A UNILAB na perspectiva da cooperação sul-sul: uma análise crítica decolonial africana

AutorBas´Ilele Malomalo - Julie Lourau - Osmaria Rosa Souza
CargoUNILAB - UCSal - UCSal
Páginas517-552
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, n. 245, p. 517-552, set./dez., 2018 | ISSN 2447-861X
A UNILAB NA PERSPECTIVA DA COOPERAÇÃO SUL-SUL: UMA
ANÁLISE CRÍTICA DECOLONIAL AFRICANA
UNILAB in the perspective of South-South cooperation: a critical african decolonial
analysis
Bas´Ilele Malomalo (UNILAB)
Julie Lourau (UCSal)
Osmaria Rosa Souza (UCSal)
Informações do artigo
Recebido em 15/06/2018
Aceito em 07/07/2018
doi>: 10.25247/2447-861X.2018.n245.p496-531
Resumo
Este trabalho tem por objetivo, pautando-se nos trabalhos
anteriores de seus autores, discutir criticamente a cooperação
internacional entre Brasil e Á frica, tendo a Universidade da
Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (UNILAB)
como objeto de estudo. O período considerado para a análise é
de 2003 até 2018. O ano 2003 até 2010 corresponde aos dois
mandatos do governo Lula, durante os quais germinou-se o
projeto da UNILAB mediante a composição de uma comissão de
implementação, que elaborou suas Diretrizes, em 2008, e de
promulgação da lei da sua fundação. O segundo período é da era
Dilma Rousseff entre seu primeiro mandato (2010-2014) e o seu
segundo mandato qu e inicia em 2014 e é interrompido pelo
golpe parlamentar em 2016. Busca-se interpretar a história da
cooperação entre Brasil e África, partindo das dinâmicas
internas da UNILAB na sua relação com as dinâmicas regionais,
nacionais e internacionais. Por isso, dá-se o foco nas sucessivas
gestões superiores, as reitorias pro tempore que governaram a
universidade. O último período que o texto l eva em
consideração é aquele que coincide com o golpe parlamentar
contra a presidenta Dilma Rousseff e a nomeação de um reitor
pro tempore oriundo desse processo político conturbador. Foca-
se em alguns aspectos considerados essenciais para a
construção de uma narrativa emancipatória que leva em conta o
pensamento do Sul global, especialmente decolonial africano e
afro-diaspórico.
Palabras-chave: Cooperação Sul-sul. UNILAB. Brasil-África.
Epistemologia decolonial.
Abstract
Based on previous work by i ts authors, this paper aims to
critically discuss international cooperation between Brazil and
Africa, with the University of the international integration of
Afro-Brazilian lusophony (UNILAB) as the object of study. The
period considered for the analysis is from 2003 to 2018. The year
2003 until 2010 marks the period of the two terms of the Lula
government, during which the Unilab project was formed
through the composition of an implementation committee that
drafted its Guidelines, in 2008, and promulgating the law of its
foundation. The second period that supports the analysis of this
text is of the Rousseff era. His first term (2010-2014) and his
second term, which begins in 2014, is interrupted by the
parliamentary coup in 2016. The aim is to interpret the history of
cooperation between Brazil and Africa, starting from the
internal dynamics of UN ILAB in its relation with the regional,
national and international dynamics. Hence, the focus is on the
successive higher administrations, the pro-tempore rectors that
governed the university. The last period that the text takes into
account is the one that coincides with the parliamentary coup
against President Dilma Rousseff and the appointment of a pro-
tempore dean from this troublesome political process. It focuses
on some aspects considered essential for the construction of an
emancipatory narrative that tak es into account the thinking of
the global South, especially Decolonial African and Afro-
diasporic.
Keywords: South-South cooperation. UNILAB. Brazil-Africa.
Decolonial Epistemology.
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Introdução
A Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (UNI LAB) é,
hoje, uma comunidade acadêmica internacional implementada em duas regiões interioranas
nordestinas, maciço do Baturité, no Ceará, nos municípios de A carape e Redenção, e no
Recôncavo histórico baiano, no município de São Francisco do Conde. Comporta 6.529
estudantes de cursos presenciais e a distância na sua modalidade de graduação e pós-
graduação. Ou seja, 2.616 estudantes brasileiros/as de cursos a distância, e 3.976 estudantes
brasileiros/as e internacionais (estrangeiros/as) matriculados em cursos presenciais de
graduação. Deste últ imo número, 2.942 são brasileiros e 1.034 são internacionais, oriundos
dos países da cooperação: Angola (180), Cabo Verde (83), Moçambique (37), Guiné Bissau
(628), São Tomé e Príncipe (78) e Timor Leste (28). Nos cursos a distância, encontr am-se na
graduação 752 estudantes brasileiros/as e na pós-graduação latu sensu 1.694 estudantes
brasileiros/as. Nos três cursos de pós-graduação stricto sensu, dentro do número absoluto de
104 estudantes matriculados/as, 99 são brasileiros/as e são 5 guineenses
1.
A universidade comporta 622 servidores/as, sendo 345 té cnico-administrativos em
educação, brasileiros, e nenhum deles advém dos países da cooperação. Há 277 docentes,
sendo 242 brasileiros/as e 21 professores/as estrangeiros/as, dos quais 19 são africanos/as dos
PALOP2.
Este trabalho tem por objetivo, pautando-se nos trabalhos anteriores de seus autores,
discutir criticamente a cooperação internacional entre Brasil e África, tendo a UNILAB como
objeto de estudo. Foca-se em alguns aspectos considerados essenciais para a construção de
uma narrativa emancipatória que leva em conta o pensamento do Sul global, especialmente
decolonial africano e afro-diaspórico.
O período considerado para a análise é de 2003 até 2018. De 2003 até 2010 marca o
período dos dois mandatos do governo Lula, durante os quais germinou -se o projeto da
1 Números calculados pelo/as autor/as a partir das informações disponibilizadas pelo Serviço de comunicação
da UNILAB (Disponível em:em-numeros/>. Acessado em 8 jun. 2018) e
Diretoria de Reg istros e Controle Aca dêmico DRCA (Dados de abril/2015. Disponível em:
http://www.unilab.edu.br/dadosquantitativos/>. Acessado em 8 jun. 2018) .
2 Informações disponibilizadas pelo Serviço de comunicação da UNILAB (Disponível em:
http://www.unilab.edu.br/unilab-em-numeros/>. Acessado em 8 jun. 2018.
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UNILAB mediante a composição de uma comissão de implementação, que elaborou suas
Diretrizes, em 2008
3, e de promulgação da lei da sua fund ação (Lei nº 12.289, de 20 de julho
de 2012). Para compreender melhor o que se passa nesse período, em termos de cooperação
entre Brasil e África, recorre-se a alguns acontecimentos anteriores à era Lula que
possibilitam interpretar a história afro-brasileira e africana numa perspectiva nacional e
internacional. Ainda são analisados os termos cooperação Sul-Sul, solidariedade e
cooperação solidária para proporcionar uma avaliação crítica e responsável d o
desenvolvimento da aproximação do Brasil e da África durante o período delineado.
O segundo período que sustenta a análise deste texto é da era Dilma Rousseff,
referente a seu primeiro mandato (2010-2014) e ao seu segundo, que inicia em 2014 e é
interrompido pelo golpe parlamentar em 2016. Busca-se interpretar a história da cooperação
entre Brasil e África, partindo das dinâmicas internas da UNILAB em sua relação com as
dinâmicas regionais, nacionais e internacionais. Por isso, dá-se o foco nas sucessivas gestões
superiores, as reitorias pro tempore que governaram a universidade.
O último período que o texto leva em consideração é aquele que coincide com o golpe
parlamentar contra a presidenta Dilma Rousseff e a nomeação de um reitor pro tempore,
oriundo desse processo político conturbador. Tal período é desenhado a partir dos
acontecimentos que ocorreram entre 2016 e 2018, tendo a greve de caminhoneiros e eleições
em vista como marcadores interpretativos das dinâmicas próprias da UNILAB.
O argumento principal que se defende é que a era petista, constituída de governos
Lula-Dilma (2003-2016), foi aquela que melhor possibilitou uma aproximação concreta entre
o Brasil e a África. Souza (2018) tem apontado que o uso do termo solidariedade tem sido
marca estratégica das relações estabelecidas entre os governos brasileiros e o continente
africano. A título de exemplo, pós-golpe, em discurso de transferência de cargo para Aloysio
Nunes, José Serra endossa a necessidade de solidariedade na cooperação entre Brasil e
́frica mas enfatiza a necessidade de algo mais Como tenho dito, a África espera de nós
mais do que solidariedade ou compaixão: quer parceria, fundada também na convergência
3 UNILAB. Diretrizes Gerais da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, julho de
2010. Disponível em: http://pdi.unilab.edu.br/wp content/uploads/2013/08/Diretriz es_Gerais_ UNILAB. pdf.
Acesso em 10 de maio de 2015.
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de nossos inter esses e objetivos econômicos e sociais
4. A e ra Temer tem, portanto,
apostado e m relações eminentemente econômicas, onde a solidariedade torna-se apenas
um discurso falacioso. O que explica essas posições opostas é a concepção ideológica do
projeto de na ção do Brasil que cad a um desses governos carrega, concepções estas que
resultam, no caso estudado, em políticas pró ou contra a Universidade da Integr ação
Internacional da Lusofonia Afro-brasileira.
Cooperação internacional para o desenvolvimento: uma proposta teórica pautada num
olhar decolonial africano
Cooperação internacional para o desenvolvimento é uma área de conhecimento que
faz parte dos estud os do desenvolvimento. Este último campo de investigação pode
proporcionar a realização de estudos disciplinares, multi ou interdisciplinares (FAVREAU;
FRECHETTE; LACHAPELLE, 2 008; FORSTER, 2007; LOPES, 2005). No caso deste trabalho,
privilegia-se uma abordagem interdisciplinar, tendo-se em conta os espaços de trabalhos
intelectuais e sociais de seus autores (MALOMALO; FOSENCA; BADI, 2015; MALOMALO,
2017a, 2017b, 2017c; SOUZA, 2015, 2018; SOUZA; LOURAU, 2017).
Entre outros conceitos essenciais aos debate s sobre cooperação internacional para o
desenvolvimento, numa ótica dos agentes que atuam no Sul global, aparecem geralmente
estes: cooperação Sul-Sul, cooperação solidária e o desenvolvimento. Para a realização de
estudos com marcas decoloniais, recomen da-se que se use sempre criticamente esses
conceitos, contextualizando seus usos. Essa é a nossa perspectiva: questionar o uso de
conceitos e usá-los numa concepção progressista e libertadora (DUSSEL, 20 05; LANDER,
2005).
Os conceitos de cooperação Sul-Sul e cooper ação solidária passaram a ser
encunhados em meados da década de 1950, fase em que ocorreram vários eventos que
versaram a discussão sobre os interesses e problemas em comum dos países recém -
4 Ministério das Relações Exteriores. Texto-base para o discurso do Ministro José Serra por ocasião da cerinia de transmiso
do cargo de Ministro das Relações Exteriores Palácio Itamaraty, 7 de março de 2017. Disponível em:
http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/15830-texto-base-para-o-discurso-de-posse-do-ministro-de-estado-das-
relacoes-exteriores-aloysio-nunes-ferreira-palacio-itamaraty-7-de-marco-de-2018 .Acesso em 17 de junho de 2018.
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independentes com os países asiáticos (EDMONDSON, 2010; LEITE, 2011). Foram esses
eventos que culminaram na conferência de Bandung, em abril de 1955.
A Conferência de Bandung reuniu 29 países afr icanos e 42 asiáticos. Ela foi e é
considerada, até hoje, um marco no despertar dos governos, até então dominados
economicamente pelo Norte. Estes países passaram a agir coletivamente na política
internacional, defendendo uma agenda própria e totalmente diferente daquela que era
subordinada pelos países dominan tes. A conferência elencou dez princípios que norteariam
suas ações , dentre os quais Leite (2011) cita estes: o respeito ao s direitos humanos
fundamentais e aos propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas; respeito à soberania
e à integridade territorial de todas as nações; reconhecimento da igualdade de todas as raças
e de todas as nações, grandes ou pequenas; promoção de interesses mútuos e da cooperação;
respeito à justiça e às obrigações internacionais.
Essa conferênc ia inspirou o Movimento dos Países não Alinhados, além de fazê-los
refletir sobre o contexto de luta contra a dominação política e econômica do Norte cont ra o
Sul, fazendo com que os/as intelectuais, políticos/as e a sociedade civil como um todo da Ásia,
da África e d a América Latina começassem a construir uma identidade particular, que
traduzisse suas experiências como comuns aos povos do Sul.
Eram vários os elementos que identificavam, uniam e mobilizavam esses povos: a
colonização, o racismo e a explor ação econômica que sofriam e ainda sofrem, por parte dos
países do Norte. A colonização a que os países do Sul passaram p or séculos foi responsável
pelo seu desenvolvimento tardio. Começaram a atuar e tratar de suas ações em termos, como
por exemplo da cooperação Sul-Sul que ali já era vista como uma cooperação baseada em
princípios de solidariedade, igualdade e soberania entre todos os países envolvidos, de forma
a travarem a luta pelo respeito aos direitos humanos e pela condenação do racismo.
Segundo Santos e Meneses (2010), o termo Sul vem a comportar dois sentidos, sendo
eles: o Sul geográfico, que leva em conta os países que pertencem ao hemisfério Sul e que
foram historicamente colonizados pelos impér ios europeus, e o segundo sentido, que
compreende o que os autores vão chamar de diversidades epistemológicas existentes no
mundo concebidas pelos autores como epistemologias do Sul O Sul é aqui concebido
metaforicamente como um campo de desafios epistemológicos, que procuram reparar os
danos e impactos historicamente causados pelo capitalismo na sua relação colonial com o
mundo SANTOS MENESES  p 
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Ainda nesta linha, Edmondson (2010) entende que as cooperações Sul -Sul e solidária
são categorias sociais que reivindicam a construção de uma nova ordem mundial econômica
que tenha como eixo central a humanização das sociedades.
A pesquisa bibliográfica feita por nós revelou que o melhor caminho para se
compreender o uso do conceito da cooperação solidária é investir na gênese e no uso de cada
um destes termos separadamente Dessa forma o adjetivo solidário fora de seu uso no
universo judaico-cristão, tem sido objeto de análise nas ciências humanas no Ocidente. Os
textos de Constantino (2009) e Arango (2013) são importantes para a compreensão política e
sociológica que o termo solidariedade adquiriu ao longo da História; já o de Wladimir (2007),
sendo complementar aos dois outros citados, faz uma ligação entre o termo cooperação e
solidariedade quando investiga o sentido da cooperação solidária no contexto da diplomacia
e política externa brasileiras com os países do Sul.
Para Arango (2013), a solidariedade tem múltiplos sentidos. Porém, na sua origem,
era um conceito jurídico. Somente no século XVIII se imporia o seu uso político na boca do
saintsimoniano Pierre Leroux. No século XIX teria uma conotação fatual na pluma de Émile
Durkheim que a empregou em dois sentidos: a solidariedade mecânica e a solidariedade
orgânica para explicar, sociologicamente, a transformação de uma sociedade tradicional em
uma sociedade moderna.
O outro sentido que a solidariedade comporta é a normativa que, conforme Arango
(2013), liga-se ao direito romano, que se fundamentava numa forma de obrigação da
comunidade responsabilizar-se pelas dívidas de um de seus membros e, inversamente, de um
membro responsabilizar-se pelas dívidas de sua comunidade ou família. Para ele , essa
concepção da solidariedade recebera novos acrescimentos nos séculos XVIII, com a
Revolução Francesa, bem como nos séculos XIX e XX, com a emergê ncia dos movimentos
operários, pensadores socialistas, sociais-democratas, defensores de um Estado de Direito e
de um Estado de Bem-Estar que garantem os direitos dos cidadãos.
Arango (2013) defende o uso e a prática que combinam a solidariedade fatual com a
solidariedade jurídico-normativa. Dito em outros termos, trata -se da defesa de uma
solidariedade como responsabilidade comum perante as injustiças estruturais. Esta
concepção luta pela implementação de uma democracia social que se expressa no respeito e
defesa dos direitos humanos e são fundamentais no plano nacional e internacional. Esse
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modelo é aquele defendido pelos movimentos sociais altermundistas e internacionalistas
(FAVREAU; FRECHETTE; LACHAPELLE, 2008).
Segundo Pereira e Medeiros (2015), a Cooperação Sul-Sul, tal que se conhece hoje,
iniciou a sua formação histórica no contexto do início da Guerra Fria, com a descolonização
afro-asiática e a formação dos primeiros arranjos ligando a per iferia global, como a
Conferência de Bandung, a criação do Movimento dos Não-Alinhados, do G-77 e da UNCTAD.
Nessa primeira fase, para eles, o objetivo era garantir a descolonização e o não-alinhamento.
A partir da década de 1970, países da América Latina e África Subsaariana também passam a
se envolver, de forma crescente, com a agenda do Terceiro Mundo, em uma tentativa de
fomentar a cooperação política, econômica e técnica entre países em d esenvolvimento. A
Cooperação Sul-Sul passa a ser paulatinamente institucionalizada no âmbito da ONU,
sobretudo com a Conferência de Buenos Aires de 1978:
O Plano de Ação de Buenos Aires, resultado das discussões realizadas nessa
conferência, desenvolve o conceito de cooperação técnica baseado na
reciprocidade e horizontali dade, instrumentalizada através do intercâmbio de
conhecimentos, informações, tecnologias e técnicas de gestão em políticas públicas
nas áreas de educação, saúde, agricultura, entre outras . O ano de 1978 é um marco
na Cooperação Sul-Sul pois pela primeira vez foram elabora dos conceitos e
princípios de maneira conjunt a entre os países periféricos, colocando em destaque
a ideia de que a prática social de um país pode ser replicada em outros países e gerar
desenvolvimento PINO  p  No sentido de instrumentalizar organizar e
promover a prática da Cooperação Sul-Sul, foi criado o Comitê de Alto Nível para a
Cooperação Sul-Sul (órgão subsidiário da Assembleia Geral da ONU), que se tornou
uma importante entidade normativa em matéria de cooperação entre países em
desenvolvimento (PEREIRA; MEDEIROS, 2015, p. 15).
Devido à nova orientação da política externa brasileira, voltada para os países do Sul
e o acúmulo de um trabalho realizado entre 2003 e 2013, a Agência Brasileira de Cooperação
(ABC) veio a publicar uma série de guias de orientação sobre a Cooperação Técnica Brasileira.
Interessa-nos a definição sobre a Cooperação Técnica Sul-Sul brasileira do Manual de Gestão
Técnica da Cooperação Sul-Sul:
A cooperação técnica Sul-Sul é entendida como o int ercâmbio horizontal de
conhecimentos e experiências originados nos países em desenvolvimento
cooperantes. A ideia é compartilhar lições aprendidas e práticas exitosas disponíveis
no Brasil, geradas e testadas para o enfrentamento de desafios similares ao
desenvolvimento socioeconômico.
(...) Por meio des se trabalho conjunto, busca -se identificar e sistematiza r o
conhecimento e as competências dos beneficiários da cooperação nos países que
fazem parceria com o Governo brasileiro para que, em seguida, tais capacidades
sejam aplicadas na geração de soluções locais inovadoras (BRASIL, 2013, p. 13).
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Os princípios de horizontalidade, partilha, trocas, que d evem guiar as ações de
cooperação sul-sul brasileira, é que nos interessam para as reflexões que estamos a realizar
sobre a cooperação solidária entre o Brasil e os países africanos parceiros da UNILAB.
Os trabalhos de Wladimir (2007), Puente (2010) e Leite (2011) nos proporcionam uma
oportunidade ímpar para a compreensão das relações entre a cooperação Sul-Sul, a
cooperação solidária entre o Brasil e os países do Sul, especialmente os africanos.
Wladimir (2007) pondera que foi a partir dos anos de 1990 para 2000, para ser exato,
durante os governos de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) e de Luís Inácio Lula da Silva
(2003-2010) que o termo cooperação solidária foi incorporado aos d iscursos da diplomacia
brasileira.
A cooperação e solidariedade, para Wladimir (2007), tê m por fundamento a
Constituição Brasileira de 1988. Dentro deste documento, o primeiro termo, como
instrumento da política externa, aponta para a integração regional com a América do Sul e,
hoje, com outras regiões do mundo, como a África.
Quanto ao princípio de solidariedade, durante a reformulação da diplomacia brasileira
de 1995 até os sucessivos mand atos de Lula (2003-2010), tornou-se um conceito basilar da
cooperação Sul-Sul com a conotação normativa, isto é, como norma jurídica e ética.
A solidariedade concretiza-se na plena liberdade de quem oferece e na de quem
recebe. A liberdade autêntica é capaz de se realizar espontaneamente, porque está
pronta para compreender necessidades, reconhecer carências e dispor-se à partilha.
O desafio com que se defronta, sobretudo no plano internacional, é a defesa do
homem, que pressupõe valores éticos, eis que o Homem se encontra no cerne das
preocupações da justiça internacional (WLADIMIR, 2008, p. 219).
Esse termo, que faz parte, hoje, dos discursos oficiais da diplomacia brasileira, tem
uma origem cristã, e tem inspirado o pensamento social da Igreja Católica e o direito
internacional. Funciona como princípio da justiça social para todos, sobret udo os mais
necessitados. Significa, também, partilha, trocas que contam com a reciprocidade e o
reconhecimento do outro como sujeito histórico. Além disso, conota a ideia d o
desenvolvimento como liberdade e o uso dos direitos humanos e dos direitos fundamentais
como princípios do desenvolvimento humano (SEN, 2000; LOPES, 2005).
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Definir a solidariedade, como acabamos de fazer, não significa que não seja objeto de
contestação. Puente (2010) rec onhece que o governo Lula tinha plena consciência das
acusações, por exemplo, que recebia de seus opositores de que, em vez de investir numa
política solidária para os países pobres do Sul, deveria ocupar-se, primeiro, da pobreza que
afetava uma parcela da população brasileira.
A política de cooperação internacional brasileira para com o Sul que, desde 2003,
definiu-se como cooperação solidária Sul-Sul, tem revelado igualmente suas contradições
(MALOMALO, 2014b). Em 2014, Matias de Alencastro chamava a atenção com o título do seu
artigo Brasil arrisca a sua imagem na ́frica com práticas neocoloniais Ele não estava
fazendo um simples exercício de retórica, pois, ant es dele, o trabalho de Schlesinger (2013)
ou de Souza Santos (2013) já vinham denunciando a lógica do desenvolvimento extrativista
presente no Programa de Cooperação Tripartita Japão-Brasil-Moçambique, conhecido como
PROSAVANA.
Trata-se, de fato, de uma ação de cooperação int ernacional que foge da gramática
dos direitos humanos e da solidariedade entre os governos e povos do Sul. A burguesia
econômica e a política desses respectivos países criaram uma aliança sagrada para se
apoderar de terras de camponeses moçambicanos no corredor de Nacala para alcançar seus
interesses, usando-se d a força econômica e do poder do Estado, alistando jornalistas,
juristas, economistas e intelectu ais de direita à sua causa. A sua infelicidade é que os
movimentos populares e de agricultores/as moçambicanos da região são bem articulados em
nível nacional e internacional. Por isso, tê m inibido as ações dos agentes do capital nos seus
territórios (VAZ; MALOMALO, 2016; SOUZA; LOURAU, 2017).
Contra a definição de cooperação internacional par a o desenvolvimento e da
cooperação solidária do paradigma dominante ou do paradigma progressista que servem aos
interesses corporativistas e partidários, Malomalo (2014c, 2017c) tem sugerido uma outra
concepção do desenvolvimento e de cooperação a partir dos pensamentos africano, afro-
diaspórico e de Paulo Freire, seguindo o compromisso da teoria crítica emancipatória.
No lugar de uma filosofia do desenvolvimento Malomalo sugere o uso da filosofia de
ubuntu-bisoidade no âmbito das políticas de cooperação internacional. Tanto o pensamento
freiriano como o pensamento de ubuntu -bisoidade nos permitem perceber que as forças
progressistas, adeptas da pedagogia de esperança e dos/as oprimidos/as, diferentes das
forças dominantes, defendem os direitos dos migrantes e das minorias nacionais.
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Para explicar o que e le entende por esperança, Freire chama atenção sobre as forças
históricas que produzem a desesperança e a esperança.
Por outro lado, sem sequer poder negar a desesperança como algo concreto
e sem desconhecer as razões históricas, econômicas e sociais que a
explicam, não entendo a existência humana e a necessária luta para fazê-la
melhor, sem esperança e sem sonho. A esperança é necessidade
ontológica; a desesperança, esperança que, perdendo o endereço, se torna
distorção da necessidade ontológica. Como progr ama, a desesperança nos
imobiliza e nos faz sucumbir no fatalismo onde não é possível juntar as
forças indispensáveis ao embate recriador do mundo. Não sou esperançoso
por pura teimosia, mas por imperativo existencial e histórico. (...)enquanto
necessidade ontológica a esperança precisa da prática para tornar-se
concretude histórica. E por isso que não há esperança na pura espera, nem
tampouco se alcança o que se espera na espera pura, que vira, assim, espera
vã (FREIRE, 1992, p. 5).
A esperança deve ser uma postura cognitiva, estética, política e ética a guiar a práxis
de uma educação libertadora.
Uma das tarefas do educador ou educadora progressista, através da análise
política, séria e correta, é desvelar as possibilidades, não importam os
obstáculos, para a esperança, sem a qual pouco podemos fazer porque
dificilmente lutamos e quando lutamos, enquanto desesperançados ou
desesperados, a nossa é uma luta suicida, é um corpo-a-corpo puramente
vingativo. O que há, porém, de castigo, de pena, de correção, de punição na
luta que fazemos movidos pela esperança, pelo fundamento ético-histórico
de seu acerto, faz parte da natureza pedagógica do processo político de que
a luta é expressão. (FREIRE, 1992, p. 6).
A pedagogia da esperança é um pr ojeto de produção de conhecimento, de estética,
linguagens, valores e políticas libertadores que se faz de forma coletiva e solidária. De forma
parecida, solidariedade significa, para Freire, um tr abalho coletivo para a humanização e,
para Malomalo (2017c), ela significa o codesenvolvimento ou desenvolvimento bisoista ou
ubuntuista
5.
Aqui encontramos a sua ligação com a epistemologia da macumba, do ubuntu e da
bisoidade. As três epistemologias evocadas pertencem ao que chamamos de epistemologias
5 As três epistemologias evocadas fazem parte do trabalho que vem sendo desenvolvido por Malomalo (2014b,
2014c, 2016b, 2017c), no que se refere a produção de conhecimento e trabalho social no campo da educação
e de defesa de direitos dos imigrantes africanos/as no Brasil.
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negras do Sul global. O seu ponto de partida é a cultura negra, isto é, as bibliotecas africanas
e afro-diaspóricas em diálogo crítico com pensamentos culturais filosóficos de outros povos,
as forças progressistas de academias e fora das academias, que lutam pela emancipação
(MALOMALO, 2016b).
A filosofia do ubuntu e da bisoidade são os pensamentos filosóficos de Ramose (2002;
2011) e de Ntumba (2014). A filosofia da macumba é um empreendimento intelectual que
Malomalo (2014b) vem levando a cabo na diáspora brasileira. Todas essas filosofias partem
da ideia básica da filosofia tradicional africana de que o mundo é uma teia. Na verdade, é um
pluriuniverso ou plurimun do Em outras palavras como afirma Ntumba o real processual
multiforme e plural enquanto realidade-total, composta pelas relações estabelecidas
historicamente no tempo e espaço entre a comunidade-universo-natureza, a comunidade-
do-sagrado-ancestral e a comunidade-de-bantu ou comunidade-de-seres-humanos. Trata -
se de trilogia constituinte da realidade-processual-total que algumas filosofias chamam do
Ser.
O Biso, em Lingala (língua falada na R.D. do Congo) que, junto com Ntumba (2014)
traduzimos como o Nós-có smico ou Nós-ecológico, é um conceito que nos interpela
filosoficamente, isto é, desperta nossas consciências no plano intelectual, ético, estético e
político para agirmos perante a crise global e da humanidade de forma solidária para com o
Outro, isto é, a trilogia constitu inte do Nós-cósmico. Esse processo é que nomeamos de
macumbização, processo de encanto pelo Outro para se libertar de forma solidária.
Nessa perspectiva, essa filosofia condena o racismo e a xenofobia que as forças
liberais, neoliberais e ultradireitistas praticam contra os/as imigrantes e minorias nacionais,
ou, ainda, repudia qualquer forma de instrumentalização da cooperação solidária.
Cooperação Brasil-África nos governos Lula (2003-2010)
Numa perspectiva histórica de curto alcance, as políticas públicas do Estado brasileiro
para com a população negra tornam-se compreensíveis quando situadas na agenda nacional
e internacional das organizaçõe s sociais negras. Entre 1960 e 1970, o Movimento Negro, no
Brasil, consolida suas estratégias no seu diálogo com o Movimento de Direitos Civis dos
Estados Unidos; os movimentos pan-africanistas e os movimentos de libertação do
continente africano. Internamente, a sociedade civil negra, além de estabelecer uma luta
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contra o racismo, com o surgimento da organização s ocial como o Movimento Negro
Unificado, trava uma luta, ao lado de outras organizações da sociedade civil, contra a ditadura
militar. Algumas figuras negras como Carlos Alberto Caó e Abdias Nascimento participam
ativamente da Constituinte, e, em 1988, conseguem fazer aprovar alguns artigos
importantes, como o artigo 20 da Lei 7.716/1989, que tipifica o racismo como crime; os artigos
115 e 231, entre outros, revelam que o Brasil se assume como uma nação multicultural, ou
seja, onde o Estado se compromete-a proteger os direitos de povos indígenas e afro-
brasileiros (MALOMALO, 2017b; D´ADESKY, 2001).
Em 1995, na celebração de 350 anos da morte de Zumbi, as organizações negras, ao
perceberem que a situação da população negra continuava deplorável, realizaram em Brasília
a Marcha Zumbi de Palmares contra o Racismo e pela Vida exigindo o reconhecimento do
racismo estrutural por parte do Estado brasileiro, assim como políticas afirmativas para
combatê-lo. O governo Fernando H enrique Cardoso (FHC), com o Dec reto de 20 de
novembro de 1995, cria um Grupo de Trabalho Interministerial com finalidade de desenvolver
políticas de valorização da população negra.
Os anos 90 são tidos, numa a la da intelectualidade negra, como o período de debate
teórico e político sobre o multiculturalismo, Estado e movimentos sociais. Várias são as
soluções propostas: havia, de um lado, o movimen to das reparações, que tinha iniciado em
São Paulo desde 1993 e, de outro, os grupos que defendiam políticas de cotas e/ou ações
afirmativas (FONSECA, 2009). Em 28 de dezembro de 2000, o poder executivo do estado do
Rio de Janeiro implementa a Lei no 3524, destinando cotas de 50%, no mínimo, do total de
vagas oferecidas pelas universidades públicas estaduais, nos respec tivos cur sos de
graduação, aos estudantes que tiveram cursado integralmente os ensinos fundamental e
médio em instituições de rede pública dos municípios e/ou do estado. Em 9 de novembro de
2001 sanciona a Lei no 3.798, que assegura as cotas raciais, ou seja, 40% para a população
negra e parda nos cursos de graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da
Universidade Estadual do Norte Fluminense.
Em 2001, o governo FHC subsidia financeiramente a delegação brasileira para a
Conferência de Durban, na África do Sul. As lideranças do Movimento Negro foram em peso
e conseguiram eleger uma mulher negra, Edna Roland, como relatora da comissão. Se, para
o governo brasileiro, esses gestos eram uma forma de se afirmar nacional e
internacionalmente como defensor de direitos humanos, par a as organizações ne gras,
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tratava-se de uma forma de obrigar o Estado brasileiro a assumir a sua responsabilidade para
com a população negra num período pós-abolição. Criticado, mesmo sendo contra a política
de cotas, mas a favor de políticas de ações afirmativas, cria o programa de ações afirmativas,
que consiste na oferta de bolsas de estudos par a negros/as nos processos seletivos de
diplomatas no Instituto Rio Branco.
Para Malomalo (2017b), no período dos dois mandatos de Lula, pode -se dizer que se
começaram a desenhar políticas do Estado em relação à igualdade racial. No setor privado e
na sociedade civil, a mesma dinâmica de implementação de políticas públicas de ações
afirmativas está em curso. Em 2009, houve a Revisão da Conferência de Durban em Genebra.
Mantiveram-se os principais pontos em relação às políticas públicas voltad as para a
superação do racismo e discriminação racial da Conferência de 2001.
O advento dos governos de Lula, entre 2003-2010, marcaria uma nova história das
políticas públicas para a população negr a. A questão racial ocupa a pauta do debate sobre o
desenvolvimento nacional. Para tanto, apostou-se na criação da SEPPIR e na promulgação
das Lei 10639 e do Estatuto de Igualdade Racial.
A política externa do governo Lula caracterizou-se pela abertura para os países do Sul
e teve a ver com a crise política internacional, co m a retomada do crescimento da economia
mundial e com o lugar que a África veio a ocupar no início do século XXI, a partir do
crescimento de suas economias. É neste contexto que este governo brasileiro construiu uma
política externa de cooperação Sul-Sul, na qual os países da América Latina e da África,
especialmente os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), passaram a ocupar
lugar de destaque.
O que as pesqui sas mostram é que a África entrou de forma favorável
economicamente no século XXI. O PIB continental girava em torno de 5 a 6%. Ademais, o país
parceiro do Brasil, a Angola, por exemplo, tinha um PIB que crescia em torno de 20%. O que
ocorreu, de fato, no continente, no período de 2000 até 2013, foi o crescimento econômico e
não o desenvolvimento sustentável (SARAIVA, 2012, 2015; PEREIRA; VEIGA, 2011).
A retenção de 2013 serve não somente de parâmetro interpretativo desse te xto, mas
igualmente por marcar os cinquenta anos de existência da Organização da União Africana
(que se transformou em 2001 em União Africana). Nesse período, os chefes de Estados
africanos lançaram a Agenda 2063, que visa ao desenvolvimento sustentável inclusivo do
continente no prazo de cinquenta anos. Embora se reconheçam os esforços de muitos países
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na superação da pobreza, de conflitos, na realização de reforma da administração pública, na
democratização de sua instituição, quando comparado aos anos anteriores aos de 1990,
ressalta-se igualmente a dependência de suas economias atreladas à produção e exportação
de matérias primas. Por isso, advoga-se a diversificação de suas economias, valorizando a
industrialização, o setor de infraestrutura e de tecnologia. Além disso, os Estados africanos
vêm sendo orientados para investir no desenvolvimento humano: políticas de igualdade de
nero; formação de mulheres e jovens para a ocupação de um lugar de destaque no
mercado de trabalho (CEA/ONU; UA, 2011; UA, 2015).
Os dois governos Lula (2003-2010), que souberam contornar a crise econômica de
2001, encontrara m uma África em pleno crescimento econômico. Ademais, buscando
consolidar a hegemonia brasileira, por exemplo, na ocupação de um assento no Conselho de
Segurança da ONU, no comércio exterior e/ou na criação de uma nova imagem, os governos
petistas contavam com o apoio dos países africanos (MALOMALO, 2014c; HELENO, 2014;
SARAIVA, 2015).
Vista desse ângulo, a cooperação Sul-Sul no século XXI, embora inspirada pelos
princípios de Conferência de Bandung de 1955, dentre outros a solidariedade, o
enfrentamento ao colonialismo, combate ao racismo, intercâmbios comerciais justos, serve
igualmente aos interesses estratégicos, políticos e econômicos dos países parceiros.
Conforme o relatório de UNCTAD (2010) (Conferência das Nações Unidas sobre o
Comercio e Desen volvimento), intitulado « Desenvolvimento econômico na África. A
cooperação Sul-Sul : a África e as novas formas de parceria para o desenvolvimento »,
[t]odos os parceiros do Sul desejam ajudar a África a atender suas
necessidades de desenvolvimento, mas existem diferenças
significativas no que diz respeito ao interesse comercial ou
estratégico que a região apresenta para eles [...]. Por exemplo, Brasil,
China e Índia vêem a África como uma importante fonte de recursos
naturais necessários para alimentar e sustentar seu crescimento
econômico. Eles também vêem a região como um mercado crescente
para suas exportações, e estão cada vez mais buscando seu apoio no
cenário mundial. A este respeito, a República da Coreia difere do
Brasil, da China e da Índia porque o seu compromisso é ditado mais
pela necessidade de recursos naturais (petróleo) do que pela
necessidade de acesso ao mercado ou apoio político no plano global.
Quanto à Turquia esta está mais interessada em encontrar mercados
para seus produtos do que em encontrar recursos naturais ou apoio
no cenário mundial. (p. 11-12, tradução nossa).
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É dentro deste contexto que se deve compreender a cooperação Sul-Sul brasileira em
relação à África e, de forma particular, aos PALOP. Todavia, além dos interesses supra
citados, os governos de Lula têm evocado igualmente motivos históricos nos discursos que
fundamentam a cooperação solidária.
À criação da UNILAB Lula chamou de pagamento de uma dívida histórica para com
os/as africanos/as e seus/as descendentes e, para ele, essa dívida não poderia ser paga com
dinheiro mas com solidariedade INSTITUTO LULA , 2013; SILVA, 2010b). Este termo,
cooperação solidária, vem sendo muito usado no contexto d a política externa brasileira
desenvolvida, principalmente pelo governo Lula, para sinalizar as a ções de cooperação
internacional com os países do Sul não atrela das às condicionalidades, nem interesses
econômicos. Recortamos um trecho da fala do ex-presidente Lula em um programa de rádio
em 2010.
Hoje nós temos um estatuto da igualdade racial. Nós temos uma lei que dá
mais direito e que recupera a cidadania do povo negro brasileiro. É
importante a gente nun ca esquecer que nós ficamos 380 anos, sabe,
praticando escravidão neste país. O Brasil foi o último país do mundo a abolir
a escravidão. Acho que nós temos uma dívida enorme com o continente
africano, com o povo africano. Um a dívida que a gente nunca vai poder
pagar em dinheiro. [...] a gente vai poder pagar, sabe, em solidariedade, em
ajuda humanitária, em ajuda ao desenvolvimento, em ajuda n o
conhecimento científico e tecnológico. O Brasil tem que ajudar o povo da
África. Nós vamos construir uma universidade luso-afro-brasileira na cidade
de Redenção, no estado do Ceará, cidade essa que foi a primeira em que
houve o movimento pela libertação da escravidão no Brasil. [...] é uma
universidade que nós defendemos que ela tenha por volta de dez mil alunos,
cinco mil alunos africanos e cinco mil alunos brasileiros. Essa universidade é
pra isso. É pra gente formar profissionais. É pra gente fazer uma espécie de
pagamento de tributos que nós temos com o continente africano, e ajudar o
continente africano (SILVA, 2010a).
O trecho citado acima foi recortado da entrevista do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva concedida à TVNBR durante o seu segundo mandato, no qual relacionou, de forma
deliberada, a promulgação do Estatuto da Igualdade Racial e a Lei no 12.289, de 20 de julho
de 2010, que instituiu a UNILAB como universidade pública feder al. Vemos, no discurso do
então presidente, que fica clara a intenção de se realizar algo que, de alguma forma, possa
remediar, ainda que minimamente, a participação do Brasil no processo de escravidão dos
povos africanos. Uma dívida que deve ser paga com solidariedade. Esta solidariedade seria
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colocada em prática, por meio da fundação da UNILAB, nesta parceria para fins de educação
superior com os PALOP e Timor Leste.
Para a efetivação do projeto da UNILAB, foi instalada uma comissão:
A instalação da Comissão de Implantação da Universidade da Integração
Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), em outubro de 2008,
pelo Ministério da Educação (MEC), deu seguimento a esse esforço [de
expansão do en sino superior no país]. E a sanção presidencial da Lei nº
12.289, de 20 de julho de 2010, que dispõe sobre a criação da universidade,
espelha concretamente essa política (UNILAB, 2010).
A Comissão de Implementação da UNILAB foi instituída pela portaria MEC/ Secretaria
de Educação Superior (SESu), no 712, de 9 de outubro de 2008, prorrogada por 180 dias pela
portaria MEC/SESu no 1.110, de 29 de julho de 2009. Compuseram essa comissão: membros
do governo, da SEPPIR, do MEC, d o Ministério das Relações Exteriores (MRE), da sociedade
civil, do movimento negro, das universidades públicas e das agências internacionais, como a
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).
A Lei no 12.289, de 20 de julho de 2010, sancionada por Lula, institui a fundação desta
universidade. A UNILAB, nesse sentido, cumpre dupla missão na política do governo Lula: a
interiorização e a internacionalização do ensino superior brasileiro. A política de
interiorização é parte da política da expansão do ensino superior no Brasil. Para atender a
essa demanda, o então governo criou o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação das
Universidades Federais (REUNI). Com o REUNI, o governo federal adotou uma série de
medidas para retomar o crescimento do ensino superior público, criando condições para que
as universidades federais promovessem a expansão física, acadêmica e pedagógica da rede
federal de educação superior para regiões do interior onde, até então, não se pensava em
criar universidades.
A criação da UNILAB corresponde à implantação de políticas de integração da
população ne gra e indígena, historicamente excluída do ensino superior. Embora a Lei de
Cotas tenha sido aprovada apenas no governo Dilma, é evidente que havia uma relativa
abertura para o diálogo junto aos movimentos sociais, especialmente os movimentos negros,
já nos governos Lula. O governo Dilma fe z votar a Lei das Cotas (Lei no 12.711/2012), que
garante a reserva de 50% das matrículas por curso e turno nas universidades federais e
institutos federais d e educação, ciência e te cnologia a a lunos oriundos integralmente do
ensino médio público em cursos regulares ou da educação de jovens e adultos. Dentro destes
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50%, os estudantes autodeclarados pretos, pardos e de famílias com renda inferior ou igual a
um salário mínimo per capita devem ser contemplados. Os demais 50% das vagas
permanecem para ampla concorrência.
Solidariedade ou dominação? Embora as Diretrizes da UNILAB apontem para
concretização da universidade enquanto um mecanismo de desenvolvimento, baseado na
solidariedade e reciprocidade o discurso de Lula aponta mais no sentido do pagamento de
uma dívida à ́frica Ou seja seu discurso evoca mais uma relação de obrigação, uma vez
que o Brasil participou ativamente na escravidão de negros/as da África. Mais que isso,
percebe-se, também, a necessidade de mostrar um Brasil que busca cooperar com os PALOP
como se não houvesse nenhuma relação de troca.
A questão que estamos levantando muito nos preocupa porque, apesar das relações
baseadas na cooperação do Brasil para com a África, por um lado, te rem gerado muitos
avanços em termos de iniciativas como a UNILAB e outros programas de transferência de
conhecimento, por outro lado, fica evidente o interesse que o país tem de expandir sua
liderança política e ação predatória de empresas brasileiras em países africanos, em que a
dualidade da atuação diplomática reflete, além dos limites estruturais para a cooperação
internacional, as contradições existentes na sociedade brasileira (HELENO, 2014).
Embora a política internacional do governo Lula tenha se deslocado para o eixo Sul,
ele não abandonou os aliados do Norte, apenas ampliou o seu leque de parcerias, dando uma
ênfase um tanto maior para os PALOP, Ásia e América Latina.
Em relação à África, a diplomacia brasileira apresenta duas facetas: uma
cooperativa, materializada em diver sos programas de transferência de
conhecimentos, e outra dominadora, revelada pelo interesse brasileiro em
expandir sua influência política e pela ação predatória de empresas
brasileiras em países africanos [...] Diante de uma aparente contradição
(cooperação e dominação), analisamos a política externa do governo Lula
(HELENO, 2014, p. 128).
Tanto Heleno (2014) como Leite (2011) vão apontar que as ações tomadas no governo
Lula não fogem das demais iniciativas de outros governos brasileiros, inclusive do período
ditatorial, que focaram no modelo de desenvolvimento econômico brasileiro, numa lógica
capitalista de poder, buscando estreitar a hegemonia nacional. Para isso, o modelo de
desenvolvimento brasileiro sempre levou em consideração a promoção de empresas que são
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consideradas campeãs nacionais
6 termo que, apesar do presidente do Banco Nacional do
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) (2007-2016) renegar, leva em conta os
grandes empréstimos e condições generosas dadas a empresas como Andrade Gutierrez,
Camargo Correa, Odebrecht, Petrobras, Qu eiroz Galvão e Vale, que, segundo o Banco
Mundial, em dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em
2011, são as principais empresas brasileiras no continente africano, em termos de volume de
vendas e investimentos.
O Relatório do Banco Mundial re trata as relações estabelecidas entre estas grandes
empresas e a comunidade local como desenvolvimento de capacidades elas tendem a
contratar mão de obra local para seus projetos, favorecendo o desenvolvimento de
capacidades locais, o que acaba por elevar a qualidade dos serviços e produtos O mesmo
relatório também enfatiza que quase 60% dos recursos da cooperação técnica brasileira
foram destinados para os países africanos em 2010 (IPEA; BANCO MUNDIAL, 2011).
Infelizmente, o relatório não divulga que estas mesmas empresas vêm recebendo
diversas críticas devido aos problemas sociais e ambientais que foram criados e vêm sendo
agravados pela atuação destas. A Vale, por exemplo, foi alvo de diversas denúncias em
Moçambique, isto porque, para sua instalação, chegou a desapropriar diversas pe ssoas sem
nenhuma indenização. Além disso, a Vale, com o apoio dos próprios governos locais, vem
utilizando mecanismos de repressão às manifestações sociais dos/as moradores/as locais.
A exemplo da Vale, também esteve a Odebrecht em Angola, que contou, naquela
época, com o prestígio do ex-presidente José Eduardo dos Santos7. Estas grandes
transnacionais contratam mão de obra local sem condições dignas de trabalho e sem nenhum
direito trabalhista. As corporações brasileiras que atuaram e ainda atuam, em diversos países
da África, compõem uma elite que vivenciou um processo de grande acumulação de capital
6 As campeãs nacionais são tidas como empresas nacionais de grande porte que possuem forte elemento de
presença e expansão para o mercado internacional e que atuam com recursos públicos, que não estão
igualmente disponíveis para outras empresas ou setores do país.
7 Para ter mais detalhes sobre a atuação destas corporações em Moçambique e Angola, ver: Radio Mundo Real.
A Vale continua perseguindo e criminalizando os lutadores sociais em Moçambique. Disponível em:
http://radiomundoreal.fm/6761-as-respostas-das-transnacionais?lang=es.Voa Português. Desalojados
moçambicanos acusam Vale de não cumprir promessas. Disponível em: http://www.voaportugues.
com/a/moambique-vale-desalojados/3397427.html . Acesso em 03 de maio de 2017.
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durante os governos petistas contando com o apoio de instituições p’blicas financiamento
e isenções fiscais HELENO 
A cooperação Sul-Sul/solidária acaba se constituindo enquanto falácia em ímpetos de
governança capitalista e predatória, na qual a relação diplomática brasileira é vista como
contraditória e muito baseada em interesses econômicos e políticos do Brasil para com estes
países do Sul É o que Visentini  vai chamar de imperialismo soft que se traduz numa
prática em que muitos países do ocidente, em atitudes imperialistas e colonizadoras, buscam
dar novos significados a práticas já antigas, presentes desde a colonização.
Percebe-se também que, de maneira geral, especialmente no caso do Brasil, mas não
exclusivamente, pois outros países não fogem à regra, a prática da cooperação solidária não
pressupõe relação de ajuda m’tua em que ambos países envolvidos po ssam contribuir no
desenvolvimento de suas nações. Neste sentido, podemos fazer uso do que Serge Latouche
 p  aponta Se queremos ajudar alguém é preciso ter também o que pedir em troca
O dom sem contra dom é perverso, é uma forma de vontade de dominação e de arrogância
 se a ́frica é pobre naquilo que somos ricos ela se revela rica naquilo que somos pobres
É evidente que esta cooperação tem trazido benefícios para países africanos, mas,
numa lógica perversa, tem beneficiado muito mais as empresas brasileiras instaladas nestes
países. Essa relação vertical estabelecida pelos governos brasileiros, inclusive os petistas, tem
como consequências drásticas: o mau funcionamento das relações que são estabelecidas a
partir destes acordos, como é o caso da UNILAB. A política externa brasileira, a sociedade e
a gestão da UNILAB compartilham a ideia de que os/as estudantes africanos/as e timorenses
vêm ao Brasil apenas para consumir conhecimento Como se não pudessem contribuir de
maneira igualmente rica, com o desenvolvimento local e da sociedade brasileira.
Veremos a seguir de que maneira solidariedade o termo chave da cooperação Sul-
Sul, é levado em conta na prática de gestão da Universidade e do acolhimento dos discentes
africanos.
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A UNILAB na perspectiva da cooperação Sul-Sul... | Bas´Ilele Malomalo, Julie Lourau e Osmaria Rosa Souza
Cooperação Brasil-África nos governos Dilma (2010-2016)
A UNILAB, como projeto de esquerd a brasileira, começou a funcionar em 2011,
durante o primeiro mandato do governo Dilma Rousseff. Como microcampo político nos
auxilia avaliar a política externa brasileira para com a África durante o primeiro e segundo
mandato da primeira mulher presidenta da nação.
A UNILAB conheceu três gestões durante os dois mandatos do governo Dilma (2010-
2016). A primeira gestão de Paulo Speller (2011-2013) herdou o boom econômico da era Lula,
e isso fez com que a UNILAB recebesse uma atenção especial da parte do MEC e recursos
suficientes para a implementação do seu projeto inicial.
Algumas das falhas dessa gestão, do ponto de vista da cooperação internacional
solidária são essas: a manobra feita pela reitoria da universidade junto com a cumplicidade
do MEC em não publicar o Estatuto da UNILAB, retardando o processo da democratização
interna desta instituição internacional a supremacia branca em todos setores importantes
da universidade dificultou para que a gestão da UNILAB tivesse uma marca internacional
(MALOMALO, 2018), isto é, incorporasse docentes africanos/as e negros/as brasileiros/as nas
instâncias de execução, especialmente nas pró-reitoras; essa gestão falhou na condução de
concursos que deveriam atrair profissionais brasileiros/as e dos países africanos especialistas
nos assuntos africanos e afro-brasileiros; não conseguiu preencher a cota de 50% destinados
aos estudantes da CPLP, especialmente dos países africanos, sendo uma das razões a não
valorização de docentes africanos/as na política de seleção de estudantes estrangeiros/as.
No segundo mandato da presidenta Dilma Rousseff, em 2013, o reitor pró-tempore,
Paulo Speller foi nomeado secretário do ensino superior no MEC e, para substituí-lo, na
UNILAB, foi indicada Nilma Lino Gomes, que se tornara a p rimeira mulher negra reitora de
uma universidade pública federal no Brasil. O ponto altamente positivo de sua gestão foi o
de ter tr azido um grupo de intel ectuais negros e negras com experiência na militância par a
dirigir as pró-reitorias de graduação, extensão, arte e cultura e das políticas estudantis e
afirmativas.
Embora a lei de cotas tenha sido aprovada desde 2012, no governo Dilma, as
sucessivas gestões superiores da UNILAB não fizeram questão de tratar isso como prioridade
na seleção de estudantes negros/as brasileiros/as. Essa dificuldade se estende igualmente na
lei de cotas em concursos públicos realizados nessa instituição.
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Conforme apontamos anteriormente, o tópico comum da política externa do Brasil
para com a África no período Lula e Dilma se caracteriza pelas suas contradições. De um lado,
há um discurso progressista de cooperar com a África de forma solidária e, de outro lado, não
se cuidou de realizar acompanhamento e monitoramento dos atores do capital nacional
brasileiro que atuar am no continente africano. Ad emais, se no período Lula havia um
dinamismo entre Itamaraty e o continente africano, por exemplo, as constantes visitas feitas
pelo presidente Lula durante o seu mandato, nos governos Dilma observa-se um
afrouxamento.
Quando Nilma Lino Gomes chegou, uma das primeiras coisas que fez foi dividir a Pró-
reitoria de Graduação e Assuntos Estudantis (PROGRAD) em duas: Pró-reitoria de Graduação
(PROGRAD) e a Pró-reitoria de Políticas Estudantis e Afirmativas (PROPAE), com uma
Coordenação de Políticas de Ações Afirmativas que comporta dois núcleos: Núcleo de
Políticas de Sexualidade e Gênero e Núcleo de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros.
Outra falha da gestão Nilma Lino Gomes foi a falta de diálogo com os grupos de
estudantes e docentes africanos/as. Isso fez com que houvesse maior peso nas questões afro-
brasileiras do que nos assuntos africanos. Essa gestão é aquela que começou a sentir a crise
do orçamento no segundo governo de Dilma. A falta do tato político da reitora pro tempore
junto ao autoritarismo de alguns membros da gestão superior criaram dificuldades em
traduzir para a comunidade estudantil o problema financeiro que o governo estava passando.
O resultado de tudo isso é que se cooptou a maioria dos integrantes do Conselho
Universitário (CONSUNI), que votou uma resolução que reduzia a entrada de estudantes
internacionais de 50% para 20%.
A crise em emergência, em 2014, te ve impactos negativos nas bolsas e auxílios
estudantis (NASCIMENTO, 2013; ASSIS, 2014). Dessa forma, os estudantes africanos fizeram
a primeira greve, ocupando o campus e exigindo o pagamento de seus auxílios que estavam
atrasados. Essa greve criou um conflito interno, dividin do a comunidade acadêmica em dois
grupos: o primeiro, de maioria brasileira, branca, junto a uma minoria negra que possuía
cargos em setores da gestão; e o segundo grupo, composto de maioria africana e uma
minoria brasileira. A crise acabou com a convocação de uma Assembleia Geral
Universitária durante a qual a reitora pro tempore se comprometeu a pagar os auxílios.
Ademais, um grupo de docentes exigiu, na ocasião, a publicação do Estatut o e a realização
das eleições internas.
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A terceira gestão foi de Tomaz Aroldo da Mota Santos (2015-2016). O seu vice foi um
professor cearense e docente do Instituto de Ciências da Natureza e Matemática, Aristeu
Rosendo Pontes Lima, nomeado vice -reitor pro tempore quando Nilma Lino Gomes foi
convocada, em Brasília, para assumir a SEPPIR. Por ser um jovem inexperiente na gestão de
uma universidade internacional, como a UNILAB, ao assumir, um dos seus primeiros atos foi
baixar uma resolução que determinava que os/as estudantes, em maioria no Instituto de
Humanidades e Letras (IHL), não podiam mais acumular a bolsa permanência e os auxílios
que recebiam para sua manutenção, o que logo gerou a maior greve estudantil da história da
universidade. A inexperiência mostrou, em muitos outros aspectos, como a incapacidade de
diálogo com os/as estudantes, posto que o vice-reitor chamou a polícia para prender os
estudantes nacionais e internacionais grevistas. Um grupo de professores e os movimentos
sociais locais apoiaram os/as estudantes. A greve só acabou com a vinda do novo reitor pro
tempore, Tomaz Aroldo da Mota Santos, que tinha uma longa experiência na gestão de uma
universidade pública.
O referido reitor, apesar de agir como um estrategista d a política que visa à
manutenção do seu poder e do seu grupo, foi um dirigente de diálogo e que mais trabalhou
para a institucionalização da UNILAB. Conduziu muitas comissões para dar soluções aos
problemas internos, entre as mais importantes pode-se evocar a comissão que trabalhou
para a redação de um novo estatuto e regimento e de uma resolução que definisse o lugar do
campus fora da sede: Campus dos Malês, na Bahia. A comissão se debruçou para encontrar
soluções sobre novas regras de distribuição de auxílios estudantis.
A reitoria de Tomaz Aroldo da Mota Santos, como as outras, não soube capacitar o
corpo de servidores para saber lidar com as questões africanas e afro -brasileiras que a
UNILAB exige. Em outras palavras, a UNILAB continua sendo dirigida numa perspectiva da
hegemonia branca, brasileira e cearense. Docentes africanos/as continuam sendo minoria
nas instâncias de poder. O racismo contra estudantes africanos/as den tro e fora da
Universidade continua sendo um problema que exige urgência no trato (MALOMALO, 2018;
SOUZA, 2018).
Outro elemento grave desse período é que, antes do golpe parlamentar contra o
governo Dilma, um setor da universidade sinalizou para a reitoria a necessidade de se realizar
uma consulta para eleger um/a reitor/a que fosse docente interno, com a possibilidade de se
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ter candidaturas da gestão e da oposição. Essa sugestão foi negada . Quando veio o golpe,
Aroldo foi deposto; o seu vice fez a transição e o MEC nomeou um quarto reitor pro tempore.
Cooperação Brasil-África no governo de Temer (2016-2018)
A crise global atingiu o seu ápice no Brasil com o golpe parlamentar sofrido pela
presidenta eleita nas urnas, Dilma Rousseff, em 2016 (PRONER, 2016a, 2016b; GEN TILI,
2016; JINKINGS; DORIA; CLETO, 2016). Em meio à crise política, institucional e econômica,
os grupos fascistas e ultranacionalistas revelaram o seu desprezo e racismo contra imigrantes
e minorias nacionais.
Na UNILAB, o nacionalismo fundamentalista, além de aparecer em momentos de
conflitos de relações interpessoais (MOURÃO, 2016), mostrou-se, também, dentro do
processo de impeachment da presidente Dilma, a partir do discurso de um radialista da região
de Redenção-Ceará de nome Donizetti, que acusava os /as estudantes africanos/as de serem
terroristas, pelo fato de alguns serem muçulmanos/as.
Esses estereótipos estão tanto nas relações verticais estabelecidas pelo Brasil em
relação aos PALOP quanto nas motivações interpessoais, cotidianas. A direita brasileira que,
além de xenofóbica é racista, vem demonstrando aversão ao projeto UNILAB desde meados
de 2016, quando a então presidenta Dilma Rousseff sofreu o inconstitucional impeachment.
O ódio aos projetos e programas sociais criados nos governos petistas sempre foi a
marca da direita neoliberal, mas o que se percebe pós-golpe, a partir das ações e discursos
dessa elite, é a afirmação de uma branquitude que coloca tudo que não lhe pertence como
inferior, desprezível e passível de ser explorado (MALOMALO, 2017c, 2014a).
Trabalhamos com a hipótese de que as políticas sociais, inclusive aquelas no campo
da educação, sempre foram vistas com maus olhos, haja vista que não era a prática nos
governos anteriores ao PT. No entanto, após a saída do PT em 2016, de maneira geral, o que
se percebe no Brasil, quando remetemos à criação da UNILAB, é o fato de ela ser vista como
apenas mais um projeto petista que visa trazer estudantes africanos para estudar de graça
no Brasil.
Este estado de d esinformação a que nos referimos se dá por meios dos conteúd os
disseminados pela grande mídia brasileira, que, historicamente, tem sido produto e
propriedade da elite nacional e, como tal, vive a serviço da extrema direita. Apoiou golpes e
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encobriu muitas mortes na ditadura militar e, hoje, mais do nunca, tem se colocado a serviço
de um governo ilegítimo, que te m tentado, de tod as as formas, retroceder direitos
historicamente conquistados pelos/as trabalhadores/as brasileiros/as.
Traremos, a seguir, um recorte desse tipo de discurso. Em outubro de 2016, o
historiador Marco Antônio Villa, professor aposentado da Universidade Federal de São Carlos
(UFSCAR) e comentarista da rádio Jovem Pan, proferiu o seguinte discurso em relação à
UNILA e UNILAB
8:
[...] eu desconheço essa universidade. [...] eu queria saber que relação há
entre o Timor Leste, África, o Maciço de Baturité e o Recôncavo Baiano [...]
A herança maldita do PT vai durar décadas. No campo da educação, essa
universidade é um escândalo [...], portanto, o projeto criminoso do poder
petista deixou uma herança maldita em todas as áreas de estrutura do Estado,
agora na educação, que herança! Foram criadas dezenas de universidades
federais absolutamente inúteis para formar militantes e n o caso das que eu
citei hoje, são muito graves. [...] MEC dev e explicar sobre a Un iversidade
Federal da Integração Latino-Americana  universidades absolutamente
in’teis9 (grifo nosso).
Este foi apenas um trecho de várias falas prof eridas pelo então historiador que
sempre se posicionou contra políticas de ações afirmativas no Brasil. Este contribuiu e ainda
contribui para que possamos refletir sobre o ódio que se vivencia na sociedade brasi leira,
além de uma aversão aos governos pet istas e, junto com eles, tudo que pode ter sido criado
para atendimento de demandas sociais de populações vulneráveis da sociedade brasileira.
Para Villa tanto a UNILAB quanto a UNILA são universidades absolutamente
in’teis já que não ensinam e nem produzem conhecimento muito pelo contrário são
ideológicas e fazem parte de uma visão de mundo muito precária, que propaga a herança
maldita que ele denomina de lulopetismo Ainda pede para que o MEC se posicione quanto
8 Houve igualmente manifestações de alguns agentes dessas universidades, por exemplo: REITOR ELEITO DA
UNILAB responde a Marco Villa: estudar! Viomundo, 26/10/202016. Disponível em:
https://www.viomundo.com.br/voce-escreve/reitor-eleito-da-unilab-responde-a-marco-villa-va-
estudar.html. Acesso em: 26 out. 2016; CARTA ao comentarista Marco Antonio Villa sobre a Unila. Desacato,
19/10/202016. Disponível em: http://desacato.info/carta -ao-comentarista-marco-antonio-villa-sobre-a-
unila/. Acesso em: 19 out. 2016.
9 JOVEN PAN NE W. Din heiro p’blico para sustentar curso de pretagogia não dá - Marco Antonio Villa .
19/10/202016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=M2UaAEWKE-s. Acesso em: 19 out. 2016.
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à criação das duas universidades, enfatizando que o Brasil levará pelo menos uma década
para se livrar dessa herança maldita.
Tal herança, para Villa, também se resume às dezenas de universidades que for am
criadas nos governos petistas e que servem apenas para formar militantes Ele ignora
completamente o número de jovens, inclusive jovens negros/as, que ingressaram no ensino
superior público desde os anos 2000, por m eio do sistema de cotas sociais e r aciais,
implantado nos governos Lula e Dilma.
Ainda que, com todas as críticas que temos aos governos petistas, não podemos negar
os avanços na educação superior e, neste campo, temos a UNILAB. E nela está o nosso grande
desafio, que é ver o projeto dar certo, tendo em conta o que ele representa em termos de
alianças historicamente construídas para com o continente africano, a Ásia
10 e a América
Latina.
Kally (2001) nos apontou que a vinda de imigrantes africanos sempre foi dificultada.
E, a exemplo desta afirmativa, temos a Constituição de 1934, que, segundo Medeiros (2013),
é considerada a mais racista pelos estudiosos devido a afirmar que a educação no país deveria
seguir os princípios da eugenia, estabelecendo cotas de imigrações baseadas no número de
pessoas vindas de determinados países nos últ imos cinquenta anos (países europeus,
especialmente).
Ou seja, houve ações afirmativas para imigração europeia (branca) no Brasil que não
geraram os mesmos embates que essa iniciativa de ação afirmativa para imigração estudantil
africana e do Timor Leste pr oposta por Lula, ou, até mesmo, as ações afirmativas com
critérios raciais para que a população negra e indígena brasileira possa ter acesso ao ensino
superior público no Brasil.
O Brasil, como vemos claramente e não muito diferente de diversos países do mundo,
sempre escolheu o tipo de cidadão/ã que deveria, conforme seus interesses, compor o país.
E, como salienta Castro (2005), vivemos em tempos de violações de princípios mínimos de
respeito ao humano, em que imigrantes, principalmente os/as negros/as, são
constantemente criminalizados/as.
10 No caso da Ásia, apenas Timor Leste têm sido contemplado enquanto país que faz parte da UNILAB.
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A atual gestão de Anastácio de Queiroz Souza iniciou em 2016 junto com o golpe
parlamentar. Chegou num ambiente de divisão interna, tendo, de um lado, o grupo do antigo
reitor pro tempore, à exceção do vice, que pediu a demissão, que trabalhava pela manutenção
do seu poder e, de outro lado, o grupo da oposição, desmoralizado pelo fato de não conseguir
legitimar, através do CONSUNI, a consulta informal que tinha realizado. Esta, inicialmente,
contou com o apoio do Sindicato da UNILAB (SINDUNILAB), que auxiliou em montar uma
comissão que cuidou do todo processo de consulta posterior.
A criminalização do projeto UNILAB deu seus indícios na gestão antidemocrática da
própria universidade, desde a mudança de governo, com novo reitor pró-tempore, Anastácio
de Queiroz Sousa. Em 05 de julho de 2017 foi publicado um aditivo que alterava o edital
17/2017, que tratava sobre o processo seletivo em andamento de estudantes estrangeiros/as
para ingresso nos cursos de graduação da UNILAB.
O aditivo em questão buscava cancelar a demanda orçamentária que vinha
garantindo, até então, a assistência material do Programa Nacional de Assistência Estudantil
(PNAES) para estudantes internacionais ingressos na universidade por meio do processo
seletivo em seus países de origem. O cancelamento dessa política de permanência é o
desmonte de todo o projeto de internacionalização e integração com a África e Timor Leste.
Devido à pressão da comunidade acadêmica, a medida foi revogada. Mas não temos a
garantia de como vem se efetivando a prática desses processos seletivos nos países em
questão.
Temos percebido que uma parcela de docentes ligados aos partidos e aos
movimentos sociais de esquerda passaram a apoiar a gestão de Anastácio de Queiroz Sousa,
vislumbrando permanecer nos cargos de poder da universidade, quando esse sair. Dessa
forma, nesse tempo de incertezas, os campi da UNILAB no Ceará vêm sendo geridos no jogo
perigoso dos interesses egoísticos e corporativos e no jogo do poder pelo poder . O campus
dos Malês, implementado em 2014, em São Francisco do Conde, na Bahia, por não ter poder
de barganha, é visto pelo reitor pro tempore atual como um gasto inútil e deve ser, para ele,
anexado à Universidade Federal da Bahia.
A situação que a UNILAB vem sofrendo corresponde à conjuntura mais ampla, que se
relaciona às posturas neoliberais que vêm sendo tomadas pelo atual governo de Michel
Temer, em relação ao ensino superior público no país. Na era Temer, as universidades
públicas brasileiras, principalmente aquelas criadas nos governos petistas, vêm sofrendo
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cortes constantes que ameaçam a permanência de estudantes pobres, negros, indígenas e
quilombolas.
Em 29 de maio de 2018, estudantes indígenas e quilombolas estiveram em uma
reunião com o ministro da educação, Rossieli Soares, que informou que, para este ano, a
proposta do Ministério da Educ ação é de apenas 800 bolsas. A medida, como podemos ver,
demonstra a falta de interesse do governo em garantir a permanência destes/as
estudantes nas universidades federais do país. Estudantes que ingressaram nas universidades
federais em 2018 estão até agora sem receber a bolsa e só ficaram sabendo da medida após
pressionarem o MEC para que respondessem sobre os benefícios que não estão sendo
ofertados aos novos estudantes. Para Luana Kumaruara, aluna indígena de antropologia da
Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA):
O ministro nos trouxe até Brasília para ser frio, ríspido, não se dispor a ouvir
as demandas e saber das realidades. Veio só para dar a decisão que já estava
tomada e dizer que precisava sair para reunião com Temer. Não veio para
um diálogo, somente para uma imposição [...] essa reu nião mostra os
retrocessos nos nossos direitos, onde se tenta atacar u ma política
garantida. Saímos frustrados com a decisão. Essa política de ação afirmativa
foi criada para atender uma vulnerabilidade, como fazer distinção de quem
é vulnerável ou não entre os vulneráveis?
11
O descaso apontado por Luana evidencia o tipo de prioridade do atual do governo.
Em 30 de maio, um dia após a declaração do corte/redução de bolsas permanência para
indígenas e quilombolas, o governo adota a Medida Provisória 839, que concede o crédito de
9,58 bilhões no ministério de Minas e Energia e Defesa optando, dessa forma, por dar
continuidade a uma política de preços que só tem favorecido e sustentado os interesses do
mercado. O governo de Temer vai bancar a privatização e as forças armadas brasileiras com
11 GAVALLI, Guilherme. MEC oferece apenas 800 bolsas e ameaça permanência de 4 mil indígenas e quilombolas
na universidade. Desacato. 02/06/2018. Disponível em: http://desacato.info/mec-oferece-apenas-800-bolsas-
e-ameaca-permanencia-de-4-mil-indigenas-e-quilombolas-na-universidade/. Acess o em 02 de junh o de
2018. O fato do MEC autorizar o pagamento de 2, 5 mil bolsas não modifica o foco da noss a argumentação
que é salientar a política ne oliberal do governo atual: Cf. MEC autoriza 2,5 mil bolsas para indígenas e
quilombolas. Agência Brasil. 15/06/2018. Disponível em:
http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2018-06/mec-autoriza-25-mil-bolsas-para-indigenas-e-
quilombolas. Acessado em 15 jun. 2016.
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o corte de orçamento que afe ta áreas e programas dirigidos às populações mais vulneráveis
do país.
Ações afirmativas, obviamente, como se pode ver, não são prioridade, políticas de
permanência, menos ainda. Soma-se o fato de que tanto os/as índios/as, como suas terras, já
não eram prioridade nos governos anteriores, e o cenário é o mesmo para a população pobre
e negra do país. As políticas públicas de cuidado para com as mulheres, negros/as, indígenas,
quilombolas, migrantes, população LGBTQI
12 jovens e usuários de drogas vão sendo cada vez
mais sucateadas.
Considerações finais
Retomando algumas considerações feitas por Malomalo (2018) na revista Sures, nossa
avaliação é que, no nível micro da cooperação Brasil-África, os desafios que a UNILAB
enfrenta e que, ao serem enunciados comportam germes de suas soluções, podem se traduzir
da seguinte forma: o maior desafio é encontrar dirigentes e servidores/as comprometidos/as
com o projeto original. Tivemos alguns avanços nas primeiras três gestões comandadas por
dois r eitores e uma reitora pro tempore indicados pelo PT. Cada gestor que trabalhou, no
período de 2010 até o golpe de 2016-2017, teve suas qualidades, por ém, o que mais
atrapalhou foi a politicagem fazer a política para se manter no poder ou almejando outros
interesses, usar o poder para servir a alguns grupos de interesses.
Os interesses particulares ou corporativos têm atrapalhado a concretização do
projeto da UNILAB. O que temos observado é que a aprovação do estatuto da universidade
foi feita para assegurar que aqueles que estão no poder ali permaneçam. A universidade virou
uma fábrica de reitores pro tempore. O que está posto é que os governos e os partidos
políticos, em cumplicidade com seus reitores indicados e seus grupos de interesse, usaram e
usam da UNILAB como arena da manutenção de seu poder. Só será possível mudar isso com
eleições que devem permitir à comunidade interna escolher seus/suas dirigentes
detentores/as de um plano de gestão comunitário pautado na filosofia do Ubuntu, por
exemplo.
12 A sigla LGBTQI em termos de luta dos movimentos sociais, vem ganhando força, já que inclui além de
orientação sexual e diversidade de gênero a perspectiva teórica e política dos Estudos Queer.
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O dinheiro investido na universidade, desde o início, foi muito mal aproveitado para
cumprir com o projeto de construção de prédios da UNILAB. Impera nas Diretrizes a ideia de
que a arquitetura da universidade deveria se inspirar nas culturas africanas e indígenas. Mas
o que foi construído foram os prédios de sempre: concretos que representam a filosofia
desenvolvimentista. Os problemas que temos nesses aspectos são graves: as residências
estudantis estão em atraso; as construções são feitas com poucos cuidad os com o meio
ambiente: faltam árvores, por exemplo.
Deixou-se de cuidar dos concursos públicos na seleção de profissionais, docentes e
TEAs. Dessa forma, a UNILAB colocou dentro de si seus/suas inimig os/as, pessoas que
trabalham para destruí-la. Essa destruição se manifesta pelo desejo de algumas pessoas em
-la anexada à UFC, ou, ainda, nos discursos racistas que desejam a não per manência de
estudantes estrangeiros/as. Como os processos seletivos já foram feitos, cabe à Reitoria,
conjuntamente com os colegiados dos Institut os, sindicatos de docentes e TEAs, pensar em
cursos de qualificação par a os/as concursados/as numa perspectiva intercultural e da
cooperação solidária.
Descuidou-se, desde a implementação da UNILAB, da política preventiva em torno
dos direitos do meio ambiente, da cidade, da segurança e da diversidade. Os Governos e as
Reitorias pro tempore deixaram de planejar a implementação de uma universidade nos
interiores do Ceará e da Bahia, concomitantemente com o planejamento urbano de cidades
que receberam seus membros. De 2011 até 2018, as cidades de Redenção e Acarape
passaram a receber mais de quatro mil pessoas. A criação de uma cidade internacional, com
esse número d e pessoas, exige ações conjuntas de dirigentes da UNILAB com os chefes de
executivos dos governos federais, estaduais e municipais: investimen tos na política de
mobilidade, na segurança, na infraestrutura, no lazer e, especialmente, nas políticas de
diversidade étnico-racial e de gênero. Sem isso, os estudantes brasileiros/as e estrangeiros/as
continuarão a vivenciar situações de negação de seus direitos de cidadania, o racismo na
universidade e fora dela
13.
13 Ler os trabal hos de Langa, Ercílio Neves Brandão. Diáspora Africana no Ceará no Século XXI: ressignificações
identitárias de estudantes imigrantes 2016 Tese ; Souza, Osmaria Rosa. Pensand o os direitos de cidadania
dos/as estudantes africanos/as no Brasil: estudo de caso sobre a política de assistência estudantil na
Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (2010-2017) 2018 - Dissertação
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Há pouca valorização (dos que já são poucos/as) professores/as negros/as africanos/as
nas instâncias de gestão e nos processos seletivos da universidade. É preciso que a política de
cotas na sua dimensão internacional seja cumprida. Caso contrário, construiremos uma
universidade internacional com cabeças-pensantes nacionais. A mesma política de cotas
deve ser praticada nos processos seletivos de estudantes estrangeiros/as. Talvez a crise
econômica e política atual sinalize que o Estado brasileiro deve criar um fundo conjunto com
a CPLP e, para ser ainda mais radical, com a União Africana (UA) para assegurar uma gestão
multilateral. Assim, poderemos superar os desafios de auxílios e bolsas e studantis. Ao dizer
isso, reconhecemos que o governo brasileiro deve abandonar a sua política neoliberal atual,
que é inimiga declarada da cooperação internacional solidária entre as nações do Sul.
O último desafio é da gestão entre a Sede do Ceará e o Campus dos Malês da Bahia.
Os problemas que nós enfrentamos são vários: precariedade na infraestrutura, uma péssima
comunicação entre setores do Ceará com os da Bahia, falta de investimento dentro de um
potencial enorme que o recôncavo baiano comporta, falta de diálogo com os países africanos.
Em suma, há a inexistência de uma cultura de se trabalhar num ambiente internacional,
intercultural e inter-regional. Uma universidade como a UNILAB exige a prática de uma outra
gestão pública.
Não se trata de pautar a sua ação nos cortes, pois é preciso responsabilidade e
compromisso com essas novas realidades que só a UNILAB tem: o internacional no interior.
Estamos falando de gestão de gente pautada na gramátic a de direitos humanos e de povos.
Tal gestão tem a dignidade humana como centro. Nossa autoavaliação se pauta no fato de
que, em muito, a UNILAB avançou, mas ainda é preciso que almejemos sua consolidação e
sucesso.
Ubu-ntu afirma Ramose  é o Ser-Sendo Isto é o Ser que se move para outros
Seres. A concepção africana do mundo e da vida , como uma abertura para com o Outro,
coloca-se como um princípio epistemológico, ético, estético e político para a superação da
crise atual.
Quando se pensa o mundo atual nessa perspectiva coletiva e solidária, a
desesperança, de que nos falou Freire (1992), o egoísmo, o racismo e a xenofobia deixam de
ganhar a centralidade. O medo deixa lugar à esperança. A esperança como realidade
ontológica ocupa o centro em nossas lutas epistemológicas e políticas para a defesa dos
direitos dos/as imigrantes e para o futuro da cooperação Brasil-África. Fazer isso é construir
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um mundo melhor para o Biso-Cósmico, a comunidade planetária cujos humanos fazem
parte. Trata-se da vitória da razão cosmopolita intercultural sobre a razão indolente
capitalista.
A pedagogia da esperança rima com a epistemologia de aposta de que nos fala
Boaventura de Souza Santos (SANTOS; MENESES, 2010). Apostar em nós mesmos, nesses
tempos de crise, como agentes transformadores; apostar nos/as políticos/as progressistas
que, apesar dos erros que cometem, possam vir a superá-los.
A UNILAB, para nós, continua sendo outro espaço intercultural e inter -racial onde as
contradições das políticas de cooperação e de integração de povos estruturam-se numa
lógica de tensão (SOUZA; MALOMALO, 2016). As estratégias de nossas lutas, apesar de suas
contradições, devem nos tornar semead ores/as da esperança e nã o do ódio. A nossa aposta
tem que ser mais alta a qui, uma vez que se trata de um espaço de excelência onde se educa
jovens brasileiros/as, af ricanos/as e timorenses a lutar contra todos os tipos de dominação,
contra o colonialismo, neocolonialismo, racismo, machismo, homofobia e a destruição do
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Dados dos autores
Bas´Ilele Malomalo
Doutor em Sociologia, docente no curso de Relações Internacionais e no Mestrado Interdisciplinar em
Humanidades/ Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira e Líder do
Grupo de Pesquisa África-Brasil: Produção do conhecimento, sociedade civil, desenvolvimento e
cidadania global. E-mail: basilele@unilab.edu.br
Julie Lourau
Doutora em Antropologia Social e Etnologia (EHESS), professora no Programa de Políticas Sociais e
Cidadania da Universidade Católica do Salvador e Líder do Grupo de Pesquisa Antropologia Fronteiras
Espaços e Cidadania (GP AFEC). E-mail: juliesarahba@gmail.com
Osmaria Rosa Souza
Mestra em Políticas Sociais e Cidadania pela Universidade Católica do Salvador, assistente Social e
pesquisadora do Grupo de Pesquisa Antropologia Fronteiras Espaços e Cidadania (GP AFEC). E-mail:
mari.pamais@gmail.com

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