Taxa de controle, monitoramento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários (parecer)

AutorPaulo de Barros Carvalho
Páginas7-38

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I Da Consulta

O Estado de Minas Gerais solicita meu parecer sobre a constitucionalidade da Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários - TFRM, instituída pela Lei Estadual n. 19.976/2011.

Para que o trabalho chegue a bom termo, solucionando as dúvidas concementes ao assunto, formula doze quesitos sobre os quais pede que me manifeste de maneira clara e objetiva, à luz do direito positivo vigente. Ei-los:

1. Insere-se na competência dos Estados, ainda que de forma concorrente, o exercício do poder de polícia sobre a atividade, realizada nos seus respectivos territorios, de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários, considerando o disposto nos arts. 23, XI, e 24, VI, todos da Carta da República?

2. Sendo positiva a resposta ao quesito anterior, o poder de polícia, exercido pelo Estado, pode abranger o controle, o monitoramento e a fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos miner ários?

3. As atividades referidas no quesito anterior caracterizam poder de policianos termos do art. 78 do Código Tributário Nacional?

4. Sendo positiva a resposta aos quesitos anteriores, o Estado pode instituir taxa que tenha como 'fato gerador" o exercício regular do poder de polícia sobre a atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários, objetivando o controle, monitoramento e fiscalização de tais atividades?

5. A Lei mineira n. 19.976, de 27 de dezembro de 2011, trata de matérias de competência privativa da União, nos termos do art. 22, XII, ou viola o disposto no art. 176, todos da Constituição da República?

6. E adequada a grandeza escolhida para a base de cálculo prevista na Lei mineira n. 19.976, de 2011, com a natureza jurídica da taxa? Isto é, há compatibilidade entre a base de cálculo indicada na lei (tonelada de mineral ou minério bruto extraído) e o 'fato gerador" da taxa (exercício regular do poder de polícia sobre a atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de recursos minerários, objetivando o controle, monitoramento efiscalização de tais atividades)?

7. A taxa prevista na Lei mineira n. 19.976, de 2011, tem a mesma natureza jurídica de um imposto que incide sobre operações, como o ICMS?

8. Confunde-se a taxa prevista na Lei mineira n. 19.976, de 2011, com a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico prevista no art. 149 da Constituição Federal?

9. A taxa prevista na Lei mineira n. 19.976, de 2011, viola o disposto no art. 152 da CF, ao tratar de forma diferenciada o minério objeto de industrialização no Estado? Estaria tal diferenciação compreendida na extrafiscalidade, inclusive em razão da necessidade de reduzir as desigualdades sociais e regionais (art. 3º-, III, CF)?

10. O fato da hipótese de incidência da taxa referir-se à atividade de pesquisa, lavra, exploração ou aproveitamento de apenas alguns recursos minerários estaria ferindo o princípio da isonomia ouse trata de faculdade compreendida na competência tributária, inclusive em razão da extrafiscalidade? Atenderia ao disposto no art. 152,1, da Constituição mineira?

11. As isenções previstas no art. 7- da Lei mineira n. 19.976, de 2011, violam o princípio da isonomia ou se trata de faculdade compreendida na comvetên-

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cia tributária, inclusive em razão da extrafiscalidade? Atenderia ao disposto no art. 152,1, da Constituição mineira?

12. A Lei mineira n. 19.976, de 2011, apresenta inconstitucionalidade no que se refere a aspectos relacionados com a vinculação ou destinação das receitas auferidas com a taxa por ela instituída?

II Do Parecer
1. Competência: regras dirigidas ao ato de criação normativa

Como significações construídas a partir dos enunciados prescritivos, as normas jurídicas existem num universo de discurso que é o sistema do direito positivo. Essa totalidade, a que chamamos de "ordenamento" ou de "direito posto", opera, fundamentalmente, com duas formas deônticas de mensagem, tradicionalmente conhecidas por "regras de conduta" e "regras de estrutura".

E bem verdade que o tema iterativo dos comportamentos inter-humanos é de-marcatório do campo objetai da Ciência do Direito. Toda e qualquer norma jurídica, simplesmente por integrar o sistema, tem que ver com a disciplina das condutas entre sujeitos da interação social. Sob esse aspecto, aliás, fica até redundante falar em regras de conduta. Mas em uma análise mais fina das estruturas normativas, vamos encontrar unidades que têm como objetivo final ferir de modo decisivo os comportamentos interpessoais, modalizando-os como obrigatórios (O), proibidos (V) e permitidos (P), com o que exaurem seus propósitos regulativos. Tais regras são terminativas de cadeias de normas. Outras, paralelamente, dispõem também sobre condutas, porém tendo em vista a produção de novas estruturas deôntico-jurídicas. São normas que aparecem como condição sintática para a elaboração de outras regras, a despeito de veicularem comandos discipli-nadores que se vertem igualmente sobre os comportamentos intersubjetivos. No primeiro caso, a ordenação final da conduta é objetivo pronto e imediato. No segundo, seu caráter é mediato, requerendo outra prescrição que podemos dizer intercalar, de modo que a derradeira orientação dos comportamentos inter-humanos ficará a cargo de unidades que serão produzidas seqüencialmente.

Isso não quer dizer que as normas de conduta, por tipificarem deonticamente as relações interpessoais, prescindam de outras normas, de inferior hierarquia, para chegar, efetivamente, ao campo material dos comportamentos sociais. Não. Aquilo que se quer expressar é que as regras de que tratamos esgotam a qualificação jurídica da conduta, orientando-a em termos incisivos e finais. Por isso é que as primeiras, voltadas diretamente ao comportamento intersubjetivo, costumam ser denominadas "regras de conduta", ao passo que as últimas, direcionadas aos atos criadores de novos preceitos normativos, recebem o título de "regras de estrutura".

As chamadas regras de estrutura configuram verdadeiras competências. Convém lembrar, todavia, que a competência legislativa, entendida como aptidão de que são dotadas as pessoas políticas para expedir regras jurídicas, inovando o ordenamento positivo, é apenas uma entre as várias proporções semânticas com que o vocábulo "competência" se manifesta. Não podemos deixar de considerar que têm, igualmente, "competência" o Presidente da República, ao expedir um decreto, ou seu ministro, ao editar a correspondente instrução ministerial; o magistrado e o tribunal que vão julgar a causa; o agente da Administração encarregado de lavrar o ato administrativo, bem como os órgãos que irão participar da discussão administrativa instaurada comapeçaimpugnatória; o sujeito de direito privado habilitado a receber o pagamento de prestações pecuniárias (bancos, por exemplo); ou mesmo o particular que, por força de lei, está investido na condição de praticar a seqüência procedimental que culminará com a produção de norma jurídica tributária, individual e concreta (casos de IPIf ICMS, ISS etc). Todos eles operam revestidos de competência, o que demonstra a multiplicidade de traços significativos que a

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locução está pronta para exibir. Não haveria por que adjudicar o privilégio a qualquer dessas acepções, em detrimento das demais. Gomo sugeriram expoentes neopositivis-mo Lógico, em situações desse jaez cabe-nos tão somente especificar o sentido em que estamos empregando a dicção, para afastar, por esse modo, as possíveis ambigüidades.

Esclareço que, neste momento, tomarei o vocábulo "competência" como aquela de que são investidas as pessoas políticas de direito constitucional interno para legislar, expedindo normas gerais e abstratas dirigidas aos particulares. A despeito de a locução experimentar outras tantas acepções na própria simbologia do direito tributário brasileiro, focalizarei este modo de emprego da palavra, circunscrito à atividade de legislar sobre determinado assunto, em termos pioneiros na sistemática positiva.

1.1 A repartição constitucional das competências tributárias como delimitadora do possível campo de atuação de cada pessoa política

Competência, com as acepções encontradas no direito positivo, na jurisprudência e na doutrina, é termo específico do vocabulário técnico-jurídico. Quando empregado na Constituição para autorizar as pessoas políticas de direito constitucional interno a legislarem sobre matéria tributária, falamos em "competência tributária". Trata-se de especificação da competência legislativa, posta como aptidão de que são dotadas aquelas pessoas para expedir regras jurídicas, inovando o ordenamento positivo e que se opera pela observância de uma série de atos, cujo conjunto caracteriza o procedimento legislativo.

Nesse sentido, a competência tributária apresenta-se como uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes das quais são portadoras as pessoas políticas, consubstanciada na faculdade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre tributos...

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