Tribunal Superior do Trabalho

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Processo: TST-RR-11000-61.2001.5.02.0040

Recorrente: Moisés de Aquino

Recorrido: Imprensa O?cial do Estado S.A. – IMESP

Competência: 2a Turma

Acórdão:

- BENEFÍCIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. A Lei n. 1.060/50 dispõe, em seu art. 4º e § 1º, sobre a garantia do benefício da Justiça gratuita que é assegurada a todos aqueles que litigam judicialmente e que não podem arcar com as despesas do recolhimento das custas processuais, impondo como condição a esse deferimento que assim se declararem mediante simples a?rmação na petição inicial acerca da sua situação econômica, presumindo-se a veracidade dessa declaração. O art. 790, § 3º, da CLT, da mesma forma, dispõe, como uma das condições em que deve ser deferido o benefício da Justiça gratuita, a simples declaração da parte postulante, no sentido de não poder arcar com as custas processuais judiciais sem que tenha prejuízo do seu sustento ou da sua família. Nesses termos, a simples a?rmação da parte no sentido de estar impossibilitada de arcar com as custas sem que lhe advenham prejuízos econômicos em razão desse ônus, garante-lhe o direito à isenção do recolhimento das custas, somente reputando-se inverídica essa declaração em caso de efetiva comprovação contrária mediante alegação da parte adversa. Na hipótese, não se constata, no acórdão regional, a existência de prova contundente contrária à declaração de hipossu?ciência econômica do autor. Com efeito, a decisão regional foi proferida mediante análise de elementos fáticos contidos nos autos, em que se declinaram os valores pecuniários percebidos pelo reclamante ao longo do seu contrato de trabalho, mormente daquele percebido na época em que se deu a rescisão contratual. Tem-se, no entanto, que a situação econômica experimentada pelo autor — que, conforme mencionado, teve o seu contrato de trabalho rescindido — na ocasião em que ajuizou a reclamação trabalhista ou, ainda, no momento em que interpôs o seu recurso ordinário, não pode ser auferida mediante mera análise do montante por ele recebido ao longo da relação empregatícia. Nos termos da lei, a con?rmação acerca da inveracidade da declaração econômica há que ser efetivamente comprovada, assertiva que não se pode simplesmente presumir em razão de situações econômicas eventualmente anteriormente vivenciadas pelo litigante judicial.

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Recurso de revista conhecido e provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n. TST-RR-11000-
61.2001.5.02.0040
, em que é Recorrente MOISÉS DE AQUINO e Recorrida IMPRENSA OFICIAL DO ESTADO S.A. – IMESP.

O agravo de instrumento interposto pelo reclamante foi provido em sessão realizada em
7.5.2014, para determinar o processamento do recurso de revista.

É o relatório.

VOTO

AGRAVO DE INSTRUMENTO

O Tribunal Regional do Trabalho da 2a

Região deu provimento ao recurso ordinário interposto pela reclamada, para afastar o benefício da Justiça gratuita que havia sido deferido ao reclamante.

A decisão regional ?cou assim fundamentada: “Da justiça gratuita
Argumenta a recorrente que, para o deferimento dos benefícios da assistência judiciária gratuita, é necessário que o trabalhador comprove efetivamente a sua condição de miserabilidade, o que, no seu entender, não ocorreu no caso vertente. Invoca como indicativo da inexistência da condição de pobreza do empregado o fato de que ele procurou um advogado particular e não o seu sindicato.

A questão referente às benesses da justiça gratuita no processo do trabalho, que assegura a isenção do pagamento das custas processuais, vem disciplinada no § 3º do art. 790 da CLT, o qual estabelece a faculdade ao juiz do trabalho de conceder tal benefício àqueles que percebem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal ou aos que declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou o de sua família.

Da referida norma não se extrai, entretanto, a existência de de?nição de forma especial de apresentação da declaração a que se refere, nem a necessidade de que a parte esteja assistida por seu sindicato de classe. Assim sendo, a despeito do entendimento que o julgador possa adotar sobre a aplicação da Lei n. 1.060/50 no processo do trabalho quanto à assistência judiciária quando o sindicato não patrocina a causa do trabalhador, não parece despropositado sustentar que, diante da lacuna da lei processual trabalhista, o magistrado do trabalho deva se valer do regramento dessa lei, devidamente atualizado por alterações subsequentes, para solução dos con?itos que surjam a esse respeito.

Cumpre, de outro modo, ressaltar que a perspectiva da Lei n. 1.060/50 é o processo civil, onde o princípio da gratuidade não é adotado. Ao contrário da Justiça do Trabalho, na qual, independentemente da condição econômica e financeira do trabalhador, não há exigência do pagamento de custas para a propositura de ação. Tal observação se presta a demonstrar que a adoção das regras previstas na Lei n. 1.060/50 de modo algum importa na ampliação desmedida de benefícios às partes que demandam nesta Justiça Especializada.

Pois bem. O art. 4º da Lei n. 1.060/50, que foi alterado pela Lei n. 7.510/86, estabelece que a “parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples a?rmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo”. Parece evidente, portanto, que o intento do legislador foi acabar com as exigências formais anteriores que tratavam do meio próprio de comprovação do estado de pobreza. Neste sentido, concluo que a referida alteração do art. 4º da lei em comento impôs a revogação da própria Lei n. 7.115/83, isto porque o § 3º do mesmo art. 4º, que se referia expressamente aos antigos ‘atestados de pobreza’ que, por sua vez, foram substituídos pelas declarações indicadas na Lei n. 7.115/83, foi revogado.

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Desta forma, tenho que não subsistem as exigências formais antes estabelecidas pela Lei n. 7.115/83 e que, portanto, o exercício da faculdade estabelecida no § 3º do art. 790 da CLT não pode ?car condicionado à apresentação de declaração de próprio punho do trabalhador, tampouco àquela expedida por autoridades ou mesmo à representação processual pelo sindicato da categoria. Concluo, então, que, também no processo do trabalho e com muito mais razão, a declaração pessoal da parte ou por seu advogado (mesmo sem poderes especí?cos para tanto, consoante Orientação Jurisprudencial n. 331 do TST) durante o curso processual basta para facultar ao juiz a concessão da isenção de custas.

Assim, sem perda da reverência àqueles que adotam entendimento diverso, ouso destacar que a questão nodal nesta matéria não parece ser a forma. A questão da forma, na verdade, está a encobrir o problema real, que consiste no abuso, por parte de advogados e demandantes na Justiça do Trabalho, na formulação de tais requerimentos. Contudo, também da Lei n. 1.060/50 são extraídos os recursos necessários para coibir tais abusos, recursos estes presentes no § 1º do art. 4º e no caput do art. 5º, que não se incompatibilizam com a regra do § 3º do art. 790 da CLT. Portanto, tratando-se de faculdade do juiz e possuindo ele fundadas razões para indeferir o requerimento, poderá fazê-lo e, além disso, impor ao demandante que falsamente declarar estado de pobreza o pagamento de até o décuplo do valor das custas. Também na sistemática da referida lei, a parte adversa está legitimada a impugnar o requerimento formulado, podendo, assim, contribuir com informações que bem fundamentem a decisão do magistrado.
É certo que a adoção de tal regramento impõe o exame caso a caso, mas não é menos certo que evitará os absurdos que hoje ocorrem em nome do formalismo. A persistir a sistemática de simplesmente exigir a apresentação de declaração nos termos da revogada Lei n. 7.115/83, trabalhadores de baixa renda que, por qualquer motivo, não apresentam a referida declaração ?cam privados do benefício que teriam direito, enquanto que outros, não necessariamente pobres, se bem orientados a fazer a declaração, se bene?ciam indevidamente.

Cumpre destacar, ademais, que toda a legislação ordinária a respeito dessa matéria deve ser interpretada à luz do preceito maior inserido no inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal, nos seguintes termos: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insu?ciência de recursos.”

Com efeito, tal enunciado indica que os benefícios da justiça gratuita devem ser concedidos a todos que comprovarem insu?ciência ?nanceira para custear o processo. A esse respeito, vale a pena transcrever as observações de Cândido Rangel Dinamarco, às páginas 676-677 da obra Instituições de Direito Processual Civil, Segundo Volume, 3a edição, Editora Malheiros:
“A incapacidade de custear a defesa judicial de direitos e interesses não é pura incapacidade econômica, como os dizeres da lei poderiam fazer pensar ao aludir à situação econômica do interessado (LAJ, art. 1º, par.). Aquele que tem bens, mas não dispõe de liquidez, é também merecedor dos benefícios da assistência judiciária; a Constituição Federal apoia esse entendimento, ao falar em insu?ciência de recursos (art. 5º, inc. LXXIV), sendo sabido que recursos signi?ca dinheiro. Mas não tem direito à gratuidade aquele que dispõe de recursos ?nanceiros (rendimentos, poupança) ainda quando seu patrimônio ativo seja muito inferior ao valor das obrigações pelas quais responde (insolvência, desequilíbrio econômico) — do contrário, toda falência seria

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gratuita para o empresário sujeito a ela, pois o desequilíbrio econômico é requisito para que progrida. Melhor é falar em insu?ciência ?nanceira, no trato desse requisito da assistência judiciária.”

Feitas essas ponderações, concluo que os benefícios da gratuidade judiciária devem ser outorgados aos pobres, assim considerados pela lei todos...

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