O supremo soberano no Estado de excec?a?o: a (des)aplicac?a?o do direito pelo STF no a?mbito do inque?rito das 'Fake News' (Inque?rito n. 4.781)

AutorBruno Meneses Lorenzetto - Ricardo dos Reis Pereira
CargoCentro Universitário Autônomo do Brasil, Curitiba, PR, Brasil
Páginas173-203
Recebido em: 15/02/2020
Revisado em: 30/04/2020
Aprovado em: 12/05/2020
http://doi.org/10.5007/2177-7055.2020v41n85p173
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O Supremo Soberano no Estado de Exceção: a
(des)aplicação do direito pelo STF no âmbito do
Inquérito das “Fake News” (Inquérito n. 4.781)
The Supreme Sovereign in the State of Exemption: the (un)application of the
law by the Brazilian Supreme Court in the “Fake News”
Inquiry (Inquiry n. 4.781)
Bruno Meneses Lorenzetto1
Ricardo dos Reis Pereira1
1Centro Universitário Autônomo do Brasil, Curitiba, PR, Brasil
Resumo: Em 2019, o Presidente do STF instau-
rou uma investigação sigilosa para apurar su-
postas práticas de divulgação de notícias frau-
dulentas e infrações cometidas contra a Corte,
seus membros e familiares. No curso desse
Inquérito (n. 4.781), foram proferidas decisões
marcadamente inconstitucionais que censura-
ram veículos da imprensa, tolheram liberdades
e garantias processuais de cidadãos brasileiros
e materializaram toda a sorte de arbitrarieda-
des judiciais, sempre sob a justificativa de res-
guardo da ordem constitucional. Diante desse
quadro, o artigo pretende verificar se é possível
estabelecer uma relação entre essas condutas da
Suprema Corte brasileira e a teoria do estado de
exceção de Giorgio Agamben. Para tanto, o tra-
balho realiza uma revisão bibliográfica inicial
e, em seguida, questiona a constitucionalidade
das decisões judiciais proferidas pela Corte. Ao
final, conclui-se que há a caracterização de al-
guns elementos constitutivos do estado de exce-
ção na realidade brasileira.
Palavras-chave: Giorgio Agamben. Estado de
Exceção. Supremo Tribunal Federal. Inquérito
n. 4.781. Fake News.
Abstract: In 2019, the Chief Justice of the STF
initiated a procedure to investigate alleged practices
of disclosing fraudulent news and infractions
committed against the Court, its members and
their relatives. In the course of this secret Inquiry
(no. 4,781), many unconstitutional decisions
were enacted, censoring media outlets, restricting
freedoms and procedural guarantees of Brazilian
citizens, and materializing all sorts of judicial
arbitrariness, always under the justification of
safeguarding the constitutional order. In view of
this situation, this paper intends to verify whether it
is possible to establish a relationship between these
institutional behaviors of the Brazilian Supreme
Court and Giorgio Agamben’s theory of the state
of exception. For this purpose, the work carries
out an initial bibliographic review and, afterwards,
questions the constitutionality of the judicial
decisions rendered by the Court. In the end, it is
concluded that there is a characterization of some
elements constituting the state of exception in the
Brazilian reality.
Keywords: Giorgio Agamben. State of
Exemption. Supremo Tribunal Federal. Inquiry
n. 4.781. Fake News.
174 Seqüência (Florianópolis), n. 85, p. 173-203, ago. 2020
O Supremo Soberano no Estado de Exceção: a (des)aplicação do direito pelo STF no âmbito do
Inquérito das “Fake News” (Inquérito n. 4.781)
1 Introdução
O artigo examina se o Inquérito n. 4.781 (intitulado “Inquérito das
Fake News”), instaurado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal,
em 14 de março de 20191, para investigação sigilosa de supostas práti-
cas de denunciações caluniosas e ameaças contra a Corte, seus membros
e familiares, está inserido em um contexto de “estado de exceção”, no
sentido específico do termo desenvolvido pelo filósofo italiano Giorgio
Agamben.
A proposta do trabalho é complexa por dois motivos: porque a flui-
dez ou ductibilidade (ZAGREBELSKY, 1997) do direito constitucional
dificulta a afirmação de juízos definitivos em matéria hermenêutica, de
modo a valorar a incorreção da fundamentação das decisões do STF no
curso da investigação, e; porque a própria filosofia de Agamben é, ela
mesma, erigida sobre uma intrincada combinação de conceitos elusivos,
que apresentam complexidades, indeterminações e paradoxos muitas ve-
zes intangíveis à experiência concreta da práxis jurídica. Nesse sentido, o
artigo trilha um caminho duplamente indeterminado.
A metodologia do trabalho consiste em uma revisão bibliográfica
inicial, para exposição sucinta da teoria do estado de exceção formulada
por Giorgio Agamben, e, posteriormente, em pesquisa empírica para ve-
rificar a fundamentação e a inconstitucionalidade das decisões judiciais
proferidas no curso Inquérito n. 4.781, bem como o conteúdo de mani-
festações adjacentes (pareceres da Procuradoria-Geral da República, no-
tas públicas de esclarecimento, petições de partes, matérias jornalísticas
etc.). Em seguida, realiza-se um cotejo entre as categorias conceituais de-
senvolvidas por Agamben e os atos concretos praticados pelo Supremo
Tribunal Federal, para verificar a possível identificação destes como atos
representativos de um estado de exceção.
Uma última observação introdutória parece ser relevante: o fato de
o Inquérito 4.781 ser sigiloso traz alguns obstáculos epistêmicos à ela-
boração do trabalho, afinal a maior parte dos documentos e informações
1 Portaria GP n. 69, de 14 de março de 2019. Disponível em: https://www.conjur.com.br/
dl/comunicado-supremo-tribunal-federal1.pdf. Acesso em: 5 ago. 2019.

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