A tékhne e os vazios do homem: notas sobre a expressão e a técnica a partir do exercício da arquifilologia de Raúl Antelo

AutorTesla Coutinho Andrade
Páginas205-223
|boletim de pesquisa nelic, florianópolis, v. 18, n. 29, p. 205-223, 2018|
doi:10.5007/1984-784X.2018v18n29p205 205
A TÉKHNE E OS VAZIOS DO HOMEM
NOTAS SOBRE A EXPRESSÃO E A TÉCNICA
A PARTIR DO EXERCÍCIO DA ARQUIFILOLOGIA DE RAÚL ANTELO
Tesla Coutinho Andrade
UNIRIO – CAPES
RESUMO: Este ensaio explora as relações entre os modos de ser do homem e a noção grega de
tékhne com o objetivo de promover uma reflexão sobre a expressão e a técnica sob a ótica do
contemporâneo de Giorgio Agamben. O percurso se inspira no exercício da arquifilologia, que Raúl
Antelo nos apresenta como um estudo anacrônico das emergências detectadas na produção cultural
através de um jogo persistente de (re)leituras. O conceito de transdução que Gilbert Simondon traz
da mecânica quântica nos serve de cenário para estimular encontros, desencontros e reflexões sobre
a vida, o homem e os gestos de expressão e exclusão que desenham sua sombra.
PALAVRAS-CHAVE: Técnica; Transdução; Arquifilologia.
TECHNE AND MEN’S NOTHINGS
NOTES ON EXPRESSION AND TECHNIQUE
FROM RAÚL ANTELOS ARCHIPHILOLOGY
ABSTRACT: This essay explores the relations between the man’s modes of being and the Greek notion
of techne in order to promote a reflection on expression and technique from the perspective of the
contemporary of Giorgio Agamben. The work is inspired by the practice of archiphilology, which Raúl
Antelo presents as an anachronistic study of emergencies detected in cultural production through
a persistent game of re-readings. The concept of transduction which Gilbert Simondon brings from
quantum mechanics to philosophy is used here as a setting to stimulate encounters, ruptures and
reflections on life, man and the gestures of expression and exclusion that shape his shadow.
KEYWORDS: Technique; Transduction; Archiphilology.
Tesla Coutinho Andrade é doutoranda em Memória Social no Programa de Pós-Graduação em
Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.
|boletim de pesquisa nelic, florianópolis, v. 18, n. 29, p. 205-223, 2018|
doi:10.5007/1984-784X.2018v18n29p205 206
A TÉKHNE E OS VAZIOS DO HOMEM
      
        
Tesla Coutinho Andrade
Os vazios do homem
Os vazios do homem não sentem ao nada
do vazio qualquer: do do casaco vazio,
do da saca vazia (que não ficam de pé
quando vazios, ou o homem com vazios);
os vazios do homem sentem a um cheio
de uma coisa que inchasse já inchada;
ou ao que deve sentir, quando cheia,
uma saca: todavia não, qualquer saca.
Os vazios do homem, esse vazio cheio,
não sentem ao que uma saca de tijolos,
uma saca de rebites; nem têm o pulso
que bate numa de sementes, de ovos.
2
Os vazios do homem, ainda que sintam
a uma plenitude (gora mas presença)
contêm nadas, contêm apenas vazios:
o que a esponja, vazia quando plena;
incham do que a esponja, de ar vazio,
e dela copiam certamente a estrutura:
toda em grutas ou em gotas de vazio,
postas em cachos de bolha, de não-uva.
Esse cheio vazio sente ao que uma saca
mas cheia de esponjas cheias de vazio;
os vazios do homem ou o vazio inchado:
ou o vazio que inchou por estar vazio.1
Com um oximoro, o poeta oferece ao homem uma merecida indefinição.
Em Agamben, cruzamos com caminhos semelhantes. Ao trazer de Espinoza a
segurança e o desespero – as duas formas do irreparável –, o filósofo imagina
ali um ideal de reconciliação: “Se pudéssemos nos sentir seguros no desespero
1 MELO NETO, João Cabral. A educação pela pedra e depois. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997,
p. 31.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT