Social Control: emancipatory practices for the guarantee of rights/Controle Social: praticas emancipatorias para garantia de direitos.

AutorChaves, Anderson Carvalho

Introducao

Neste artigo, iremos discutir a experiencia dos Conselhos de Assistencia Social na Politica de Assistencia Social brasileira, bem como o papel das entidades nos espacos de Controle Social democratico no Sistema Unico de Assistencia Social (Suas), ressaltando e enfatizando o controle democratico e a participacao social. Pretendemos, tambem, aprofundar o debate teorico e conceitual sobre o Controle Social democratico, ja que este pode ser considerado como um dos eixos norteadores da Politica Nacional de Assistencia Social de 2004, legislacao que regula as bases de constituicao do Suas.

Num primeiro momento, iremos relatar a experiencia do Controle Social democratico no Suas e o papel das entidades da sociedade civil, destrinchando de maneira teorica, com alguns autores, o conceito de sociedade civil. Em seguida, aprofundaremos a tematica do Controle Social democratico e a participacao social no cenario contemporaneo.

A experiencia dos conselhos de assistencia social no Suas e o papel das entidades nos espacos de Controle Social democratico

A constituicao dos espacos de democracia participativa possui seu marco legal inicial no art. 204 da Constituicao de 1988, (BRASIL; 1988) que se refere a participacao da populacao, por meio de organizacoes representativas, na formulacao das politicas e no controle das acoes em todos os niveis. Ainda na Carta Magna, no art. 194 do capitulo da Seguridade Social, ratifica-se o carater democratico e descentralizado da gestao administrativa, com a participacao da comunidade, em especial de trabalhadores, empresarios e aposentados. Em suma, e na Constituicao que se encontra prioritariamente a perspectiva de abertura legal de novos espacos de participacao da sociedade civil no ambito do Estado, tese que foi historicamente defendida nos trabalhos constituintes.

A regulamentacao da Constituicao Federal de 1988 promoveu o arcabouco juridico institucional brasileiro dos conselhos de Assistencia Social, respaldado na Lei Organica da Assistencia Social (Loas), de 1993, acrescido da Lei 12.435/2011, que altera a Loas (Lei nD 8.742/1993), dispondo sobre a organizacao da Assistencia Social (BRASIL, 2010).

Segundo Behring e Boschetti (2006), exatamente para aperfeicoar o processo democratico restrito a democracia representativa que foram criadas instancias estrategicas como os conselhos, entendidas como arenas de discussao das demandas e interesses presentes em politicas setoriais especificas. Faz-se mister contextualizar a nocao de esfera publica e de democracia no Brasil. Segundo Raichellis (2006, p. 80), a esfera publica pode ser entendida como:

Um espaco essencialmente politico, de aparecimento e visibilidade, aonde tudo que vem a publico pode ser visto e ouvido por todos. Nesta esfera, os sujeitos sociais estabelecem uma interlocucao publica, que nao e apenas discursiva, mas implica na acao e na deliberacao sobre questoes que dizem respeito a um destino comum/coletivo. Importante entendermos a nocao de esfera publica como um espaco de ampliacao da democratizacao da sociedade. Porem, este processo de participacao social encontra ainda muitos entraves na real efetivacao de sua constituicao. Isto porque, no Brasil, convivemos por decadas com o modelo de autoridade centrado na figura do homem e do pai, vistos como grandes detentores e proprietarios de terras, diretamente articulados com o poder politico local. Fato que se torna incontestavel no periodo que abrange a Republica Velha, no qual o estado de Sao Paulo configurava-se como detentor da producao cafeeira, e o de Minas Gerais como grande produtor de leite. Ou seja, a politica coronelista propalada no meio rural expressa, de forma clara, a ausencia de separacao entre as esferas da vida publica e privada. Segundo a analise de Leal (apud REVISTA IDEIAS, 1999, p. 47), "o sistema coronelista representava a incursao do poder privado no poder publico: nao havia criterios transparentes, nos quais as acoes publicas se fundamentassem".

Na verdade, os compromissos eram estabelecidos pelos principios da palavra dada, referencias da esfera do privado, do pessoal, favorecendo a implantacao de uma "cultura da dadiva", dos favores politicos na barganha pela troca de votos dos coroneis (REVISTA IDEIAS, 1999). Desta forma, os direitos encontram-se totalmente mediados pelas relacoes de mando e de subserviencia, transferidas da esfera do mundo privado para a esfera da vida civil, num conceito de cidadania restrita e consentida. Ressalta-se o historico que permeia a propria concepcao de Assistencia Social no Brasil, que foi marcadamente influenciada pelas nocoes da esfera do mundo privado e da politica dos coroneis.

Na decada de 1930, no Brasil, a influencia do populismo de Getulio Vargas veio para intensificar este processo clientelista e paternalista da Politica de Assistencia Social que, neste periodo, era marcada pelo predominio dos interesses privados em detrimento da nocao de interesse publico. Ou seja, a politica era considerada um privilegio das elites dirigentes, consubstanciada pelas caracteristicas de um Estado burgues, no qual a passividade e o distanciamento da populacao estavam atrelados a esta nocao privatista e excludente. Percebe-se, neste periodo, um Estado altamente centralizador e controlador da sociedade civil, sendo a esfera publica sempre confundida com o espaco estatal.

No periodo do Governo Vargas, destacamos alguns marcos historicos importantes referentes a politica de assistencia social. Com o termino da Republica Velha, a partir dos anos de 1930, a questao social se poe como alvo de intervencao estatal por meio das politicas sociais publicas.

Ao mesmo tempo, o empresariado, imbuido de um novo espirito social, comeca a criar mecanismos que visam a colaboracao entre capital e trabalho, em substituicao a mera repressao e assistencia eventual e descontinuada.

A historia da Politica Publica de Assistencia Social no Brasil nasce intrinsecamente atrelada ao Estado, num vies caritativo e de controle da sociedade, atraves do apassivamento das classes subalternas. Intensificouse, sobretudo, na ditadura do Estado Novo, no Governo Vargas, devido principalmente a preocupacao do Estado com a disseminacao das ideologias revolucionarias do fascismo na Europa.

Ao trabalhador pobre e sem carteira de trabalho assinada ou desempregado o que restava eram as obras sociais e filantropicas, muitas das quais ligadas a acao social da Igreja Catolica, que assistia aos mais pobres na sociedade. Assim foi criada a Legiao Brasileira de Assistencia Social (LBA) em outubro de 1942, por Darcy Vargas (1), esposa de Getulio Vargas. Nela, reuniam-se as senhoras da sociedade da epoca, sendo a primeira instituicao assistencial de porte nacional para atender as familias dos expedicionarios brasileiros (Forca Expedicionaria Brasileira--FEB) chamados a Segunda Guerra Mundial, tornando-se uma sociedade civil de finalidades nao economicas. Para Sposati (2005, p. 20), "a assistencia social como acao social e ato de vontade e nao direito de cidadania".

Com o passar do tempo, a LBA2 comeca a atender as familias quando da ocorrencia de calamidades, trazendo o vinculo emergencial a assistencia social num vies tecnocratico, e nao democratico. Terminada a guerra, a LBA se volta para a assistencia a maternidade e a infancia, iniciando a politica de convenios com instituicoes sociais no ambito filantropico e do campo da benemerencia, sendo caracterizada por acoes assistencialistas e de prestacao de auxilios emergenciais e paliativos a miseria. Neste contexto, cunha-se o chamado "primeiro-damismo", pratica infelizmente persistente ate os dias atuais nas gestoes das Secretarias da Politica de Assistencia Social, embora seja, atualmente, mais presente nas gestoes municipais.

Como foi dito, e no Governo Vargas que ressurge o primeiro-damismo, pautado no fato de a Assistencia Social se associar a figura da primeira-dama. Comeca, entao, a se estabelecer, com a presidencia da LBA na decada de 1940, uma simbiose entre a iniciativa privada e a publica, conformando uma relacao basica entre Estado e classes subalternas (SPOSATI apud TORRES, 2002).

Desta forma, a LBA integra o horizonte de uma politica paternalista e clientelista na Assistencia Social, cujo pressuposto e ser um "orgao" que faz o bem e presta ajuda aos necessitados, estando ligado a primeira-dama do pais e vinculado ao gabinete da Presidencia da Republica. Desse modo, perdendo o status da tentativa de construir, na epoca, uma solida politica de Assistencia Social em um ministerio especifico do governo. Neste caso, a Assistencia Social passa a ser movida pela boa vontade dos governantes e pelas "maos" generosas das primeiras-damas, fazendo com que as classes subalternas se conformem com a politica instituida pelo governo. A ideologia dominante encontra terreno propicio para a disseminacao de suas ideias, costumes e valores condizentes com o posicionamento da burguesia.

Importante ressaltar que as classes subalternas possuem, no imaginario popular, a ideia de que as primeiras-damas da Assistencia Social evocam papeis que envolvem generosidade e caridade humana, fazendo com que os usuarios sejam levados a uma total passividade, conformidade e dependencia das benesses institucionais do Estado. Ressalta-se, tambem, que o periodo ditatorial brasileiro (pos-1964) teve como proposito abafar e controlar as formas de organizacao dos trabalhadores pois, apesar da abertura ao capital industrial, vivia-se uma situacao de arrocho salarial progressivo, em que a questao social assumia contornos assustadores no pais, conforme nos aponta Torres (2002).

Alem disso, neste periodo ditatorial no Brasil, as politicas sociais passam a ser utilizadas como estrategias do governo para arrefecer ou neutralizar os conflitos sociais. As iniciativas democraticas ameacavam o governo ditatorial pela acao dos movimentos sociais, incentivados por grande parte da sociedade civil descontente e deteriorada no pais. Nesta epoca, o Estado...

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