Teoria e Prática da ARCISU - Ação de Reclamação por Captação Irregular de Sufrágio

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador-Geral de Justiça
Páginas807-888
Manual de prática eleitoral
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Com o precípuo desejo de combater a crescente corrupção eleitoral, várias
entidades (Conamp, AMB, OAB, Fenaj, CUT, CBJP, entre outras) recolheram mais
de mais de 1 milhão de assinaturas, com o escopo de criar uma lei que propiciasse
mecanismo ao combate à chamada mercadoria do voto.
Neste ensejo, a Lei n. 9.840/1999, apelidada como “Lei dos Bispos”, causou
sensível mudança na Lei n. 9.504/1997 ao criar o art. 41-A, in verbis:
Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada
por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o m de
obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou
função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena
de multa de mil a cinquenta mil Urs, e cassação do registro ou do diploma, observado
1 Para que serve a ARCISU
A onda de corrupção nos três Poderes, que ameaça estabelecer o caos na
sociedade brasileira, decorre, entre outros fatores, da falta de preocupação de nossas
escolas com a formação moral dos alunos e do processo de escolha dos nossos homens
públicos viciados e embriagados pela noção de que o poder deve ser conquistado a
qualquer custo e não importa os meios que porventura sejam utilizados.
A sociedade deve, urgentemente, educar seus jovens para serem cidadãos
justos e virtuosos, para votar conscientemente e estabelecer um combate incessante
a todos os tipos de corrupção. A sabedoria de Platão constata que “o Estado é o que
é porque seus cidadãos são o que são. Portanto, não devemos esperar ter melhores
estados enquanto não tivermos homens melhores...”
Hoje, infelizmente, a maioria dos políticos brasileiros nunca poderá dizer esta frase:
“Eu não tenho mensagem. Minha mensagem é a minha vida.” (Gandhi)
Neste contexto, a ARCISU serve para combater a retrógrada, imoral, secular
e quase costumeira captação ilícita de sufrágio, trazendo em seu bojo a grande
Capítulo 13
Teoria e Prática da ARCISU – Ação de Reclamação
por Captação Irregular de Sufrágio
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esperança de que os políticos brasileiros entendam que a ética e a moral são as duas
colunas que devem dar sustentáculo a toda atividade desenvolvida pelo parlamentar.
Destacamos, por concordar em sua plenitude com as sábias palavras de Flávio da
Silva Andrade:433
A Lei n. 9.840/1999, que trouxe inovações à Lei n. 9.504/1997, é portadora de muitas
esperanças, isso porque inibe com rigor a captação ilícita de sufrágio (corrupção eleitoral)
e também o uso indevido da máquina administrativa. Não se pode mais permitir que maus
políticos, sabedores da impossibilidade de burlar o resultado matemático da votação, im-
punemente voltem suas energias à prática da mercancia eleitoral e à concessão de benes-
ses sufragistas, fazendo de tudo para alcançar ou se manter no poder político.
Jamais se pode esquecer da necessidade de proteção da lisura do pleito eleitoral, isso
porque vivemos num Estado que se proclama democrático e de direito, o que signica,
entre tantas outras coisas, que os candidatos devem agir conforme as leis na busca dos
mandatos almejados.
Urge, portanto, que as autoridades constituídas façam valer tão importante lei, aplicando-a
de modo a combater, com rmeza e equilíbrio, os costumeiros atos de ofensa e violência à
democracia, tão duramente conquistada pelo povo brasileiro. Se se quiser mudar o curso da
história neste país miserável e cheio de injustiças, será necessário tomar medidas verdadei-
ramente severas em relação àqueles candidatos que conquistam mandatos desonestamen-
te, sendo que, não fosse o amor ao ilícito, nunca seriam eleitos para ocupar cargo algum.
Não se pode permitir o exercício do mandato por quem não o logrou alcançar legitimamen-
te. Em verdade, para que se tenha um país verdadeiramente democrático, voltado para a
realização da justiça e para igualdade concreta de todos os brasileiros, é absolutamente
necessário extirpar do meio político os que galgam tais mandatos valendo-se da carência
dos milhares de eleitores sem condição de bem discernir sobre a importância do direito/
dever de votar.
2 Os requisitos da ARCISU
A ARCISU requer 7 (sete) requisitos, a saber:
1) Conduta objetiva consistente em:
a) dar
b) oferecer
c) prometer
d) ou entregar bem ou qualquer vantagem de cunho pessoal, inclusive emprego
ou função pública, salvo as exceções legais previstas no art. 26 da Lei n.
9.504/1997.
433 Breves apontamentos acerca do moralizador instituto do art. 41-A da Lei n. 9.504/1997 – captação ilícita de
sufrágio. In: Juris Plenum.
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2) a existência de uma pessoa física (um eleitor focado na intenção ou ato
praticado).434
3) exigência da nalidade especial.
Para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, é desnecessário o pedido
explícito de votos, mas deve ser demonstrada a prova da nalidade especial de agir,
qual seja, de que a conduta fora praticada com o objetivo de obter o voto do eleitor.
4) Conduta direcionada a eleitor determinado ou determinável.
A conduta realizada de forma genérica, caso das promessas de campanha
realizadas a um número indeterminado de eleitores, não congura a hipótese do
art. 41-A da Lei n. 9.504/1997, que exige conduta direcionada ao eleitor ou eleitores,
desde que sejam identicados, ou seja possível a identicação.
Não esqueça: é entendimento já consolidado no TSE que “não se faz indis-
pensável a identicação do eleitor (...)”,435 o que se exige é que o eleitor possa ser
identicado.
5) Pedido direcionado a eleitor da circunscrição do pleito.
Caso a conduta seja dirigida a um eleitor que vota em outra circunscrição elei-
toral, trata-se de impossibilidade jurídica de lesão ao bem jurídico tutelado, portanto,
não restará congurada a hipótese prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/1997.
6) Pedido positivo ou negativo.
Congura a conduta prevista no art. 41-A o pedido de votos (pedido positivo) e
também o pedido negativo, qual seja, o pedido de abstenção consistente na formu-
lação da conduta com o objetivo de o eleitor não votar em determinado candidato.
7) Conduta formal.
Para caracterização da conduta ilícita, não é necessária a obtenção da vanta-
gem pretendida pelo candidato, a simples promessa já caracteriza a conduta, sendo
a efetivação da promessa mero exaurimento.
Ausentes os requisitos supracitados, não será o caso de imposição da ARCISU,
mas a conduta só será lícita se não for o caso de corrupção eleitoral ou abuso do
poder econômico ou político a serem combatidos por outras ações eleitorais.
434 No mesmo sentido vide o voto condutor no Ac. n. 19.176/2001, Rel. Min. Sepúlveda Pertence.
435 TSE – REspe n. 25.215, Ac., Rel. Carlos Caputo Bastos, p. 171.
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