O supremo de 'portas abertas': a colegialidade em ação

AutorCarlos Victor Nascimento dos Santos
CargoProfessor Adjunto de Direito na Universidade Federal Fluminense
Páginas10-39
Direito, Estado e Sociedade n.56 p. 10 a 39 jan/jun 2020
O Supremo de “portas abertas”:
a colegialidade em ação
Brazilian Supreme Court with “open doors”:
collegiality in action
Carlos Victor Nascimento dos Santos*
Universidade Federal Fluminense, Macaé – RJ, Brasil.
1. Introdução: o direito constitucional pesquisado
O presente texto representa uma síntese do argumento desenvolvido a par-
tir das observações realizadas em trabalho de campo nas sessões de julga-
mento no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). A possibilidade de
realização de uma pesquisa empírica qualitativa, nos moldes aqui propos-
to, se justifica principalmente a partir da escassez de trabalhos já realizados
e publicados sobre o problema de investigação destacado. Tendo por base
o método qualitativo, a realização do trabalho etnográfico permitiu descre-
ver e compreender as dinâmicas, interações, ritos, dentre outras questões
passíveis de observação.
Além das questões acima, a pesquisa também se justifica na tentativa
de aproximação do Direito com outras áreas do saber, como as ciências
sociais, de modo a ampliar não apenas a capacidade explicativa do obje-
to pesquisado, mas proporcionar um diálogo maior entre essas diferentes
áreas. O aumento de interlocutores sobre o tema de pesquisa permite um
diálogo maior e mais qualificado sobre o tema proposto. O que já vem
* Professor Adjunto de Direito na Universidade Federal Fluminense. Doutor em Teoria do Estado e Direito
Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, Brasil.
Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro, Brasil. Gra-
duado em Direito pela Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio), Rio de Janeiro,
Brasil. Atualmente é pesquisador de temas relacionado ao Direito Constitucional, instituições judiciais e ao
ensino do Direito. Email: carlosvictor@oi.com.br.
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sendo realizado por diversos pesquisadores que utilizam o Direito como
objeto de estudo a partir de um olhar antropológico ou sociológico, utili-
zando-se de pesquisas etnográficas1.
A pesquisa tem por objetivo promover o exercício de relativização de
categorias nativas utilizadas pelos sujeitos da pesquisa como forma de am-
pliar o poder explicativo das dinâmicas e interações que ocorrem nas ses-
sões de julgamento do STF. O estranhamento estimulado e radicalizado pelo
trabalho de campo será o recurso necessário e fundamental nesse processo
interpretativo, permitindo uma interseção entre duas ou mais disciplinas e
enriquecendo o debate sobre questões que lhes são afins. Essa investigação
das práticas sociais tendo por base a dimensão empírica contribuirá para
desvendar o significado de eventos e situações que têm lugar no grupo
social objeto da pesquisa2.
Neste sentido, o grupo social objeto da pesquisa será o composto pe-
los ministros do STF; o espaço de observação e descrição das dinâmicas,
interações, procedimentos, ritos etc. será aquele institucionalmente estabe-
lecido a este fim; e o momento, aquele em que se reúnem a portas abertas.
E a categoria que sintetiza tais momentos é a colegialidade – representando
essa reunião institucional, pública e que tem por objetivo produzir uma
decisão judicial (coletiva).
Para melhor desenvolver essa pesquisa, apesar de nascido no Rio de
Janeiro e ter morado no mesmo local até a decisão em realizar essa pes-
quisa, a partir de bolsa CAPES conseguida no Programa de Pós-graduação
em Direito da PUC-Rio, mudei-me para Brasília no ano de 2014. Obten-
do maior proximidade com o campo que escolhi para melhor conhecer e
aprofundar estudos, na semana seguinte à mudança para Brasília dei início
ao que alguns autores chamam de campo exploratório3. Como a pesquisa
etnográfica era pouco conhecida por mim, era preciso me familiarizar com
esta nova forma de produção do conhecimento.
No início do trabalho de campo, tudo parecia fazer algum sentido,
todos os eventos que aconteciam apresentavam motivações que se apro-
ximavam de meu objeto de pesquisa: se eu chegava ao prédio onde ocor-
1 LEWANDOWSKI, 2014; MELO, 2013; GERALDO, 2013; FIGUEIRA, 2007; FONSECA, 2008; EILBAUM,
2006; e BAPTISTA, 2008.
2 CARDOSO DE OLIVEIRA, 1993.
3 FOOTE-WHYTE, 1990.
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