Um Laudo de Avaliação de Descapacidade ou de Dano Corporal: Partes Essenciais

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas203-223

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1 Introdução

Traçar alguns parâmetros gerais, para proceder à determinação da descapacidade originada por deficiências permanentes, é a primeira tarefa exigida para poder acompanhar a sistemática deste texto.

Esta obra, como já se enfatizou desde o início, tem como objetivo primeiro atingir os operadores do Direito e, subsidiariamente, os médicos, que por força das circunstâncias, ora nos IMLs, ora nos ambulatórios do Instituto Previdenciário, ora em seu consultório particular, têm por obrigação funcional realizar esse tipo de exames. Por isso decidimos incluir alguns dados de índole biomédica e pericial, os quais, enquanto não se tornarem familiares a esses profissionais, podem lhes parecer estranhos.

Todavia, acreditamos que tais noções ou conhecimentos básicos podem orientar citados profissionais, seja na formulação de quesitos, sabendo de que forma poderão ser respondidos, ou até na compreensão das respostas, razão pela qual nos parece que poderiam ser necessários como conhecimento básico.

Com o fito de sistematizar o estudo e podermos realizar uma análise organizada dos conteúdos que devem ser alocados em cada módulo, é preciso lembrar que estaremos em presença de uma variedade de Relatórios, com algumas características diferenciais especiais.

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Logo, em se tratando de um Relatório, na conceituação de Tourdes, nada mais deverá ser feito senão a descrição minuciosa de uma avaliação médica e de suas consequências, normalmente requisitada por uma autoridade competente.

É um documento que exige compromisso prévio do emitente1, tanto na esfera policial como na esfera judicial, que obedece a deter-minada formalidade, minucioso, e que deve contribuir para o esclarecimento de um ou mais fatos de ordem médica ou odontológica.

Para cada tipo lesional e para cada segmento-alvo, isto é, para cada tipo de evento infortunístico, elaboramos módulos de enfoque que contemplam diferentes aspectos dos mesmos.

Destaque especial se deu ao módulo “eixo de valoração utilizado nas tabelas”, no qual se intenta, por um lado, introduzir um critério de avaliação multiaxial, semelhante ao adotado nas classificações internacionais. Por outro lado, o critério de avaliação multiaxial realiza uma aproximação ao eixo que, do nosso ponto de vista, foi utilizado para a quantificação de uma ou outra sequela nas tabelas em uso, e que, por isso, tem maior aceitação em nossa opinião.

Dessa maneira, quando da elaboração do Relatório final (Laudo), esses elementos deverão constar separadamente, mas agrupados nos diferentes módulos que serão expostos a seguir. Um fato singular é o que diz respeito ao número de Médicos Avaliadores que, como Peritos, hão de funcionar na elaboração do Relatório. Em geral, quando a avaliação é realizada em sede administrativa, ou em sede civil ou trabalhista, haverá um único Perito, designado pelo Juiz que preside o feito e que, eventualmente, poderá contar com um ou mais Médicos Avaliadores que funcionarão como Assistentes Técnicos das partes.

Para facilitar a compreensão, tomaremos um Laudo como paradigma, segmentaremos seus módulos e iremos alocando as peculiaridades inerentes a cada um.

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1. 1 Módulo preambular ou introdutório

Neste primeiro módulo são apresentados dados genéricos, na sua maioria administrativos, tais como:

• Identificação do(s) perito(s) designado(s) que está(ão) fazendo e assinando a vistoria pericial, inclusive com um mini Curriculum vitae (de cada um deles);

• Identificação da autoridade requisitante;

• Identificação da pessoa a ser periciada;

• Identificação do local, a data e a hora da perícia;

• Modalidade de exame a ser realizado; e

• Quesitos a serem respondidos.

LAUDO DE PERÍCIA

  1. PREÂMBULO

JORGE PAULETE VANRELL, Médico Legista (aposentado) da Superinten-dência Estadual de Polícia Científica (ex-Departamento Estadual de Polícia Científica), da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo; Médico (CRM-SP nº 30.697); Perito Independente da Equipe Multi-disciplinar de Combate à Tortura da Secretaria dos Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República (PR); com Curso de Capacitação em Perícias Médicas, pelo CREMESP-FUNFARME; Doutor em Ciências, pela UNISINOS (RS); Especialista em Medicina do Trabalho, pela FUNDACENTRO (Reg. SESMT/MTb nº 14.049); Especialista em Medicina Legal, pela ABML; Professor Titular de Psicofisiologia e Psicopatologia (licenciado), junto ao Curso de Psicologia Clínica do Centro Universitário do Norte Paulista (UNORP), São José do Rio Preto (SP); Professor de Medicina Legal junto ao Curso de Direito, da Universidade Paulista (UNIP), Campus JK, São José do Rio Preto (SP); Professor de Medicina Legal, junto ao Curso de Pós-Graduação, Máster em

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Medicina Forense, da Universidade de Valência, Espanha; Professor do Programa de Pós-Graduação da UNICAMP, junto à Faculdade de Odontologia de Piracicaba; Professor de Criminologia e de Medicina Legal, junto à Academia de Polícia Civil de São Paulo, Perito Judicial nomeado pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível desta Comarca, nos autos do Processo abaixo discriminado, tendo realizado os levantamentos e pesquisas julgadas necessárias, vem apresentar o seu LAUDO PERICIAL.

II. HISTÓRICO E IDENTIFICAÇÃO

Ação de: AVALIAÇÃO DE DANO CORPORAL

Processo nº X.XXX/07

Requisitante: MM. Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de XXX/SP

Reqte.: NONO NONO

Reqdo.: VOVO VOVO

Data: 03.05.07

Hora: 9h30

Assistente Técnico: Dra. Maria José XXXX XXXX

Examinada: NONO NONO, brasileira, casada, vendedora externa, RG nº 11.111.001-X, filha de XXX XXX e de ZZZ ZZZ, natural de São Paulo (SP), onde nasceu aos 11.11.60, residente nesta cidade, na rua dos Lírios, nº XXX, Jardim Panorama.

III. QUESITOS

Da Autora

1. Resulta do acidente alguma descapacidade?

  1. Se afirmativo, de que tipo?

  2. Se permanente, de que data?

  3. Poderá a paciente recuperar as funções dos membros ou órgão atingidos, se for submetida a algum tratamento? Cirúrgico, fisioterápico, clínico?

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  4. Qual o grau de redução, em percentual, dos órgãos ou membros atingidos?

  5. Qual o grau de redução, em percentual, para a função do trabalho profissional da paciente?

    Do Réu

    1. O(a) autor(a) sofre atualmente de alguma moléstia que o(a) incapacite para o trabalho? Se afirmativo, qual?

  6. A eventual descapacidade para o trabalho está relacionada a algum acidente ou doença advindo da atividade laboral da parte interessada?

  7. Se a resposta ao quesito anterior for afirmativa, a descapacidade é definitiva ou temporária ?

  8. Se afirmativa a resposta ao quesito n. 1, a descapacidade para o trabalho é absoluta ou relativa, isto é, há descapacidade para qualquer atividade laborativa, ou somente para a atividade habitual do(a) autor(a)?

  9. A descapacidade para o trabalho, se houver, é total ou parcial, isto é, não pode o(a) autor(a) exercer suas atividades laborais, nem qualquer outra, ou mesmo com a enfermidade de que sofre pode exercer umas e outras?

  10. Se a descapacidade atual for definitiva, mas somente para atividade habitual do(a) autor(a), é este(a) suscetível de reabilitação física ou mental para exercício de outra atividade laborativa?

  11. Se houver descapacidade laborativa, é possível avaliar sua data de início? Se possível, qual seria essa data?

  12. Existe dano estético?

1. 2 Módulo histórico ou comemorativo

O módulo Histórico ou Comemorativo compreende um relato sucinto, embora completo, do fato justificador do pedido de perícia. Vai desde o evento infortunístico, passando pelas lesões ocasionadas, pela sua evolução, até a consolidação.

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Segue-se, daí, que na parte histórica da doença ou transtorno atual hão de se incluir todos os elementos necessários que permitam caracterizar, separadamente, a enfermidade (dano em recuperação) da sequela concreta.

Por isso devem ser proporcionados diversos critérios de inclusão básicos ou primários que permitam ao Médico Avaliador saber se, em determinado caso, um resíduo lesional concreto cumpre os critérios ou não para ser conceituado como sequela avaliável.

Continuando com o exemplo anterior:

IV. HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL

Segundo relata a Examinada, em 27.04.04, por volta das 16 horas, quando visitava um cliente, com o seu pé direito gessado, por lesão prévia, sofreu queda na rua e em consequência teve uma fratura exposta de cotovelo esquerdo, acompanhada de luxação da articulação.

Incontinenti, foi socorrida e levada até o Hospital “XXXXX”, onde ficou sob os cuidados profissionais dos Drs. Carlos XXX (CRMSP 11.111) e Augusto ZZZ (CRMSP 22.222), sendo submetida no mesmo dia – 27.04.04 – a correção cirúrgica com colocação de um fio de Kirshner e imobilização com faixa gessada.

Passados 40 dias, em 08.06.04, foi retirado o enfaixamento, sendo submetida a nova osteossíntese...

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