Turismo e integração da fronteira do mercosul

AutorEdegar Luis Tomazzoni
CargoDoutorando em Ciências da Comunicação, com ênfase em Turismo, da Escola de Comunicações e Artes ECA da Universidade de São Paulo USP
1 Introdução

Com base nos conteúdos da disciplina de Negócios Internacionais do Programa de PósGraduação em Administração, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, ministrada pelo Professor Dr. Walter Nique, e na viagem de estudos realizada em novembro de 2004, pelo grupo de alunos de mestrado e doutorado, identificamse alguns dos problemas que impedem ou dificultam a integração econômica e política dos municípios de fronteira do Mercosul. A análise referese ao contexto territorial entre Brasil e Uruguai. Para a fundamentação teórica fazse uma revisão bibliográfica sobre os temas referentes às abordagens do trabalho.

Apresentase uma descrição sucinta de parte da rota turística da Re¬gião da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, abrangendo os municípios de Bagé, Aceguá, Santana do Livramento, Rivera, Artigas, Barra do Quaraí, Uruguaiana, Itaqui, Alegrete e São Borja. Destacamse os valores culturais, históricos, paisagísticos e comerciais como potencialidades especiais para formatação de uma das mais interessantes rotas de turismo da América Latina. Além das pesquisas de campo, realizadas na viagem de estudos, por meio de visitas, palestras e reuniões com autoridades, técnicos e empresários, um dos critérios para destacar esses municípios é a acessibilidade a informações na internet.

A implementação da Rota Turística da Fronteira é uma estratégia de integração do Mercosul, pois o turismo promove a circulação de mercadorias, serviços e capitais por meio da circulação de pessoas. Evidenciase que as expectativas de consolidação do Mercosul não serão alcançadas sem a solução dos problemas de integração da fronteira. O objetivo deste artigo é argumentar que o turismo pode contribuir significativamente para a integração dos municípios da fronteira do Mercosul e, por conseguinte, do bloco como um todo, constituído por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

Contextualizandose o turismo nas políticas de integração, identificamse lacunas na elaboração de propostas para desenvolvimento do setor nos âmbitos governamentais, desde a criação do Mercosul pelo Tratado de Assunção em março de 1991. Para justificar e fundamentar a importância da idéia de implementação da Rota Turística da Fronteira como estratégia de integração do Mercosul, destacamse algumas características e atributos do turismo como atividade econômica. O turismo, como cadeia produtiva de abrangentes efeitos multiplicadores, tem superado as piores crises mundiais e se constitui em alternativa de desenvolvimento para diversos países. Para o adequado desenvolvimento do setor, é necessário entender os papéis, competências e responsabilidades dos atores que constituem as organizações do poder público e da iniciativa privada. A integração se potencializa por meio do mapeamento das relações de produção e de mercado da cadeia produtiva do turismo, considerandose as peculiaridades ambientais e culturais da região. O turismo promove intercâmbios e convivências entre povos de diferentes culturas.

Inferese que a aplicação do modelo do arranjo produtivo local APL é um método natural para análise físicoespacial do turismo da Região da Fronteira do Mercosul. O APL é um modelo teórico de análise da realidade, adotado por organizações que atuam no desenvolvimento do turismo, como o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa Sebrae. Esse modelo se fundamenta na competitividade e na inovação, por meio da articulação de empresas de um mesmo setor, localizadas em um território definido. Os arranjos produtivos são sistemas de inovação que funcionam de forma diferenciada, de acordo com cada cultura regional, respeitandose a identidade local. Essa aplicação pode contribuir para um ambiente mais favorável ao empreendedorismo.

É interessante destacar as experiências da Comunidade Andina no desenvolvimento integrado do turismo de fronteira, como atividade geradora de oportunidades de negócios internacionais e divisas. A Comunidade Andina é uma união aduaneira sulamericana, constituída por Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela que atua na gestão e divulgação integradas das rotas turísticas dos cinco países membros. Não se apresenta um quadro de comparações entre os dois blocos ou subregiões (Mercosul e Comunidade Andina). Essa referência pode, entretanto, sugerir que as organizações públicas e privadas do Mercosul realizem os necessários estudos sobre os avanços do trabalho da Comunidade Andina no desenvolvimento integrado do turismo.

2 Os problemas da integração da fronteira do mercosul

Para Nique (2004),

[...] dentre os vários problemas identificados que impedem ou dificultam a integração do Mercosul está a falta de integração das pessoas. A participação popular é considerada fundamental para o êxito do processo. A participação democrática e o comprometimento das pessoas são a razão e o fundamento da construção da supra nacionalidade, por meio da elaboração de uma carta magna de direito pelo sistema judiciário. Além disso, é necessário que as quatro nações, que reúnem a força do povo politicamente organizado, elaborem projetos integrados, por meio de suas instituições mais poderosas que são os quatro congressos. O envolvimento da população acontece por meio da conscientização e da educação para os grandes desafios. Mesmo os mais altos escalões da sociedade desconhecem o processo de integração do Mercosul. Nas universidades, por exemplo, inclusive, em nível de pósgraduação, essas questões são pouco estudadas. Outro problema é a integração interna dos países. No Brasil, por exemplo, a Região Sul não está envolvida com os problemas da Amazônia, e os contrastes socioeconômicos dificultam avanços rumo a novos horizontes de integração. Além do mais, toda e qualquer proposta de integração é absolutamente inviável sem a integração das fronteiras.

Os depoimentos de autoridades e de lideranças empresariais dos municípios da fronteira do Mercosul entre o Brasil e o Uruguai enfatizam que as decisões teóricas não tiveram efeitos na prática, são ineficazes. Nas aduanas, por exemplo, a unificação de procedimentos não se efetivou. Várias aduanas adotam procedimentos diferentes, enquanto a legislação é comum aos quatro países membros do Mercosul.

Existe uma integração real que é de caráter informal, por meio das práticas de comunicação cultural. O contato entre os povos da Fronteira do Mercosul se intensifica pelas festas campeiras e pelo intercâmbio espontâneo de costumes, hábitos, experiências e conhecimentos. A avaliação geral, entretanto, é de que os organismos de fronteira ainda não assimilaram e não se comprometeram com a realidade da integração socioeconômica. Um dos maiores entraves é a excessiva burocracia. No lado uruguaio, por exemplo, não há terminal de viagens, e a questão do lixo é tratada de modo diferente em cada lado da fronteira. A proposta de integração política oficial não se viabilizou.

Além disso, ao longo dessa extensão, sucedemse múltiplas realidades socioeconômicas, culturais e ambientais. Existem, por exemplo, grandes áreas de florestas desabitadas. A constatação geral é de que a integração da fronteira ainda é incipiente e se constitui num grande desafio para o êxito do Mercosul. Os representantes municipais observam que, no início do processo de implantação do Mercosul, enfatizavase que sem a solução dos problemas de fronteira a integração seria inviável.

Na área da saúde, existem situações pontuais de precariedade e grandes problemas políticos e técnicos a serem resolvidos. Para os diversos tipos de atendimento médico, cada lado da fronteira possui um sistema diferente. Em todas as áreas de atividades, além da saúde, os problemas são básicos, elementares, como falta de comunicação entre as comunidades, autoridades e lideranças e divergências de horários entre os dois países. A obrigação de efetuar câmbios de moedas de uma fronteira para outra é uma das grandes contradições do projeto de integração do Mercosul. A falta de intercâmbios entre prefeituras e intendências se reflete também no transporte coletivo que é feito isoladamente por empresas de cada município. Os obstáculos se ampliam em razão das divergências e falta de sintonia entre as linhas políticopartidárias e a ausência de agendas de encontros para tratar de problemas comuns. Existe a lembrança e o registro da experiência de que se realizaram projetos muito interessantes, na década de 1990, em Jaguarão, Barra do Quaraí e Livramento, inclusive, no setor de turismo, com a implantação do Comitê de Fronteira. Posteriormente, porém, o Comitê de Fronteira estagnou. A implantação da carteira fronteiriça só funciona, no máximo, 50% do previsto em teoria.

No âmbito da educação, especialmente em nível acadêmico, não existe revalidação dos diplomas de profissionais formados em um país para atuação nos demais países do bloco. Esse fato é um indicativo de que não existem projetos e ações de integração dos sistemas de ensino. O entendimento é de que o Mercosul se mantenha inviabilizado enquanto não se solucionar essa situação. Uma das expectativas é de que as universidades as instituições de ensino superior em geral contribuam para resolver os problemas do processo de integração nos diversos âmbitos, como da própria educação, da saúde e do meio ambiente. Uma forma de consolidar a integração do Mercosul poderia ser a efetiva incorporação pelas instituições de ensino dos quatro países deste...

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