Tratados Internacionais

AutorJulio César Borges dos Santos
Ocupação do AutorBacharel em Direito. Professor universitário. Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. Pesquisador do Direito e das Relações Internacionais
Páginas31-66

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Neste capítulo você aprenderá sobre:

· O Direito dos Tratados.

· Alguns conceitos importantes acerca dos tratados.

1. Conceito

Como já sabido, constituem-se os tratados numa das fontes primordiais do Direito das Gentes. De acordo com Rezek, apresentavam os tratados uma "consciência costumeira", a qual encontrava o lastro de sua significação em princípios gerais como o pacta sunt servanda e também o da boa-fé.1Ato jurídico regulador de vontades na esfera internacional, o tratado pressupõe a forma escrita para sua constituição, de acordo com o entendimento emanado da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1969) em seu art. 2º, e também da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados entre Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais (1986) (art. 2º ).

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Os tratados, acordos ou ajustes internacionais são atos jurídicos por meio dos quais se manifesta o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas internacionais.2São inúmeros os motivos que podem levar os Estados a firmar tratados. Deve-se ter em mente, sobretudo, que tal veículo jurídico visa a regular condutas com respeito ao Direito Internacional e, em sendo assim, pacificar determinadas situações e circunstâncias. Neste sentido, os tratados têm, entre outras finalidades, de criar e estabelecer novos procedimentos jurídicos, bem como introduzir alterações no chamado direito consuetudinário.

A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (1980), em seu artigo 2º, define Tratado como "um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica".3Em suma, diante de novas circunstâncias no âmbito do Direito Internacional, os tratados se constituirão num dos mecanismos a partir do qual se materializarão novas regras destinadas a fazer frente a estas circunstâncias surgidas internacionalmente.

2. Terminologia

A despeito de uma inegável divergência existente acerca dos diversos nomes aplicáveis aos acordos formais firmados pelos sujeitos

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do Direito das Gentes, não existe diferença técnica entre os termos tratado, convenção, acordo, pacto, ajuste, etc., privilegiando-se de maneira geral a finalidade buscada por determinado ajuste. Contudo, algumas denominações se consagraram pela frequência nas correlações que representavam.

Um passeio pela rica doutrina existente revelará neste sentido uma semelhança imensa entre as denominações existentes para estes acordos formais.

Tratado é todo acordo formal concluído entre pessoas jurídicas de direito internacional público, e destinado a produzir efeitos jurídicos.4Adotaremos aqui a seguinte terminologia:

Tratado - Esta nomenclatura se incorporou com o tempo àqueles acordos mais solenes, cuja formalidade e complexidade se apresentam inegáveis. Exemplo de utilização do termo: tratado de paz.

Convenção - Uma observação atenta das circunstâncias nas quais o termo vem sendo utilizado revelará que este se enquadra em circunstâncias não muito diferentes daquelas que justificam a utilização do termo tratado. Contudo, na prática do Direito Internacional, tem-se aplicado a denominação de convenção para aquele tipo de ajuste formal destinado a criar normas gerais no âmbito do Direito das Gentes. Ex.: Convenção de Havana sobre Tratados (1928).

Declaração - A consolidação formal de princípios jurídicos, bem como a divulgação de uma postura política específica entre determinados Estados, tem recebido a denominação de Declaração.

Ato - Este termo é utilizado em geral para as circunstâncias nas quais se estabelecem regras de direito, diferenciando-se da declaração por não conter conjuntos de princípios. Importa mencionar que internacionalmente se pode observar a existência de atos que não produzem

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efeitos jurídicos, não sendo, portanto, tratados (p. ex.: Ata de Helsinki de 1975).5Tais atos apresentam um caráter político ou moral.

Pacto - Em geral um pacto busca formalizar um compromisso futuro e, desta feita, reveste-se de bastante formalidade. Ex.: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de São José da Costa Rica (1966).

Estatuto - A utilização deste termo vem sendo normalmente empregada para designar aqueles acordos formais destinados a estabelecer as normas constituintes de tribunais internacionais. Ex.: Estatuto de Roma (1998), a partir do qual se estabeleceria o Tribunal Penal Internacional.

Protocolo - A boa doutrina tem indicado duas acepções para o termo protocolo. A primeira diz respeito à utilização deste para designar a ata final de uma conferência internacional.

De acordo com a segunda acepção do termo, significaria o acordo propriamente dito, o verdadeiro tratado (Ex.: Protocolo de Kyoto à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (1997)). Seria assim o compromisso a que chegam as partes negociadoras de um tratado.

Importante ressaltar que o termo tem sido utilizado não só para designação de acordos bilaterais quanto para aqueles multilaterais. Além disso, a prática diplomática assinala também a utilização do termo - protocolo de intenções - na designação do início de um compromisso.

Acordo - Termo de uso livre e grande aplicação na prática internacional, sua destinação mais utilizada aponta para a especificidade do tema. No caso, matérias de ordem econômica, financeira, comercial e cultural. Ex.: Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT).

Referindo-se a Accioly, Rezek menciona uma classificação tríplice para os chamados acordos executivos: aqueles nos quais se tratam da interpretação de cláusulas de determinado contrato vigente; aque-

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les decorrentes de um tratado vigente, configurando-se, entretanto, numa espécie de complemento deste; e os denominados modus vivendi, espécie de acordos temporários.6

Acordo de sede - Tratado bilateral de natureza jurídica, cujo objetivo é o estabelecimento das instalações físicas de uma organização no território de determinado Estado. Em geral suas partes serão o organismo internacional e, provavelmente, o Estado em cujo território se pretende a instalação da sede daquele organismo.

Concordata - São os tratados bilaterais nos quais uma das partes, necessariamente, é representada pela Santa Sé, tendo como objetivo tratar de matérias específicas entre a Igreja Católica e outro Estado (p. ex.: disposições concernentes ao culto, relações entre os fiéis e o governo, etc.).

Compromisso - Este acordo formal diz respeito às controvérsias (geralmente entre dois Estados) que posteriormente serão submetidas a um tribunal arbitral.

Troca de notas - Embora seja comum a existência da troca de notas como meio de comunicação diplomático, interessa-nos aqui aquele intercâmbio de documentos no qual está presente o ânimo relativo à realização de um acordo autêntico. De modo geral, estes acordos versarão sobre matéria administrativa, devendo-se destacar sua utilização também como instrumento destinado a concluir um compromisso internacional.

Carta - Os tratados constitutivos de organizações internacionais, documentos com maior grau de formalismo (tratando sobretudo do estabelecimento de direitos e deveres entre os Estados partícipes), costumam receber a designação de carta. Ex.: Carta da ONU.

Convênio - Termo também utilizado pelo direito interno, internacionalmente se observa a prática de denominar convênio àqueles acordos destinados a tratar de matérias sobre cooperação multilateral nas áreas cultural, econômica, comercial, jurídica, técnica e cien-

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tífica, embora seja necessário assinalar a inexistência de uma regra específica que determine esta terminologia. Ex.: Convênio de Integração Cinematográfica Ibero-Americana, Convênio Internacional do Café.

Gentlemen’s agreement ou memorandum of understanding - É o chamado acordo de cavalheiros, compromisso em forma de pacto estabelecido por estadistas regido por normas morais e condicionado temporalmente à permanência de seus autores no poder. Por meio deste documento, o qual a doutrina distingue do tratado por não configurar exatamente um compromisso entre Estados7, se estabelece um programa de ação política8, sem, no entanto, estabelecer normas entre seus signatários.

Ajuste, arranjo e memorando - Constituem-se em termos largamente utilizados na designação de acordos bilaterais de reduzida importância.

3. Classificação dos tratados

Uma breve pesquisa na doutrina revela diversas iniciativas para classificação dos tratados enquanto fonte das mais relevantes ao Direito das Gentes. Percebe-se de imediato as divergências doutrinárias existentes acerca do tema. Contudo, apesar de sua discutível utilidade prática, tais classificações merecem nossa atenção, dadas as possibilidades didáticas em benefício do acadêmico para a compreensão do tema.

Usualmente se destacam dois critérios: um formal e outro material. Dentro desta moldura didática, se encaixarão as demais subclassificações.

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Critério formal

Classificação:

- Quanto ao número de partes;

- Quanto ao procedimento.

Quanto ao número de partes: tratados bilaterais e tratados multilaterais ou coletivos

Bilaterais - Diz respeito, obviamente, aos tratados compostos por duas partes (sujeitos de Direito Internacional), ou seja, somente se concluem estes tratados com a participação de dois atores internacionais.

É evidente a bilateralidade de todo tratado entre Estado e organização internacional, ou entre duas...

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