    "Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Og Fernandes, dando parcial provimento ao recurso, a Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Mauro Campbell Marques. Vencidos o Sr. Ministro Humberto Martins e a Sra. Minis-tra Eliana Calmon."

    Votaram com o Sr. Ministro Mauro Campbell Marques os Srs. Ministros Herman Benjamin e Og Fernandes.

    Brasília (DF), 05 de abril de 2016.

    MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, Relator

    Cuida-se de recurso especial inter-posto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, com fundamento no art. 105, inciso III, alínea "a", da CF, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim ementado (?. 428, e-STJ):

    "Administrativo e constitucional. Atividade policial. Controle externo pelo ministério público federal. Resolução 01/2010 do Conselho Superior de Polícia.

    . Hipótese em que não se veri? ca a perda superveniente de objeto do mandado de segurança, pois a pretensão do impetrante permanece no que se refere a um dos pedidos formulados na inicial.

    . As normas que disciplinam as relações entre o Ministério Público e a Polícia Judiciária devem ser interpretadas de forma sistemática e teleológica, de acordo com sua racionalidade e objetivos próprios.

    . O controle externo do Ministério Público visa a assegurar a efetiva ? sca-lização do Parquet na atividade investigativa, de modo a garantir a legalidade dos atos, a preservação dos direitos fundamentais e a e? ciência do material colhido para a formação da opinio delicti. Esse controle está inserido no sistema de freios e contrapesos existente entre os Poderes e instituições para garantia do sistema acusatório.

    . Incabível a ingerência do Ministério Público na organização interna da polícia.

    . Reconhecida a legalidade da Resolução n. 01, de 26 de março de 2010, do Conselho Superior de Polícia.

    . Apelação e remessa o? cial provi- das".

    Os embargos de declaração opostos pelo ora recorrente foram providos ape-nas para fins de prequestionamento (fis. 444/445, e-STJ).

    Nas razões do recurso especial, o recorrente aponta ofensa e negativa de vigência do art. 9º da Lei Complementar 75/1993, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Mi-nistério Público da União (fis. 452/460, e-STJ).

    Narra que, visando à documentação necessária para inspeção a ser realizada no exercício do controle externo da Polícia Federal, o MPF impetrou mandado de segurança contra ato de Delegado da Polícia Federal de Santo Ângelo/RS, porquanto tal autoridade policial lhe negou o acesso aos seguintes documentos:

    (I) relação de servidores e contratados em exercício na unidade, com especi-ficação daqueles atualmente afastados (em missão, reforço, operação, entre outros); (II) relação de coletes balísti-cos da unidade, discriminando-se os vencidos e os dentro do prazo de vali-dade; (III) pasta com ordens de missão policial (OMP) expedidas nos últimos 12 (doze) meses; e (IV) livros relacio-nados a sindicâncias e procedimentos disciplinares realizados nos últimos 12 (doze) meses.

    Aduz que, não obstante a concessão da segurança pelo Juízo de primeiro grau, a Corte regional deu provimento à apelação interposta pela União, a fim de denegar a ordem.

    Acresce que o acórdão recorrido violou o art. 9º da Lei Complementar 75/1993, haja vista que a mera requisição dos aludidos documentos, além de concretizar o poder-dever fiscalizatório do Ministério Público, é medida preliminar para averiguação do âmbito da ingerência que, porventura, mostre-se cabível.

    Sustenta ser ilegal a Resolução 1/2010 do Conselho Superior de Polícia, por limitar os recursos de que dispõe o Parquet para promover a fiscali-zação policial externa.

    Em contrarrazões, a UNIÃO argumenta que os documentos requisitados pelo recorrente não se compreendem naqueles destinados à atividade-fim da Polícia Federal, motivo pelo qual não podem ser objeto do controle externo da atividade policial pelo Parquet (fis. 486/493, e-STJ).

    Juízo de admissibilidade positivo na origem (fis. 509/510, e-STJ).

    Apresentados memoriais pelo recorrente, nos quais reitera as razões re-cursais (fis. 559/568, e-STJ).

    É, no essencial, o relatório.

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    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO HUM-BERTO MARTINS (Relator):

    A controvérsia cinge-se a saber se os seguintes documentos requisitados pelo Ministério Público Federal à Delegacia de Polícia Federal de Santo Ângelo/RS seriam passíveis de controle externo por parte da instituição minis-terial:

    (I) relação de servidores e contrata-dos em exercício na unidade, com...

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