O Trabalho como um Direito Social

AutorJames Magno A. Farias
Páginas24-41
24
James Magno A. Farias
II
O Trabalho como
um Direito Social
1. A construção dos Direitos Sociais
A presença do Estado sempre foi importante no desenvolvimento histórico da regulação
do trabalho em sociedade; embora a Mesopotâmia de 3.700 a.C seja o primeiro estado
formalmente reconhecido, o melhor conceito de Estado só apareceu efetivamente em 1513,
com a obra O Príncipe, de Maquiavel, que reformulou o conceito essencial da polis grega e
armou que “todos os Estados, os domínios todos que existiram e existem sobre os homens,
foram e são repúblicas ou principados ”.(2)
Muito antes, porém, Aristóteles já dizia que a Constituição tinha por nalidade ordenar
os poderes da Cidade, sendo que era sobre a organização do poder governamental que o
lósofo grego já estava tratando, defendendo a política como forma de ação realizada pela
razão, tendo como m o bem da comunidade ou o bem comum.(3)
Inobstante, com a outorga da Magna Carta, em 1215, na Inglaterra, tem-se o primeiro
marco na ideia de Constituição. Ironicamente, a referida Carta, que nem chega a ser formal-
mente uma constituição, foi imposta à realeza pela nobreza descontente com o governo
despótico do Rei João (antes, “Sem Terra”), que não estava se aconselhando previamente
com os nobres acerca do estabelecimento de impostos, como era o costume então; além de
governar despoticamente o Rei entrou em conito com a nobreza.
Para pôr m ao litígio uma comissão redigiu a declaração dos direitos da nobreza, sob
a liderança do arcebispo Stephen Langton.
Embora aceita a contragosto pelo monarca, a Magna Carta previa não apenas os
direitos dos nobres, mas, também dos súditos ingleses. Além de garantir a independência
parlamentar para legislar sobre impostos e orçamentos, semeou também a ideia de direito
à liberdade e garantia do acesso à justiça para dirimir os conitos, com julgamento regular
(2) MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. São Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 11.
(3) CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosoa. São Paulo: Ática, 1999. p. 42.
6137.3 - Direito do Trabalho no Brasil.indd 24 31/10/2018 10:55:23
Direito do Trabalho no Brasil – Panorama após a Reforma Trabalhista
25
.
em harmonia com a lei da terra, no item 39 da declaração. No art. 40 consta a famosa frase
“a ninguém venderemos, a ninguém recusaremos ou atrasaremos, direito ou justiça”.(4)
Os princípios da Magna Carta foram conrmados posteriormente, ajudando a sedi-
mentar o constitucionalismo inglês, com o advento de outros marcos históricos. A Petição
de Direitos (Petition of Rights, durante o reinado do Rei Charles I, em 1628, armou o
comando de que o rei não deveria criar tributos sem o consentimento do parlamento)(5).
O Instrumento de Governo, durante o governo quase republicano do Lorde Protetor Oliver
Cromwell, em 1652, armou maiores poderes do Parlamento.
O Habeas Corpus Amendment Act, de 1679, durante o reinado de Charles II, garantiu
liberdades aos cidadãos contra atos arbitrários. A Declaração de Direitos (Bill of Rights(6)),
de 1689, foi elaborada pelo Parlamento após o m da Revolução Gloriosa, tendo sido aceita
por Guilherme III de Orange e sua esposa Maria Stuart II, antes de assumir seu reinado
conjunto.(7)
Considera-se que a Inglaterra transitou rapidamente do modelo estamental para o
Estado constitucional, mesmo com o célebre reinado absolutista e iconoclasta de Henrique
VIII; esse processo foi acelerado pelas metamorfoses políticas ocorridas após a Guerra Civil
de 1648 e a Revolução Gloriosa de 1688.(8)
Entretanto, observando-se a história ocidental, percebe-se que a evolução dos ordena-
mentos constitucionais foi muito lenta desde a edição da Magna Carta até o convulsionado
séc. XVIII. Com a queda da Bastilha, iniciou-se a superação do modelo do despotismo
esclarecido, marcado pela transição do absolutismo mais arraigado para uma forma mais
limitada de governar, a exemplo de Frederico II da Prússia, Catarina da Rússia ou do primeiro-
-ministro Marquês de Pombal, em Portugal, ocasionando o posterior advento de governos
republicanos ou monarquias constitucionais, calcados no liberalismo e na obediência, dentro
do possível, aos ditames da Constituição.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, símbolo da França revolucionária
de 1789, inseriu os direitos do indivíduo dentro da ordem estatal. Antes dela, é certo, não
se pode esquecer que já havia ocorrido a adoção de normas de caráter constitucional pelas
antigas Treze Colônias Americanas, desde a vanguardista Carta da Virgínia, de 1776, após
a Guerra de Independência.
(4) FARIAS, James Magno Araújo. O Estado é um monstro? Revista do Curso de Direito da Universidade Federal
do Maranhão, v. 4. n. 2. São Luiz, UFMA, 1999. p. 19-28.
(5) A Petição de Direitos foi elaborada antes da guerra civil inglesa, que levou ao poder o Lorde Protetor Oliver
Cromwell, até que fosse restabelecida a monarquia em 1660, com o Rei Charles II.
(6) A Bill of Rights determinou a proibição de um católico assumir a monarquia (o rei deposto, James II, era
católico) e acabou com as tentativas de retorno ao absolutismo, ao limitar os poderes do monarca e au-
mentar os poderes do Parlamento.
(7) SOARES, Orlando. Comentários à Constituição da República Federativa do Brasil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002. p 34.
(8) Jorge Miranda acredita que Montesquieu se inspirou no modelo parlamentar inglês quando formulou sua
teoria da separação de poderes. MIRANDA, Jorge. Constituições de diversos países. 3. ed. Lisboa: Imprensa
Nacional/Casa da Moeda, 1986. p. 10.
6137.3 - Direito do Trabalho no Brasil.indd 25 31/10/2018 10:55:23

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT