A teoria da onerosidade excessiva e o requisito de extrema

AutorMariana Stehling Lara Carvalho
Páginas283-306
A teoria da onerosidade excessiva... • 283
A TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA
E O REQUISITO DE EXTREMA
VANTAGEM NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ
Mariana Stehling Lara Carvalho1
Resumo: este artigo tem por objetivo analisar o requisito de extrema
vantagem positivado pelo artigo 478 do Código Civil e vericar em que
medida ele limita a aplicação da teoria da onerosidade excessiva no caso
concreto. A investigação verica se a interpretação do requisito está vin-
culada à literalidade dos termos do artigo 478 ou se há margem inter-
pretativa para a sua exibilização. Para tanto, foi pesquisada a doutrina
brasileira e a jurisprudência do STJ sobre o tema, com especial enfoque
nos julgados sobre os contratos de leasing e os contratos de compra e
venda de safra futura, de modo que foi possível concluir a omissão do
STJ na xação do conceito de extrema vantagem. Com isso, propõe-se
a exibilização do requisito, com vistas a afastar seu caráter restritivo e
ampliar o escopo de incidência da teoria, especialmente no contexto
de pandemia do coronavírus, que apresenta a necessidade de revisão de
diversos contratos.
Palavras-chave: contratos, coronavírus (“Covid-19”), onerosidade ex-
cessiva.
INTRODUÇÃO
O presente artigo se dedica à análise da teoria da onerosidade
excessiva no recorte temático de um dos requisitos necessários para a sua
incidência, a extrema vantagem vericada pela contraparte2.
A relevância desse tema se coloca à medida que, enquanto insti-
1
Graduanda do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Ge-
rais. Membro da Equipe de Arbitragem da PUC/MG. Estagiária no Escritório Tolen-
tino Advogados.
2
Para a condução do recorte temático proposto neste artigo, decidiu-se excluir da
análise as relações consumeristas regidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
284 • O Direito Civil nos Tribunais Superiores
tuto relativamente recente no direito brasileiro, positivado por meio do
Código Civil de 2002, ainda não é certo o real conceito de vantagem
obtida por uma das partes no contexto de uma relação contratual dese-
quilibrada por um fato superveniente e imprevisível.
Pode a vantagem ser interpretada como a simples ausência de
ônus decorrente do fato gerador do desequilíbrio contratual? Ou o con-
ceito de vantagem está necessariamente vinculado à percepção de ga-
nho econômico por uma das partes contratantes? Essas são algumas das
perguntas que, por um viés doutrinário e jurisprudencial, este artigo se
propõe a debater.
Sem a pretensão de esgotar o tema aqui colocado, o recorte
selecionado como tema deste trabalho foi motivado pelo contexto de
pandemia do coronavírus (“Covid-19”) e pretende auxiliar o desenvolvi-
mento de bases interpretativas mais exíveis à compreensão do requisito
de extrema vantagem, de modo a expandir o escopo de incidência da
teoria da onerosidade excessiva no direito brasileiro.
A utilidade deste trabalho, contudo, não se restringe ao contex-
to de pandemia que permeia a sua redação, na medida em que a rele-
vância da análise doutrinária e jurisprudencial deste assunto extrapola o
contexto no qual este trabalho está inserido.
1. O DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL E AS TEORIAS
REVISIONISTAS - UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA
A necessidade de reequilíbrio contratual em razão de fatos su-
pervenientes e imprevisíveis não é tema recente no estudo jurídico e,
desde o direito romano - ainda que de forma incipiente3, demanda estu-
do por meio da clássica cláusula rebus sic stantibus, traduzida por Álvaro
Villaça de Azevedo4 na seguinte frase: “os contratos de trato sucessivo e
com dependência de prazo (a termo) estão sujeitos ao estado das coisas
existentes no momento de sua celebração”.
Após um longo período de esquecimento durante as codica-
ções oitocentistas5, esta cláusula retornou ao estudo da doutrina e, em
3
BORGES, N. A teoria da imprevisão no direito civil e no processo civil. São Paulo:
Malheiros, 2002. p. 79. Para alguns autores, o desenvolvimento da cláusula rebus sic
stantibus se deu no direito canônico.
4
AZEVEDO, A. V. Teoria da imprevisão e revisão judicial dos contratos. Revista dos
Tribunais, ano 85, v. 733, p. 109-119, nov. 1996. p. 10.
5
LEÃES, L. G. P. de B. A onerosidade excessiva no código civil. Revista de Direito

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