A Tradição Romanística em Período Medieval: entre práxis e esquecimento

AutorLuciene Dal Ri
CargoUniversidade do Vale do Itajaí, Itajaí, SC, Brasil
Páginas269-294
A Tradição Romanística em Período Medieval:
entre práxis e esquecimento
Roman Legal Tradition in Medieval Period: between oblivion and praxis
Luciene Dal Ri
Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí – SC, Brasil
Resumo: O objetivo deste artigo é analisar o
status da tradição romanística nos regimes das
fontes do direito, em período medieval. Com
esse intuito, estudou-se a experiência jurídica
de alguns reinos germânicos, estabelecidos no
antigo território do Império Romano, o direi-
to da Igreja, a visão política do Sacro Império
Romano Germânico e a influência da Escola de
Bolonha. Por meio do método de pesquisa in-
dutivo, observou-se que a tradição romanística
atuou em diferentes planos de influência, como
fonte primária e subsidiária do direito; transmi-
tindo via costume noções romanas a instituições
jurídicas medievais; e influenciando na compo-
sição sistêmica de novos sistemas jurídicos.
Palavras-chaves: Tradição Romanística. Fon-
tes do Direito. Período Medieval.
Abstract: To analyze the status of Roman legal
tradition in schemes of the sources of law in
medieval period, it is the purpose of this article.
To that end, it was studied the legal experience
of some Germanic kingdoms established in
the ancient territory of the Roman Empire, the
Church’s right, the political vision of the Holy
Roman Empire and the School of Bologna.
Through the inductive research method, it was
observed that the roman legal tradition acted
on several levels of influence, as a primary
source and a subsidiary; transmitting Roman
notions to medieval legal institutions; in
addition to observe their influence on systemic
composition of new legal systems.
Keywords: Roman Legal Tradition. Sources of
Law. Medieval Period.
1 Introdução
A presença e a importância do direito romano, por meio da tradição
romanística, estendem-se muito além dos limites temporais e territoriais
do Império Romano, encontrando pleno desenvolvimento na idade média
Recebido em: 04/04/2016
Revisado em: 11/10/2016
Aprovado em: 22/10/2016
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2016v37n74p269
270 Seqüência (Florianópolis), n. 74, p. 269-294, dez. 2016
A Tradição Romanística em Período Medieval: entre práxis e esquecimento
e moderna. Observa-se, por exemplo, que o desenvolvimento da tradição
romanística influenciou de forma consistente as experiências jurídicas
subsequentes1.
Essa influência ocorreu de forma consistente por meio das fontes
do direito, moldando as experiências jurídicas medievais, e as caracteri-
zando de forma a contribuir para as suas dinâmicas. As fontes do direito
são as formas como o direito se manifesta em sociedade, sendo meios de
produção do direito e tendo a função de presidir os diferentes modos de
estrutura e sistematização de cada experiência jurídica2.
Como evidencia Orestano, a estrutura organizacional de cada socie-
dade é por si um fato normativo que atua na formação de outros fatos
normativos, sendo inseparável da atuação do regime das fontes do direito
(ORESTANO, 1967, p. 99). Nesse sentido, o poder de participação da tra-
dição romanística junto às fontes do direito, delimitando conteúdos, refle-
te e permite uma importante influência na organização social.
1 Várias são as formas de denominar a estrutura, a organização e a dinâmica jurídica de
uma sociedade. Alguns optam por “sistema jurídico”, outros por “ordenamento jurídico”,
neste artigo, por conta da amplitude de modelos jurídicos abarcados, opta-se pela noção
de “experiência jurídica”. A noção de experiência jurídica, bem evidenciada por Orestano,
como uma abstração e produção do pensamento jurídico, modelável de muitas maneiras,
HPIXQomRGRTXHVH FRORFDHPHYLGrQFLDH FRPR¿QDOLGDGHSHUPLWHWUDWDUGD GLQkPLFD
das fontes do direito, em suas formas e conteúdo (ORESTANO, 1997, p. 382-396).
2 Opta-se pelo termo “fonte do direito” por representar aquele denominador comum
mínimo “[...] tra i vari atti e fatti che nei diversi ordinamenti e nel corso dela storia si
sono dimostrati idonei a innovare gli ordinamenti stessi [...]” e me afasto da distinção
entre fontes de produção e fontes de cognição, bem como entre fontes-ato e fontes-
fato (REPOSO, 2009, p. 141 s). Nesse sentido, “A metáfora 'fonte' (pois é de metáfora,
claramente, que se trata) continua a nos parecer apropriada precisamente por seu valor
metafórico: como as fontes da nossa paisagem física, exprimem bem a essência do
fenômeno jurídico enquanto extratos profundos. De fato, repetimos tantas vezes que o
direito é realidade radical, ou seja, atinente às raízes de uma sociedade ainda que, na vida
cotidiana, manifeste-se em usos de populações, leis dos detentores do poder político,
atos da administração pública, sentenças de juízes, praxe de operadores econômicos e
assim por diante. O direito pode ordenar o social porque é realidade com raízes e raízes
profundas” (GROSSI, 2008, p. 69). Sobre as fontes do direito e o presidir os diferentes
modos de estruturação do direito, ver Villey (2009, p. LXXVIII).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT