Tornar presente quem está ausente?. Uma análise da Audiência Pública em Saúde no Judiciário

AutorArnaldo Ferreira - Daniela Gueiros Dias - Isabella Fernanda Carneiro Costa - João Moreno Onofre Barcellos - Luiza Mussoi Cattley - Patrick Szklarz - Renata Rodrigues da Cunha Sepulveda Louza Sallum - Vanderson Maçullo Braga Filho
Páginas331-358
Tornar presente quem está ausente?
Uma análise da Audiência Pública em Saúde no Judiciário.
ARNALDO FERREIRA
DANIELA GUEIROS DIAS
ISABELLA FERNANDA CARNEIRO COSTA
JOÃO MORENO ONOFRE BARCELLOS
LUIZA MUSSOI CATTLEY
PATRICK SZKLARZ
REN ATA RODRIGUES DA CUNHA SEPULVEDA LOUZA SALLUM
VANDERSON MAÇULLO BRAGA FILHO.
Introdução
Ao longo deste trabalho, buscamos discutir quais foram os reais interesses a se
manifestarem e serem defendidos na Audiência Pública da Saúde realizada no
Supremo Tribunal Federal. A partir dessa veri cação, tentamos determinar se a
Audiência, de fato, atingiu os objetivos aos quais se propôs e, mais do que isso,
se ela deu margem à deliberação da sociedade civil com os diversos órgãos e
setores do Estado.
O objetivo do nosso trabalho é, portanto, discutir se houve representativi-
dade na Audiência Pública da Saúde. Isto, porém, não é tudo: analisamos tam-
bém o intuito e os critérios utilizados pelo Judiciário para convocar a Audiência
Pública da Saúde e a forma como ela foi sendo construída pelos diversos atores
que fazem parte do jogo democrático.
Nosso ponto de partida se deu com a seguinte pergunta: quais interesses
estiveram representados na Audiência Pública? Nossa pesquisa não poderia co-
meçar em lugar diverso do daquele responsável pela sua convocação, isto é, o
próprio Supremo Tribunal Federal (STF). Começamos a nossa coleta de dados
no sítio o cial do STF. Não nos restringimos a essa fonte: consultamos diferen-
tes relatórios sobre a audiência, assistimos a vídeos das palestras, procuramos
casos polêmicos em que o direito à saúde estivesse em discussão, debatemos
o tema, conversamos com especialistas no assunto e,  nalmente, zemos uma
extensa pesquisa de doutrina e jurisprudência. A partir de todos os dados cole-
tados, elaboramos nossas próprias tabelas e grá cos, os quais serão expostos ao
decorrer do trabalho.
Assim, julgamos prudente uma breve explicação sobre as diferentes formas
que o direito à saúde foi visto no Brasil. Em seguida, mostramos como o fenô-
meno da judicialização ganhou força no país, intensi cando -se, consequente-
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mente, a quantidade de processos na área da saúde. Em seguida, apresentamos
as Audiências Públicas como um importante mecanismo para se conferir maior
legitimidade às decisões. Chegamos,  nalmente, na parte principal do nosso
trabalho. Mostramos como a Audiência Pública da Saúde, convocada pelo Mi-
nistro Gilmar Mendes, no ano de 2009, buscou estabelecer diretrizes, esclarecer
dúvidas e criar um ambiente democrático propício ao debate para que todos
aqueles relacionados direta ou indiretamente pelo tema tivessem espaço para
discutir e deliberar.
1. O Direito à saúde
O conteúdo do direito à saúde, no Brasil, variou ao longo dos anos, podendo-
-se perceber três formas distintas de encará -lo. A primeira delas é como favor.
Durante o período da República Velha, o Estado deveria fornecer garantias à
saúde da população, no entanto, esta função não era obrigatória, tornando os
indivíduos submissos à arbitrariedade do poder estatal. Este fato  ca mais claro
quando se observa a postura autoritária do governo durante a Revolta da Vacina
de 1904, episódio marcado por forte resistência popular à vacinação obriga-
tória1, o que re etiu desconhecimento do povo em relação aos seus efeitos e
necessidade.
A partir da Era Vargas, observa -se um movimento no sentido de transfor-
mar a concepção de saúde de mero favor em um bem de consumo. Isso se deve,
dentre outros fatores, à ampliação dos direitos trabalhistas e à reforma política
desenvolvida no período que autorizaram uma recon guração nas relações de
poder presentes no campo da saúde. Assim, evidencia -se a mercantilização da
saúde, uma vez que esta nova prática esteve diretamente relacionada à capaci-
dade do indivíduo de pagar pelos planos privados. Apenas aqueles capazes de
trabalhar ou pagar pelos próprios planos de saúde tinham acesso a tal direito.
Daí o entendimento de saúde restritiva. Finalmente, o país marchou rumo à
terceira concepção de saúde a partir da década de 1970, mais precisamente
com o movimento da Reforma Sanitária que Sônia Teixeira2 entende como um
conceito que se
1 BATISTA, Rodrigo. Revolta da Vacina. Disponível em
-republica/revolta -da -vacina/> Acesso em: 10 mai.2012.
2 TEIXEIRA, Sônia Fleury. Re exões Teóricas sobre Democracia e Reforma Sanitária. In Teixeira, Sônia
Fleury (org.). Reforma Sanitária: em busca de uma teoria, São Paulo: Cortez Editora/ABRASCO, 1989.

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