A Flexibilização no Uso da Prova Emprestada

AutorJorge Augusto Buzetti Silvestre
CargoAdvogado/SP. Pós-graduado em Direito Processual (Unisul)
Páginas14-20

Page 14

1. Introdução

Em sede de Direito Processual, seja qual for o ramo específico do Direito, a prova é, indubitavelmente, tema de grande importância que merece cautela legal e doutrinária.

No presente artigo o autor trata da Prova Emprestada, um dos meios probatórios admitidos em direito desde que observados os requisitos de admissibilidade.

A prova emprestada representa um tema, a priori, simples na doutrina, haja vista que grande parte das obras apenas relatam o conceito, o emprego e os requisitos de admissibilidade sem, contudo, adentrá-lo de forma vertical.

Ocorre que este meio de prova, aos olhos do autor, merece maior flexibilização no emprego, sem ficar restrito a posicionamentos impeditivos/redundantes disfarçados atrás do contraditório.

Se se tem o sistema pátrio acompanhado à constante evolução do direito processual (atribuição de maiores poderes aos juízes; a ampliação dos meios de prova; simplificação da prova pericial – preocupações com a celeridade e simplificação do processo; processo sincrético) não haveria motivos para deixar de atribuir a determinado processo ou a inúmeros processos maior efetividade, economia processual, celeridade e o mais importante de todo e qualquer fundamento, que é a busca da efetiva prestação jurisdicional, em decorrência da não permissão de traslado de determinada peça processual ou investigativa sob a alegação de que as mesmas partes não participaram do processo anterior ou porque não passou pelo crivo do contraditório.

O juiz não é leigo e, na maioria das vezes, a parte não estará só em juízo. Eventual peculiaridade que venha causar prejuízo à(s) parte(s) pode ser suscitada, de forma a impugnar e resolver a pendência.

Page 15

Isso porque, poderiam indagar, em sede de Juizado Especial Cível, o conciliador está instruído a conduzir a composição de forma imparcial, ou seja, tendo ele percebido que certa prova não tenha sido impugnada pela outra parte, ele poderá, da melhor maneira possível, orientá-la a procurar outros meios (defesa técnica, novas provas...) para que não ocorra prejuízo à devida prestação jurisdicional ou, melhor dizendo, ao direito de defesa.

Sendo assim, partindo de ideias básicas e com o uso de exemplos elucidativos, o presente artigo promoverá uma sugestão de quebra de paradigmas acerca desse meio de prova, abordando a flexibilização no uso da prova emprestada com ênfase no Direito Processual Civil, conforme se vê no decorrer dos capítulos.

Por fim, fica aberto aos cientistas do direito para que, com a máxima vênia possível, debatam sobre a questão emitindo as posições que acharem convenientes.

2. Aspectos históricos

Ao se debruçar sobre o estudo de qualquer tema é de suma importância que se dê um reporte às origens históricas, para que se possa entender os pilares construídos que sustentam o instituto em estudo nos dias de hoje. Sendo assim, de forma sucinta, é que se dá início aqui à narração dos fatos mais importantes da origem da prova.

Na antiguidade, os povos primitivos faziam seus meios de prova calcados em métodos empíricos e rudimentares, pois não conheciam/possuíam tecnicismo para demonstração daquilo que se queria provar/alegar. Nesse momento, tem-se que a prova dos fatos era fortemente influenciada pela religião, na proteção divina.

Incluíam-se entre os métodos utilizados as ordálias, o juramento e o duelo.

A primeira consistia na busca da verdade mediante emprego de atos cruéis e até mortais conhecidos como: “prova de fogo” (o acusado era obrigado a tocar com a língua um ferro quente ou carregar uma barra de ferro em brasa ou, ainda, caminhar descalço sobre ferros quentes); “prova das bebidas amargas” (consistia em obrigar a mulher acusada de adultério a ingerir bebidas fortes e amargas; a sua naturalidade representaria inocência ao passo que alteração nos traços do rosto e olhos injetados de sangue representariam a culpa); “prova das serpentes” (lançado entre as serpentes, caso alguma delas o picasse seria visto como culpado); “prova da água fria” (atirava-se o acusado num reservatório de água; caso afundasse seria culpado, se flutuasse seria considerado inocente) etc.

A segunda forma, em consonância com os escritos de João Batista Lopes (2002, p.20) ainda sobrevive em vários paises, consistindo na invocação de divindade como testemunha da verdade, ocorrendo a imposição de castigo ao acusado na hipótese de mentira.

E, por fim, o duelo constitui também prova divina ou juízo de Deus, fundando-se na crença de que Deus não permite a vitória da parte sem razão.

Abolidas as ordálias e a proibição do duelo no século XIV, a prova testemunhal resgatou o prestígio adormecido e passou a ser largamente utilizada.

E a partir do século XIV pode-se dizer que ocorreu uma explosão na evolução no sistema do Direito Probatório, passando-se a admitir ao lado das provas testemunhal e documental a perícia, a confissão e o interrogatório.

Hodiernamente, vê-se que a história do Direito Probatório é marcada por permanente evolução em busca do ideal da celeridade e qualidade jurídica, revelando a atualidade predominância da oralidade, preocupação com a simplificação e celeridade do processo e fortalecimento dos poderes do juiz.

Eis um breve esboço histórico da origem da prova.

3. Conceito

Inicialmente, antes de adentrar ao conceito de Prova Emprestada, objeto deste artigo, cabe aqui, brevemente, traçar o conceito de prova em sentido lato.

O vocábulo prova, derivado do latim proba, de probare, implica demonstrar, reconhecer a existência da verdade do que se diz ou se alega, tornando o fato conhecido do juiz, convencendo-o de sua existência.

Noutras palavras, para Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha (apud MOSSIN, 1998, p. 195/ 196) prova, num sentido comum ou vulgar (verificação, reconhecimento etc.), significa tudo aquilo que pode levar ao conhecimento de um fato, de uma qualidade, da existência ou exatidão de alguma coisa. Como significado jurídico, representa os atos e os meios usados pelas partes e reconhecidos pelo juiz como sendo a verdade dos fatos alegados. Contudo, em qualquer de seus significados, representa sempre o meio usado pelo homem, através da percepção para demonstrar uma verdade.

Ainda sobre o conceito de prova em sentido lato, João Batista Lopes (2002, p. 24) com propriedade ressalta que questões de direito não exigem demonstração probatória, haja vista que o magistrado tem o dever de conhecê-las, ao passo que nas questões de fato, poderá haver necessidade de demonstração, porque o magistrado para decidir terá que buscar a verdade. À elucidação dos fatos, das alegações sobre fatos é que se dá o nome de prova.

A prova emprestada, como o próprio nome sugere, é aquela colhida num determinado processo e introduzida/aproveitada noutro processo. Em consonância com os dizeres do processualista Eduardo Talamini (Revista de Atualização Jurídica, Brasília, n. 35, 1998, p. 146), “a prova emprestada consiste no transporte de produção probatória de um processo para outro. É o aproveitamento de atividade probatória anteriormente desenvolvida, mediante traslado dos elementos que a documentaram”.

O referido meio de prova ingressa no processo beneficiário sob a forma de documento hábil a formar juízo de valor sobre o objeto mediato da demanda.

Exemplificando didaticamente, a prova emprestada compreende qualquer documento de outro processo que tenha se destinado, originariamente, a produzir alguma coisa, como por exemplo, laudosPage 16 periciais, gravações de áudio e vídeo, a decisão definidora do objeto da perícia, enfim, qualquer elemento/documento de cunho probante.

É de suma importância salientar que, ainda que a prova emprestada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT