As funções sociais da cidade

AutorCarlos Mello Garcias - Jorge Luiz Bernardi
CargoEngenheiro Civil Curso de Engenharia Ambiental PUCPR do Curso de Doutorado em Gestão Urbana PUCPR - Advogado, Mestre em Gestão Urbana e Vereador da Cidade de Curitiba
1 Introdução
1. 1 A Delimitação do Tema

A Constituição Federal estabelece (caput do artigo 182 e no §1º.) que a política do desenvolvimento urbano tem por objetivo ordenar pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade para proporcionar o bem-estar de seus habitantes. A Constituição trata das funções sociais da cidade, mas não esclarece quais são essas funções que devem ser ordenadas para que ocorra efetivamente melhorias na qualidade de vida dos moradores da cidade e daqueles que dela se utilizam.

Diante do problema, o objetivo geral deste estudo é demonstrar que as funções sociais da cidade, para serem ordenadas na implantação de uma política municipal de desenvolvimento e expansão urbana, precisam ser definidas e caracterizadas e assim possam ser implementadas.

E para que efetivamente isto ocorra, foram traçados os seguintes objetivos específicos:

I investigar a evolução do desenvolvimento urbano ao longo da história e das normas;

II desvendar, através de uma profunda reflexão e análise jurídica, históricocrítica, quais são as funções sociais da cidade, que a Constituição Federal (CF) trata, mas não as identifica;

1. 2 Marco Teórico

Este é um estudo jurídico, apesar de estar permeado de conceitos sociológicos, filosóficos, urbanísticos, históricos, econômicos, de geografia urbana, e administrativos. O caráter de interdisciplinaridade e multidisciplinariedade está em todos os elementos que compõe o trabalho, uma vez que, no mestrado em Gestão Urbana, as disciplinas que o compõe, possuem esta característica que acabam influenciando na formação do estudante. Porém, o fio principal que conduz esta análise constitui-se num viés legal, ao se fundamentar em princípios constitucionais: o capitulo da Política Urbana, artigo 182 da C.F.

Embora a civilização tenha se desenvolvido no momento em que o homem se tornou gregário e edificou a cidade, as funções sociais da cidade têm sido objeto de reflexão muito recente, constituindo-se ainda num caminho em certos aspectos desconhecido.

Como um ser vivo, o planeta sofre as conseqüências da ação do homem, apresentando os primeiros sinais de doença e que já está afetando a vida de todos. Assim é que a ordenação das funções sociais da cidade passa a ser paradigma, objetivando agredir o mínimo possível o lar da humanidade para que nele continue a vida em contínua evolução. E também que os direitos fundamentais se concretizem por meio da ação prática do Poder Público.

2 A cidade
2. 1 A Urbanização

O que é fenômeno urbano? Quando surgiu? Quais as conseqüências da transformação do meio ambiente natural em meio ambiente construído ou artificial? O que fazer para que os efeitos da urbanização afetem o mínimo possível o equilíbrio natural do planeta? Estas e outras perguntas são questões que preocupam todos aqueles que refletem sobre este fenômeno recente na história que é a urbanização. Entender este fenômeno e as particularidades que ele apresenta no Brasil pressupõe, não só uma abordagem histórica e conceitual, mas igualmente ter a compreensão do papel do município pela Constituição Federal e nas leis infraconstitucionais, bem como da realidade regional em que ele se desenvolve.

Antes de ser um espaço físico, o urbano é um espaço social. O ambiente onde vivem seres humanos que têm suas necessidades, seus sonhos, seus projetos de vida. Um ambiente modificado, alterado, construído, que muitas vezes faz esquecer o ambiente natural por onde milhões de anos a espécie humana percorreu para chegar a civilização. Pode-se dizer que a cidade transformou o homem; ou, então, que o homem foi se transformando à medida que foi edificando o ambiente em urbano.

E agora? Para onde vai a civilização? Independentemente de qual for à resposta, a cidade, tenha ela a forma que tiver, esteja onde estiver, deverá ter um papel importante para o ser humano que, só sobreviveu ao longo dos tempos porque conseguiu unir esforços com os seus semelhantes para vencer todos os desafios. A cidade é gente.

2. 2 Buscando um Conceito de Cidade

Mas o que é afinal a cidade? O termo cidade vem do latim, civitas, que dá origem, entre outras, a palavras como cidadania, cidadão, civismo. Também latina a palavra urbe. É hoje um sinônimo de cidade, que por sua vez, gerou outros termos relacionados a vida em coletividade como urbanismo, urbano, urbanidade. Unindo-se ao termo grego polis, ou seja, a cidade-estado, autônoma, independente, civil, público, o local onde a vida cívica acontece, o mercado, o ambiente político, do exercício da cidadania, chega-se a origem destes termos que definem o ambiente urbano.

Bonini (1983, p. 949), afirma que “por polis se entende uma cidade autônoma e soberana, cujo quadro institucional é caracterizado por uma ou várias magistraturas, por um conselho e uma assembléia de cidadãos (politai)”.

Como a cidade pode ser conceituada, entendida, definida? Quais as características que a diferenciam do ambiente rural?

Weber (1987, p. 4) em resposta a estas e outras perguntas começa conceituar a cidade sob o aspecto material, ou seja, a partir do que ele chama de estabelecimento compacto de prédios próximos uns dos outros. Sob a ótica econômica o pensador alemão argumenta que na cidade “la mayor parte de sus habitantes viven de la industria y del comercio y no de la agricultura”.

A partir das reflexões de Weber, Reis Filho citado por Silva (2000, p. 24), estabelece algumas condições para determinar o que seja o conceito de cidade. São estes os requisitos propostos:

(1) densidade demográfica específica; (2) profissões urbanas como comércio e manufatura, com suficiente diversificação; (3) economia urbana permanente, com relações especiais ao meio rural; (4) existência de camada urbana com produção, consumo e direitos próprios.

Sobre uma conceituação da cidade Beaujeu-Garnier (1997, p.11), ainda explica a cidade através das suas funções: objeto e sujeito. Argumenta que, enquanto objeto ela existe de fato, pode ser observada materialmente atrai e acolhe habitantes aos quais fornece, através da sua produção própria, do seu comércio e dos seus diversos equipamentos, a maior parte de tudo o que eles necessitam: é o lugar onde os contatos de toda a natureza são favorecidos e maximilizados os resultado.

O modelo de cidade moderna, resultado do Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), é conceituada sob a ótica do planejamento, da funcionalidade, com espaços bem definidos para a habitação, trabalho, lazer e circulação.

É a cidade de Le Corbusier, que responde as funções da vida: “habitar, trabalhar, cultivar o corpo e o espírito, aos quais um objetivo elevado, conquanto acessível, possa ser atribuído: a alegria de viver” (1971, p. 53).

Já a cidade pós-moderna contrapõe-se a cidade moderna assumindo formas exatamente opostas. Uma cidade em pedaços, onde as funções estão esparramadas na mancha urbana, agregando-se umas as outras num aparente caos de estilos e atividades. A cidade volta a ser o que era no passado, no início da era industrial.

No Brasil é considerado urbano, o que a lei municipal determina que compreende o perímetro urbano. É a sede do município, mas pode também abranger distritos municipais. Para alguns autores, como Gonçalves (1996, p. 46):

“O vocábulo cidade não compreende apenas o distrito sede do município, pelo que a regra se aplica igualmente, às sedes dos distritos, quando contém mais de 20 mil habitantes. Cidade não é apenas a sede do município, a sede do governo municipal, mas todo complexo...

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