Técnica Legislativa Municipal

AutorEdson Jacinto da Silva
Páginas179-195

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Temos constatado com muita frequência que vários colegas assessores, ao depararem com a elaboração de um projeto de lei, não têm primado pela obediência da boa técnica legislativa, ou por desconhecimento técnico ou por questões das mais diversas, e diante desse quadro procuraremos nesta oportunidade proceder agora a uma amostragem daquilo que a boa técnica legislativa exige na elaboração de uma lei.

Iniciaremos expressando nosso ponto de vista com relação ao assunto, pois temos que na confecção de qualquer Projeto de Lei serão exigidas qualidades que devem estar presentes em todas as obras literárias, já que aquele se destina a expressar a inteligência e a intenção do legislador.

A técnica legislativa pode ser definida como sendo um conjunto de preceitos que servem para orientar de forma racional uma lei; seu principal objetivo é a simplificação qualitativa e quantitativa do conteúdo legislativo.

A simplificação quantitativa, na visão de Ferrara, tende a contrair o volume do material legislativo, classificando-o e reduzindo-o a categorias genéricas, reagrupando sob forma abstrata as aplicações dispersas e concretas.

A simplificação qualitativa, ao contrário, pretende purificar a qualidade do material, apresentando-o numa forma interiormente ordenada, na qual as partes singulares se reúnem harmoniosamente numa só unidade197.

Lei: “É o preceito escrito, geralmente obrigatório, promulgado e publicado de forma solene, pelo órgão competente do Estado”198.

Cunha Gonçalves define a Lei como:

Uma norma ou um conjunto de normas elaboradas e votadas pelo órgão legislativo do Estado, órgão que pode ser, ora a Assembleia Nacional, ora o Governo com auto-rização da Assembleia ou no exercício normal da função de publicar decretos-leis, ou de um poder ditatorial ou revolucionário.199

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Para Themístocles Cavalcanti (1889- 1980):

A lei, em sua expressão mais geral, é a forma que reveste os atos do Poder Legislativo, manifestação da vontade popular, por meio de órgãos próprios, destinados a ditar normas gerais por que se devem reger e disciplinar as relações entre os indivíduos ou entre estes e o Estado.

Washington Barros Monteiro: “Lei é um preceito comum e obrigatório, emanado do poder competente e provido de sanção”200.

Celso Antônio Bandeira de Mello observa:

Não se compreende uma lei, não se entende uma norma, sem entender qual o seu objetivo. Donde, também não se aplica uma lei corretamente se o ato de aplicação carecer de sintonia com o escopo por ela visado. Implementar uma regra de Direito não é homenagear exteriormente sua dicção, mas dar satisfação a seu propósito. Logo, só se cumpre a legalidade quando se atende sua finalidade. Atividade administrativa desencontrada com o fim legal é inválida e por isso judicialmente censurável.201

Diante de todos esses abalizados conceitos, devemos sempre ter em mente que, toda lei, deve ser a mais concisa e precisa possível.

Pois a redação legislativa deve sempre ser alicerçada em estilo simples e objetivo, pois uma lei, para ser considerada boa, deve refletir dados exequíveis, critérios técnicos e acima de tudo deve estar desprovida de paixões ideológicas. Pois toda lei bem elaborada torna clara a sua interpretação e facilita a sua aplicação.

Embora nossa literatura jurídica tenha dispensado muito pouco espaço ao estudo das técnicas legislativas e não tenha dado o realce que o assunto merece, sabemos o quanto é importante a sua observação quando deparamos com a elaboração de uma lei. É por isso que dedicamos uma parte deste nosso trabalho ao estudo da Técnica Legislativa.

A Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998 publicada no DOU de 27.02.1998, dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do artigo 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona.

O Deputado Federal e Professor Osmar Serraglio (1948...), sob o argumento de que a produção legislativa do Parlamento, embora vasta, não resulta em benefícios expressivos para a sociedade, afirmou:

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Entretanto, a nossa vasta produção legislativa resulta em muito pouco benefício para a sociedade brasileira. (...) Lamentavelmente, muitos concebem a Câmara dos Deputados como uma espécie de fábrica de leis. Para esses, o problema é que não se vota o suficiente. Nosso papel, entretanto, não é, nem propor nem votar leis em demasia, mas sim propor e aprovar boas leis. Devemos medir a excelência do nosso parlamento a partir do benefício real das políticas públicas que aprova e não pelos números de uma produção legiferante divorciada das necessidades do cidadão brasileiro. (...) A legística emerge como o instrumento mais apropriado para ajustar o nosso trabalho parlamentar, hoje tão voltado à produção quantitativa, a uma concepção de produção legislativa caracterizada por uma atenção à eficácia e à qualidade. (...) A palavra legística, em si, pode levar-nos a um entendimento bem mais limitado do conceito, como, por exemplo, a boa técnica de se redigir atos normativos. Enquanto a técnica da boa redação desses atos normativos faz parte da legística, pois não pode haver boas leis se nelas não há clareza, coerência e precisão, a técnica redacional nem chega perto de exaurir a concepção da legística. O termo compreende, além da boa técnica de redação, o emprego de avaliações prospectivas e retrospectivas, a análise de cenários alternativos e consultas à sociedade como forma de aprimoramento técnico e de legitimação da norma a ser produzida. (...) Avaliar os possíveis impactos de determinado projeto de lei, como suporte à decisão parlamentar, ainda é uma atividade muito incipiente nas Casas Legislativas do nosso País. Mas a consciência que temos da necessidade de se aprimorar o trabalho legislativo, e, por consequência, a qualidade da lei, guianos, sem dúvida, para a adoção da legística enquanto sistemática de trabalho.202

A referida Lei Complementar, já em seu primeiro artigo, determina que a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis obedecerão ao disposto na referida Lei Complementar.

Em seu parágrafo único, nos informa que as disposições dessa Lei Complementar aplicam-se, ainda, às Medidas Provisórias e demais atos normativos referidos no artigo 59 da Constituição Federal, bem como no que couberem aos decretos e aos demais atos de regulamentação expedida por órgãos do Poder Executivo.

A referida Lei Complementar trata ainda das técnicas de elaboração, redação e alteração das leis.

Segundo a Norma legal, a lei será estruturada em três partes básicas:

- Parte preliminar, compreendendo a Epígrafe, a Ementa, o Preâmbulo, o Enunciado do Objeto e a indicação do âmbito de aplicação das disposições normativas;

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- Parte normativa, compreendendo o texto das normas de conteúdo substantivo relacionadas com a matéria regulada;

- Parte final, compreendendo as disposições pertinentes às medidas necessárias à implementação das normas de conteúdo substantivo, às disposições transitórias, se for o caso, a cláusula de vigência e a cláusula de revogação quando couber.

A Epígrafe, grafada em caracteres maiúsculos, propiciará identificação numérica singular à lei e será formada pelo título designativo da espécie normativa, pelo número respectivo e pelo ano de promulgação.

A Ementa será grafada por meio de caracteres que a realcem e explicitará, de modo conciso e sob a forma de título, o objeto da lei.

O Preâmbulo indicará o órgão ou instituição competente para a prática do ato e sua base legal.

O primeiro artigo do texto indicará o Objeto da Lei e o respectivo âmbito de aplicação, observados os seguintes princípios:

I - excetuadas as codificações, cada lei tratará de um único objeto;

II - a lei não conterá matéria estranha ao seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão;

III - o âmbito de aplicação da lei será estabelecido de forma tão específica quanto o possibilite o conhecimento técnico ou científico da área respectiva;

IV - o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subsequente se destine a complementar lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa.

A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula “entra em vigor na data de sua publicação”, para as leis de pequena repercussão.

O texto acima descrito foi ampliado, e teve a redação acrescida pelos textos abaixo transcritos, introduzidos pela Lei Complementar nº 107, de 26.04.2001, publicada no DOU de 27.04.2001.

A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral.

As leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula “esta lei entrará em vigor depois de decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial”.

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A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas.

Segundo a mesma Lei Complementar, os textos legais serão articulados com observância dos seguintes princípios:

I - a unidade básica de articulação será o artigo, indicado pela abreviatura “Art.”, seguida de numeração ordinal até o nono e cardinal a partir deste;

II - os artigos desdobrar-se-ão em parágrafos ou em incisos; os parágrafos em incisos, os incisos em alíneas e as alíneas em itens;

III - os parágrafos serão representados pelo sinal gráfico “§”, seguido de numeração ordinal até o nono e cardinal a partir deste, utilizando-se, quando existente apenas um, a expressão “parágrafo único” por extenso;

IV - os incisos serão representados por algarismos romanos, as alíneas por letras minúsculas e os itens por algarismos arábicos;

V - o agrupamento de artigos poderá constituir Subseções; o de Subseções, a Seção; o de Seções, o...

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