Relação do Inciso XXVII do Art. 7ºda Constituição com o Programa Seguro-Desemprego: para Propor Aperfeiçoamentos ou Política Independente

AutorAlan da Silva Esteves
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho/TRT 19. Mestre em Direito Público. Especialista em Direito Constitucional do Trabalho. Professor da Escola Judicial do TRT/19. Professor da Escola da Magistratura ? Ematra/19
Páginas139-165

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5.1. Notas introdutórias

No capítulo precedente, foram estudadas diversas políticas públicas com ênfase no Programa Seguro-Desemprego. Todas estabelecem renda que gera trabalho, emprego, mas que venham acompanhadas de qualificação social e profissional.

Proteger o trabalhador na era da informação, conhecimento e tecnologia envolve reflexões de que todos os programas de geração de emprego e renda têm utilidade para dar eficácia ao inciso XXVII do art. 7º da Constituição Federal, que preceitua o direito de o trabalhador ser protegido em face da automação. Isso é perceptível, pois esse âmbito exige, por exemplo, qualificação ou novo perfil do trabalhador. E melhor que isso se vierem acompanhadas de uma renda, crédito, benefício, ou que dialogue com os empregadores.

Caso elas se reestruturem para uma interação funcional, melhor ainda em termos de eficácia e efetividade do direito social ao trabalho. Nesse itinerário, é

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preciso identificar qual das políticas sociais identifica-se melhor com o referido dispositivo e se pode haver uma integração delas.

Realmente, é desconcertante fazer várias espécies de qualificação e ouvir que não há vagas no mercado, ou o empregador declarar que tais e tais qualificações não lhe servem para ocupação da vaga aberta.

A forma lógica para o desenho de uma política pública que proteja o trabalhador na era da informação, conhecimento e tecnologia e que é fator decisivo para sua eficácia e efetividade é o uso dos avanços tecnológicos para treinar a mão de obra e mudar a forma de organizar a comunicação entre trabalhadores e empregadores. Como isso pode ser feito? O que o Estado pode fazer?

Nesse contexto de revolução tecnológica que funda as bases de uma nova economia, o trabalho não é mais o mesmo, mas ganha como fonte de inovação pela interação entre tecnologia, instituições e economia. A ênfase está no perfil profissional que se deseja nas sociedades informacionais, por isso falar-se tanto em qualificação, treinamento, reciclagem.

Com efeito, isso é exatamente o que se quer de um programa público na área de trabalho, emprego e renda, ao laborar o conceito do novo trabalhador: gerar possibilidades de emprego. As características mais visíveis são citadas por Castells com base em estudos abrangentes de Douglas Massey e coautores: há a mobilidade de mão de obra em todas as regiões do mundo, e na maioria dos países.1

Cada rodada de impacto maciço de tecnologias sobre o trabalho provoca te-mores nos empregados. Então, é necessário encontrar uma política compatível com o enunciado do inciso XXVII do art. 7º da Constituição Federal, ou propor uma que, interagindo com outras, possa dar eficácia ao enunciado.

5.2. Relação do inciso xxvii do art 7º com o programa seguro-desemprego e necessidade de integração

Apesar de todos os programas públicos de geração de trabalho, emprego e renda terem algum sentido de proteção do trabalhador contra o desemprego, aquele que mais tem identidade com o inciso XXVII do art. 7º é o Programa Seguro--Desemprego, por três motivos, quais sejam: (1) históricos; (2) de interpretação constitucional; e (3) de regulamentação administrativa da Política. Eles foram necessariamente estudados para uma necessidade de interpretação e compatibilização com o referido dispositivo constitucional.

Somente para recordar: viu-se que o aludido Programa trabalha com três políticas dentro de uma, quais sejam: renda por certo período, colocação ou inter-mediação de mão de obra e qualificação social e profissional. É uma mistura de distribuir renda e fazer serviços.

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A partir daí relacionam-se as razões históricas da origem da regra que enuncia o direito de o trabalhador ser protegido em face da automação. O legislador constituinte e legisladores posteriores tinham em mente, na construção do aludido dispositivo, que o trabalhador se beneficiasse das riquezas da nova era, fosse treinado nas novas tecnologias e que participasse na formulação de programas do seu interesse na área. Basta verificar os estudos no capítulo 2 desta monografia. Os diversos dispositivos legais pensados foram no sentido de dar indenização, renda, participação das classes na discussão dos problemas.

Somente para recordar, outro autor anotou que primitivo dispositivo expressava:2

Art. 7º – As normas de proteção dos trabalhadores obedecerão aos seguintes preceitos, na forma da lei, além de outros que visem à melhoria de seus benefícios: I – participação dos trabalhadores nas vantagens advindas da indução às novas tecnologias; II – Reaproveitamento da mão de obra e acesso a programas de reciclagem prestados pela empresa, sempre que a introdução de novas tecnologias, por ela adotada, importar em redução ou eliminação de postos de trabalho e/ou ofício; III – Participação das organizações dos trabalhadores na formulação de políticas públicas relativas à introdução de novas tecnologias.

Contudo, a Comissão de Sistematização, com apoio do Plenário, adotou a diretriz de que a lei deverá prever proteção dos trabalhadores em face da automação.

O dispositivo queria proteger os trabalhadores de modo geral, até porque a revolução tecnológica não se dá para determinados grupos, mas solicita um novo perfil de trabalhador. Süssekind considera que o dispositivo constitucional foi dirigido aos trabalhadores considerados no sentido amplo.3 Isso já foi mencionado em outro capítulo desta dissertação.

A assertiva é verdadeira e evidenciada pela integração das empresas na economia global, na qual sujeitam a flexibilidade e a adaptabilidade pela incessante inovação tecnológica e por demandas de rápida modificação.4 O significado é que todas as empresas caminham nesses passos largos por questão de sobrevivência, mas os trabalhadores penam por uma correta adaptação.5

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Outra constatação em nível de história que é importante ressaltar é que as ideias de participação dos trabalhadores e reciclagem profissional nunca foram esquecidas pelo próprio legislador constituinte e outros legisladores, ao estabelecerem outros dispositivos que propuseram a regulamentação de dispositivos complementares ou outros de conteúdo regulamentar do inciso XXVII do art. 7º da Carta Magna. Para comprovar o que foi dito:

(1) O § 4º do art. 218 da Constituição trata de estímulos para a empresa que “invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento dos seus recursos humanos e que pratiquem sistemas de remuneração que assegurem ao empregado, desvinculada do salário, participação nos ganhos econômicos resultantes da produtividade do trabalho”;

(2) Outros projetos de lei que tramitaram no Congresso, como do ex-senador Fernando Henrique Cardoso (PSDB/SP), o Projeto de Lei, PL n. 2.902/1992, e outros anexados, os quais expressavam a obrigatoriedade das comissões paritárias para negociar medidas de redução ou minimização dos efeitos da automação, além de medidas de aproveitamento, reciclagem e recolocação de mão de obra;

(3) Projeto do Deputado Eduardo Valverde (PT/RO), o PLP n. 208/2004, em que estabelecia medidas preventivas e compensatórias no caso de inovação tecnológica e automação.6

Outros projetos bastante semelhantes tramitaram no Congresso Brasileiro e todos (a) fazem conexões com os paradigmas mencionados no capítulo precedente – cidadania regulada (qualificação, reciclagem e diálogo com o empregador) e assistência social (medidas compensatórias, crédito, renda); (b) relacionam-se com o conceito de amparo, auxílio em face dos avanços tecnológicos; (c) indicam a participação da empresa (propriedade) na distribuição dos ganhos aos trabalhadores decorrentes da era da informação e tecnologia.

Nesse contexto, viu-se que todas as políticas públicas estudadas no capítulo precedente tratam de formação profissional ou reciclagem, dar renda ou crédito ao trabalhador; e uma específica, o Programa Seguro-Desemprego, além de fazer as duas opções anteriores, ainda tem o fito de intermediar ou fazer a colocação de mão de obra.

Daí que há uma confirmação de que o programa Seguro-Desemprego não só atende a desempregados, mas tem uma amplitude para abranger um sistema social de proteção mais efetiva.

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Da lembrança da teoria da construção da norma do inciso XXVII do art. 7º, mencionada no capítulo precedente, das razões axiológicas, normativas e sociológicas, esta há de ter uma relação com o Programa Seguro-Desemprego, pois a legislação usa verbos como auxiliar, prover, promover, a qual inclui renda para o desempregado e serviços integrados de orientação, recolocação e qualificação profissional para populações atingidas pelas reestruturações administrativo-tecnológicas. Tais objetivos estão elencados no art. 2º da Lei n. 8.900, de 30.06.2004.7 Por isso, as razões legislativas confirmam tais indicativos anteriormente expedidos.

Basta fazer referência à Resolução n. 575, de 28 de abril de 2008, do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat), órgão que gere o programa. Ela estabeleceu diretrizes e critérios para transferências de recursos do Fundo de Amparo do Trabalhador – aos Estados, Municípios, organizações governamentais, não governamentais ou intergovernamentais com vistas à execução do Plano Nacional de Qualificação (PNQ), como parte integrante do Sistema Nacional de Emprego (Sine)...

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