Por que só maconha?

AutorDiego Werneck Arguelhes, Fernando Leal
Páginas331-333

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Na sessão da última quinta-feira, os ministros divergiram quanto ao alcance da decisão: descriminalização da maconha ou do uso de drogas em geral? De um lado, com posição mais ampla, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso. De outro, os ministros Luis Roberto Barroso e Luíz Edson Fachin, focando exclusivamente na descriminalização da maconha.

O caso concreto envolvia maconha - mas a tese proposta para a repercussão geral até ali já tratava de drogas em geral. Na semana passada, aliás, o tribunal decidiu que a desistência da parte no caso concreto não impede o julgamento da tese da repercussão geral. Nenhuma regra processual, portanto, forçava os ministros a escolher um dos caminhos. "Focar no caso concreto" é em si a escolha a ser justiicada, e não uma justiicativa. Como Fachin e Barroso justiicaram a atitude restritiva?

Debatendo com Mendes, Barroso explicou que, em contraste com a maconha, não tinha informações sobre drogas como o crack. Tal posição poderia talvez ser lida como justiicativa para autocontenção ou minimalismo judicial - um exercício de prudência e modéstia de um juiz que reconhece as limitações do seu conhecimento sobre determinado aspecto da vida social, e que por isso quer dar um passo de cada vez. Poderia também ser expressão de respeito a escolhas políticas e técnicas feitas pelos outros poderes.

Entretanto, falta de informação sobre a realidade não é argumento suiciente para o Supremo não decidir sobre um tema. Ao menos não dessa forma - e não para uma questão fática sobre a qual há conhecimento técnico ou cientíico relevante.

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Caso contrário, na prática, acabaríamos por excluir da alçada do Supremo todos os temas com os quais os ministros não tiveram contato direto em sua vida pessoal e proissional. Temas cuja solução, apesar de seus aspectos jurídicos, dependem também de informações empíricas sobre o funcionamento do mundo. Qual contato têm os ministros com o mercado de pneus no Mercosul? Com os aspectos técnicos de telecomunicações, do uso de amianto em construções, da interrupção da gravidez de fetos com anencefalia ou de pesquisas com células-tronco? Até serem forçados a decidir, os ministros provavelmente nunca tinham pensado a respeito destas questões. Mas uma vez provocados a decidir, precisaram se informar.

O crack não é diferente da maconha nesse aspecto, pois não se espera do ministro que decida com as informações que já possua sobre tais temas - informações que, aliás, podem ser...

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