A vida pós bem jurídico-penal

AutorAntonio Fábio Medrado de Araújo
Ocupação do AutorAssessor de Desembargador (2a Câmara Criminal), Tribunal de Justiça da Bahia, Brasil
Páginas78-86

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Busato e Huapaya (2007, p. 29, 39) escrevem, com aguda precisão e sob o influxo de Bustos Ramírez:

A opinião majoritária considera que a missão do Direito Penal é a de proteger bens jurídicos [...]. Para imposição de uma pena se exige a lesão ou o perigo de lesão a bens jurídicos tutelados pela lei (conceito material de delito). Entretanto, o princípio da necessidade da inter-venção corre o perigo de ser demasiado abstrato e vago, pelo que requer uma base concreta de sustentação, que assinale quais são as bali-zas e limites fundamentais do sistema. Assim, não basta o princípio da necessidade da pena. Resulta indispensável apontar o que é efetivamente protegido, problema que a teoria penal tentou solucionar mediante o desenvolvimento da teoria do bem jurídico. O princípio do bem jurídico estabelece um limite ao poder punitivo estatal, pois impede que se estabeleçam delitos e penas que não tenham em sua estrutura de base a proteção a um bem jurídico.

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No que tange os bens jurídicos, imputam-se-lhes amiúde as funções: [1] dogmático-tipifica-dora (crime é lesão ou exposição a risco do bem tutelado); [2] sistemático-hierarquizante (desde o bem vida, guardando proporcionalidade com o nível de ofensa); [3] exegético-integrativa (a conferir higidez ao micro/macro ordenamento, validando-o em seus dogmas, teleologia, motivos, intenção do legislador, etc.).

A propósito, esclarecem Cobo del Rosal e Vives Antón (apud Busato e Huapaya, 2007, p.
61): “[...] nos Códigos Penais peruano e brasileiro, atendendo à disposição liberal que seguem suas Cartas Fundamentais, começam suas classificações pelos delitos contra a vida [...]”.

Já vimos que essa orientação liberal-constitucionalizada é a matriz, o genótipo das formas parentais «bem jurídico» e «constitucionalismo discursivo».

Tavares (2000, p. 17) elucida: “[...] através da evolução do conceito de bem jurídico se pode

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apreciar que sua criação não é só produto de uma elaboração jurídica pura, mas também de um contexto político e econômico”.

Ainda mais penetrante, Bechara (2009, p.
24) demonstrou que a noção clássica de bens foi gestada no “[...] modelo do Estado liberal, tendo por base a idéia do contrato social de Rousseau”.

Mesmo agora, que o liberalismo se globalizou, contrariando previsões weberianas, um Roxin (2007, p. 447) falacioso expurga a ideologização dos bens jurídicos: “A essa questão, Claus Roxin procura responder com base em alguns parâmetros gerais. Em primeiro...

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