A Vida Imita a Arte ou a Arte Imita a Vida? Um Olhar Para o Desemprego e Suas Implicações na Vida do Indivíduo sob a Perspectiva da Ficção

AutorJunia Vogel Olbermann - Lívia Pedersen de Oliveira - Andrea Poleto Oltramari
CargoDoutora em Administração de Empresas, Gestão de Pessoas - Doutora em Administração de Empresas, Gestão de Pessoas - Doutora em Administração de Empresas, Gestão de Pessoas
Páginas117-132
Esta obra está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso.
Resumo
O desemprego afeta as relações pessoais construídas
no ambiente do trabalho, podendo lançar o indivíduo
à marginalização social, causando sofrimento e
afetando sua vida pessoal. Nos propomos nesse
artigo a debater as temáticas desemprego, trabalho e
sofrimento, tomando como corpus de análise o filme
“O Corte” (2005). Assim, foram escolhidos trechos
da narrativa do filme, a partir do método de análise
fílmica (PENAFRIA, 2009). A justificativa se ampara no
fato de que poucos trabalhos acadêmicos, na área da
Administração, se propõem a analisar o desemprego,
sob a perspectiva de análise da narrativa de um filme
como campo empírico de pesquisa. Trata-se de um
estudo qualitativo, de caráter descritivo, cuja análise
dos resultados foi feita através da análise de conteúdo.
Dentre os resultados encontrados, destaca-se que a
compreensão do trabalho como fator central na vida
ainda prevalece e que o desemprego pode levar o
indivíduo a sofrimento psíquico e isolamento social.
Palavras-Chave: Desemprego; Trabalho; Sofrimento;
Cinema, Ficção.
Abstract
Unemployment affects the personal relationships
built in the work environment, and can throw the
individual into social marginalization, causing suffering
and affecting his personal life. This article sought to
understand, from the French film “Le Couperet” (2005),
how unemployment affects life. For this, parts of the
film were selected, using the method of film analysis
(PENAFRIA, 2009). The justification of the study is
supported by the fact that few academic papers in
the area of Administration propose to analyze the
unemployment, from the perspective of analyzing the
narrative of a film as an empirical field of research. This
is a qualitative, descriptive study, whose analysis of
the results was done through content analysis. Among
the results that were found it is emphasized that the
understanding of work as a central factor in life still
prevails, and unemployment can lead the person to
psychological suffering and social isolation.
Keywords: Unemployment; Work; Suffering; Cinema;
Fiction.
DOI: https://doi.org/10.5007/2175-8077.2017v19n49p117
Recebido em: 31/01/2017
Revisado em: 18/10/2017
Aceito em: 04/12/2017
A VidA imitA A Arte ou A Arte imitA A VidA? um
olhAr PArA o desemPrego e suAs imPlicAções nA
VidA do indiVíduo sob A PersPectiVA dA Ficção
Does Life Imitate Art or Art Imitate Life? A Look at
Unemployment and its Implications in Individual Living from the
Perspective of Fiction
Junia Vogel Olbermann
Mestranda de Administração de Empresas- Gestão de Pessoas.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.Porto Alegre, RS.
Brasil. E-mail: junia.vogel@gmail.com
Lívia Pedersen de Oliveira
Mestranda de Administração de Empresas- Gestão de Pessoas.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.Porto Alegre, RS.
Brasil. E-mail: livia.pedersen@gmail.com
Andrea Poleto Oltramari
Doutora em Administração de Empresas- Gestão de Pessoas.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS.
Brasil. E-mail: andreaoltr@gmail.com
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Revista de Ciências da Administração • v. 19, n. 49, p. 117-1 32, dez. 2017
Junia Vogel Olbermann • Lívia Pedersen de Oliveira • Andrea Poleto Oltramari
Revista de Ciências da Administração • v. 19, n. 49, p. 117-132, dez. 2017
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1 Introdução
É importante distinguir, conforme Reinert (2001),
a diferença conceitual entre trabalho e emprego. O
trabalho é caracterizado por ser uma atividade social,
pela qual os indivíduos procuram progredir material-
mente e moralmente. O ato de trabalhar é algo que
data desde o início da humanidade, ou seja, trabalhar
é algo inerente à condição humana e sempre existiu
em todos os modelos de produção e modos de tra-
balho. O ser humano sempre enxergou no trabalho
uma forma de sobreviver e progredir. O emprego, por
sua vez, é algo próprio do capitalismo, sendo ele para
Reinert (2001, p. 1) o “elo de ligação formal entre o
trabalhador e o modo de produção capitalista e não
com uma organização especifica, porque o trabalhador
é livre para escolher a organização por intermédio da
qual sua ligação se efetivará”. Neste artigo, contudo,
utiliza-se o termo trabalho em consonância com o
termo emprego/desempregado, visto que, em nossa
visão, o emprego também está envolto do conceito de
trabalho. Mesmo que o posto de trabalho seja em si um
emprego, no momento em que ele se torna central, ou
pelo menos parte significante na vida e na construção
da subjetividade, ele acaba estando também embebido
do conceito de trabalho acima descrito.
O desemprego aqui tratado, então, significa
a não ocupação de um posto de trabalho em qual-
quer organização. A grande dimensão dessa situação
acaba por poder levar a situações devastadoras nos
mais diversos aspectos da vida do trabalhador, não se
restringindo somente a aspectos financeiros. O desem-
prego aumenta problemas ligados à saúde tanto física
quanto mental. Atos ilegais e com teores de violência
podem ser desencadeados por essa situação, além de
aumentar as possibilidades de desestruturação social
e familiar (REINERT, 2001).
Ao olhar o trabalho ou a falta dele sob a pers-
pectiva dos trabalhadores, nota-se que ele passou por
mudanças significativas nas últimas décadas. No con-
junto de transformações, encontram-se maiores taxas
de desemprego, a precarização do trabalho e de suas
relações (MATTOSO, 1999; SOUZA, LEMOS, 2016;
CATTANI, 2014; FONTENELLE, 2015; DEJOURS,
2015).
Apesar disso, o trabalho desempenha uma função
central na vida dos indivíduos (RODRIGUES, BARRI-
CHELO, MORIN, 2016; CONCOLATTO, GASSEN,
RODRIGUES, 2017). É por meio dele que os indivíduos
se relacionam, desenvolvem suas habilidades, enxer-
gam-se como cidadãos. Desse modo, o desemprego,
além das repercussões financeiras, traz consigo a perda
da sensação da identidade, uma vez que é através do
seu trabalho que o indivíduo é visto e reconhecido no
meio social. Com a perda do trabalho, o indivíduo
coloca em risco seu equilíbrio psíquico, podendo levar,
em casos extremos, mas não raros, à doença mental
ou física (DEJOURS, 1999).
Na esteira deste pensamento, para Dejours
(2004), o sofrimento relacionado ao trabalho se inten-
sificou na contemporaneidade, em especial quando
pensado a partir do desemprego. A causa disto deriva
do aumento da vulnerabilidade dos trabalhadores no
ambiente do trabalho, ocasionado, em especial, pelo
sentimento de solidão que há nas relações entre os
indivíduos (BIRMAN, 2006). Essas relações frágeis
entre os trabalhadores decorrem do processo de indivi-
dualização, competição e da precarização do trabalho.
Estas constantes mudanças no trabalho, para Birman
(2006), criaram um ambiente de insegurança e de
desigualdade. A precarização, bem como a falta de
reconhecimento, acabam por promover sentimentos
de mal-estar nestes indivíduos.
Com base neste contexto, o presente artigo bus-
cou compreender, sob a ótica do filme O Corte (2005),
dirigido por Costa-Gavras e Jean-Claude Grumberg,
como o desemprego afeta a vida do indivíduo, além de
olhar para o desemprego como uma fonte de sofrimen-
to e abalo psíquico. A escolha pelo filme em questão
ocorreu por ser uma obra que dramatiza, de forma
crítica, as consequências do desemprego. Por meio do
seu personagem principal, é relatado como o descaso
das empresas para com os seus empregados, a desva-
lorização profissional e uma situação de desemprego
generalizada promovem o abalo psíquico dos sujeitos,
podendo o levar a situações e ações extremas. Vale
ressaltar, contudo, que o filme realiza essa crítica de
maneira a sobrevalorizar essa situação, com o intuito
de chamar, mais facilmente, a atenção dos especta-
dores, não chegando todos os casos a essas situações
extremas. Este estudo, assim, utilizou uma abordagem
qualitativa e descritiva para compreender como o de-
semprego, o sofrimento, os sentidos e significados do
trabalho são retratados neste filme.

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