Taxas de fiscalização e o princípio da equivalência: o caso da TFI e da TFF

AutorAndré Mendes Moreira e César Vale Estanislau
Ocupação do AutorProfessor Adjunto de Direito Tributário da UFMG. Doutor (USP) e Mestre (UFMG) em Direito Tributário. Diretor da Associação Brasileira de Direito Tributário. Advogado/Mestre (UFMG) em Direito Tributário. Membro da Associação Brasileira de Direito Tributário. Advogado
Páginas1-32
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TAXAS DE FISCALIZAÇÃO E O PRINCÍPIO DA
EQUIVALÊNCIA: O CASO DA TFI E DA TFF
André Mendes Moreira1
César Vale Estanislau2
Introdução.
A importância dos serviços de telecomunicação para a in-
tegração e para o desenvolvimento nacionais impõe ao Estado
a manutenção de um olhar atento sobre a regularidade e a
abrangência da prestação dessas atividades. De fato, o exer-
cício do poder de polícia incidente sobre o setor se estriba no
interesse público em serviços telecomunicativos eficientes,
universais e de preços módicos. Diante da necessidade de fis-
calização pelo Poder Público, tornou-se imperativa a previsão
de receitas para o custeio dessa atividade.
Nesse sentido, criou-se o Fundo de Fiscalização das Tele-
comunicações - FISTEL, cujos recursos se prestam a “cobrir
despesas feitas pelo Governo Federal na execução da fiscali-
zação de serviços de telecomunicação, desenvolver os meios
1. Professor Adjunto de Direito Tributário da UFMG. Doutor (USP) e Mestre
(UFMG) em Direito Tributário. Diretor da Associação Brasileira de Direito Tributá-
rio. Advogado.
2. Mestre (UFMG) em Direito Tributário. Membro da Associação Brasileira de Di-
reito Tributário. Advogado.
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IBET - INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
e aperfeiçoar a técnica necessária a essa execução” (Lei nº
5.077/66, art. 1º). Dentre as fontes constituintes do FISTEL,
destacam-se a Taxa de Fiscalização de Instalação - TFI e a
Taxa de Fiscalização de Funcionamento - TFF, suportadas pe-
las operadoras de telecomunicações, na proporção dos valo-
res discriminados no Anexo da Lei nº 5.070/66.
As modificações no modelo do setor de telecomunicações
decorrentes das privatizações ocorridas nos anos 90 se refleti-
ram nas normas que regem o FISTEL e os aludidos tributos.
O Fundo passou à administração exclusiva da Agência Nacio-
nal de Telecomunicações - ANATEL (Lei nº 9.472/97, art. 50),
a qual recebeu a competência de regulação e fiscalização do
mercado de telecomunicações, sendo, consequentemente, a
responsável pela cobrança das mencionadas taxas. Ademais,
foram revistos os valores da TFI e da TFF pela Lei Geral das
Telecomunicações, alterando-se o Anexo à Lei nº 5.077/66.
Desde então, a ANATEL tem desenvolvido suas compe-
tências fiscalizatórias em meio a um mercado em crescente
expansão, que se dilata em usuários, infraestrutura e receitas.
Em que pese o aumento dos custos advindos do exercício do
poder de polícia pela Agência, a arrecadação da TFI e da TFF
sempre superou, excessivamente, as despesas incorridas pela
entidade, o que aponta para a ausência de correspondência
entre o valor cobrado a título das referidas taxas e o dispêndio
do Poder Público em sua atividade fiscalizadora.
Desenha-se, assim, o quadro da inconstitucionalidade
dos referidos tributos, haja vista a desproporção entre o custo
da atividade e o montante arrecadado com as taxas instituí-
das pela Lei nº 5.077/66. Em vista dessa premissa, o presente
artigo dividir-se-á em duas partes: (i) a análise da constitucio-
nalidade das taxas à luz da correspondência entre a despesa
incorrida pelo Poder Público e o valor da exação tributária; e
(ii) a apuração do volume arrecadado com a TFI e com a TFF
nos últimos anos, confrontando a receita auferida com os gas-
tos realizados pela ANATEL no exercício de sua competência
de fiscalização dos serviços de telecomunicações.
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RACIONALIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO
De início, é imprescindível compreender as característi-
cas que marcam a espécie tributária “taxa”, especialmente os
seus fatos geradores: prestação de serviço público específico
e divisível e exercício do poder de polícia.
2. O custo da atividade estatal como parâmetro do va-
lor cobrado mediante taxas.
2.1 Noções gerais sobre as taxas de polícia.
O germe do conceito de taxa remonta ao problema da
repartição da carga pública segundo a divisibilidade dos ser-
viços estatais. Como registrado em “A Riqueza das Nações”,
existem determinadas despesas estatais cujos benefícios são
aproveitados somente por um grupo determinado, de tal for-
ma que não seria justo que toda a coletividade concorresse
para o financiamento de tais atividades3. Vale mencionar que,
ainda antes de Smith, os cameralistas alemães já vislumbra-
vam a distinção entre os impostos e outras receitas públicas,
ainda que nem sempre empregassem o termo “Gebühr” para
denominá-las. Assim, Justi4 nota a existência das chamadas
“receitas ocasionais” (zufällige Einkünfte), que visam a com-
pensar o Poder Público por serviços específico.
É com a publicação por Karl Heinrich Rau de seu
Grundsätze der Finanzwissenschaft”, em 1832, que o estu-
do das taxas ganha corpo na ciência das finanças5. Segundo o
3. SMITH, Adam. An inquiry into the nature and causes of the wealth of nations.
7. ed. London: A. Strahan and T. Cadell, 1793. v. 3, p. 239.
4. JUSTI, Johann Heinrich Gottlob von. Staatswirthschaft; oder, Systematische
Abhandlung aller oekonomischen und Cameralwissenschaften, die zur Regierung
eines Landes erfordert werden. Aalen: Scientia Verlag, 1963. p. 95.
5. Anteriormente, era comum que as taxas não fossem concebidas como espécies
tributárias autônomas, pelo que a doutrina financeira se dividia em duas aborda-
gens: ou as integrava aos preços privados ou as identificavam como impostos. So-
bre a corrente que imiscuía as noções de taxa e imposto, Giampietro Borrás, divisa
quatro grupos: (i) ou consideravam as taxas como impostos indiretos, como faziam

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