O teletrabalho na CLT Pós-Reforma Trabalhista

AutorRaimundo Simão de Melo/Cláudio Jannotti da Rocha
Páginas401-405

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Introdução

A Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, denominada de Reforma Trabalhista, alterou profundamente a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Dentre as principais alterações, destaca-se a nova disciplina do teletrabalho, por meio da criação do Capítulo II-A2.

Embora tenha havido nítida inspiração no Código do Trabalho Português, o legislador preferiu omitir algumas proteções previstas para os trabalhadores em terras lusitanas e optou por remeter grande parte das questões fundamentais dessa modalidade para a negociação contratual direta entre empregado e empregador.

Assim, desconsiderou-se a característica histórica da legislação laboral de fixar regras mínimas protetivas em relação ao trabalhador, em observância ao princípio tuitivo3, que estabelece uma teia protetiva em face da hipossuficiência fática do empregado em relação ao empregador, conforme se abordará neste trabalho.

Do Teletrabalho

O teletrabalho é uma modalidade de labor propiciada pelas modernas tecnologias da informação e comunicação que permitem o exercício da atividade contratada, ainda que distante do espaço físico da empresa. Essa categoria vem sendo acentuada pelo exponencial crescimento da internet4, o que transforma o mundo em uma verdadeira aldeia global (RHEINGOLD, 1993).

Como ensina Barros (2017, p. 214): “a origem etimológica grega, tele significa a distância. O teletrabalho é modalidade especial de trabalho a distância”. Por isso, há uma flexibilização do local de labor, que, em grande medida, passa a ser de responsabilidade ou propriedade do empregado e não mais do empregador.

As empresas estão se virtualizando5, para a cada dia que passa se utilizar mais do teletrabalho, com desnecessidade de comparecimento pessoal dos trabalhadores, que assumem atividades em redes de comunicação eletrônica, utilizando-se de instrumentos e softwares que estimulam a colaboração informacional (LÉVY, 2011, p. 18).

Diante dessa realidade, a Lei n. 12.551, de 15 de dezembro de 2011, alterou o art. 6º da CLT para prever a seguinte disposição:

Art. 6º Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.

Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. (grifo nosso).

Assim, a legislação brasileira passou a expressamente declarar que o controle patronal telemático ou informatizado se equipara ao pessoal e direto e, por isso, o teletrabalhador teria iguais direitos ao empregado que exerce atribuições dentro do espaço físico da empresa.

O Código do Trabalho Português define o teletrabalho no art. 165, ao dizer que: “Considera-se teletrabalho a prestação laboral realizada com subordinação jurídica, habitual-mente fora da empresa e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação”. Nesse ponto, há dois claros destaques que combinados caracterizam o teletrabalho: o componente geográfico (labor à distância) e o componente tecnológico (utilização de tecnologias de informação e comunicação). (AMADO, 2016, p. 121).

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Por sua vez, a Lei brasileira n. 13.467, de 13 de julho de 2017, popularmente conhecida como reforma trabalhista, realizou profundas modificações no Diploma Celetista e, dentre elas, incluiu o art. 75-B, em que apresenta o conceito de teletrabalho. Optou-se pelos seguintes termos: “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.

Apesar da redação ser um pouco contraditória – trabalho fora das dependências, que não seja trabalho externo –, pode-se perceber que o Legislador Brasileiro foi mais restritivo no conceito de teletrabalhador.

Para a CLT pós-reforma, o operário que labora externamente, ou seja, o vendedor externo, o motorista, o trocador de ônibus, os ajudantes de viagem, dentre outros, que não possuem um local fixo para exercer suas atividades, em regra, não são teletrabalhadores.

O Legislador pátrio parece ter assim procedido em razão de que na referida modalidade, os trabalhadores são considerados externos e podem vir a ser enquadrados na disposição do art. 62, inciso I da CLT, ainda que utilizem equipamentos informáticos, como palms, smartphones6 e rastreadores via GPS para se comunicar com o empregador.

Por outro lado, estará no regime jurídico do teletrabalho quem exercer, na maior parte do tempo, suas atividades extra-muros empresariais, mas, via de regra, em um local específico, sem a necessidade de se locomover continuamente como requisito para exercer as atividades laborais.

Por exemplo, um empregado que exerça suas atribuições em residência própria, biblioteca, cafeteria, mas desde que utilizando das tecnologias da informação e telecomunicação, especialmente por meio da web7, como e mail8, aplicativos e redes sociais on line9, para recebimento e envio das atividades elaboradas pelo obreiro.

No art. 62 da CLT, que trata dos trabalhadores excluídos da proteção da jornada, o legislador brasileiro na reforma incluiu o inciso III, para se referir ao teletrabalhador.

Assim, se procedeu para retirar dessa modalidade de exercício das atividades o controle do tempo de trabalho. Desconsiderou-se o grande avanço tecnológico que permite atualmente aos empregadores controlar a localização exata do trabalhador, as atividades que estão sendo desempenhadas e os horários de início e fim, além do descompasso com a normatização feita pelo direito comparado:

Artigo 169º Igualdade de tratamento de trabalhador em regime de teletrabalho.

1 - O trabalhador em regime de teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores, nomeadamente no que se refere à formação e promoção ou carreira profissionais, limites do período normal de trabalho e outras condições de trabalho, segurança e saúde no trabalho e reparação de danos emergentes de acidente de trabalho ou doença profissional. (PORTUGAL, 2009, grifo nosso).

No direito pátrio, a regra constitucional que não pode ser desconsiderada é a jornada de 8 horas diárias e 44 horas semanais, prevista no art. 7º, da CF/88, sem distinção para a forma de exercício das atividades laborais. Ademais, o legislador manteve o parágrafo único do art. da CLT, que equipara o controle telemático e informatizado à supervisão direta do empregador.

Nesse contexto, é preciso se atribuir ao novo dispositivo uma interpretação conforme a Constituição, que é uma técnica desenvolvida pela doutrina que viabiliza se evitar a nulidade da lei plurissignificativa, ao se optar pela interpretação que não ofenda o texto constitucional. (PUCCINELLI JÚNIOR, 2013, p. 82).

Ademais, para se compatibilizar os dispositivos da CLT, o novo inciso III do art. 62 apenas pode ser compreendido como hipótese estritamente excepcional. Para tanto, encontram-se excluídos da proteção da jornada os teletrabalhadores que não possuem nenhuma forma de controle dos tempos de trabalho.

Vale esclarecer, são aqueles empregados que iniciam e terminam suas atividades no horário que bem entenderem, com total liberdade dos momentos de atividade. A cobrança patronal apenas pode ser feita por meio de metas e resultados...

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