Sistema constitucional tributário e o tempo dos tributos

AutorCristiane Pires
Páginas95-138
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CAPÍTULO III
SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO
E O TEMPO DOS TRIBUTOS
A Constituição Federal é a regente, os legisladores competentes os
músicos e as normas jurídicas são os instrumentos. Olhos fitos na
Maestrina, podemos alcançar a harmonia e o ritmo do tempo jurí-
dico que a sociedade escolheu para si.
Cristiane Pires
3.1 Considerações iniciais do Capítulo
No capítulo precedente, procuramos examinar a relação
entre o tempo e o Direito. Começamos a tratar, então, do tem-
po jurídico. Esse tempo instituidor, que irá definir o começo, o
meio e o fim de uma relação jurídica. Esse tempo que não de-
pende dos movimentos ou sequências que se estabeleçam entre
os fenômenos naturais. Esse tempo que pode mudar o passado
de uma sociedade, que projeta – quando não precipita – seu o
futuro e que, assim, vai construindo o seu presente. Esse tempo
que, como verificamos, é um forte instrumento de poder.
Ocorre que o Direito, como vimos no Capítulo I, se estabe-
lece e se estrutura em forma de sistema. Um sistema autopoié-
tico que traz suas próprias regras de construção e articulação,
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CRISTIANE PIRES
que se edifica e se sustenta sobre suas próprias bases. No ápice
do sistema jurídico encontramos a Constituição Federal, docu-
mento maior de onde deve partir o processo de positivação –
aqui tomado como expedição de novas normas – e onde as nor-
mas positivadas devem encontrar seu fundamento de validade
– mediante o esgotamento do processo de derivação.
No território dos tributos, a necessidade de buscar funda-
mento no documento constitucional, se apresenta intensificada.
A Lei Maior é o domicílio, primeiro e principal, do Direito Tribu-
tário, o que faz com que reconheçamos a existência um autên-
tico “sistema constitucional tributário” no ordenamento pátrio,
que com o todo “se conjuga, combina e articula, dele extraindo
seus fundamentos e condições de expressão e existência”
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.
Em face dessa característica do Direito Tributário pátrio,
achamos indispensável dedicar este terceiro capítulo para
examinar as normas constitucionais, a fim de destacar os
pressupostos ali firmados para o trato com critério temporal
da regra-matriz de incidência tributária pelos demais instru-
mentos infraconstitucionais introdutores de normas jurídicas.
Essa passagem é de suma importância para o presente estu-
do, pois não há como interpretar qualquer enunciado jurídico
sem considerar os comandos maiores.
Inicia-se, portanto, com a tessitura de considerações a
respeito de como haveremos de enfrentar no nosso trabalho a
designada “competência tributária”.
3.2 Poder de tributar e competência tributária
O presente Capítulo foi intitulado “Sistema Constitucio-
nal Tributário e o tempo dos tributos”, justamente pelo intui-
to de trabalharmos nele as balizas constitucionais a respeito
de nosso tema maior e principal: o critério temporal da regra-
-matriz de incidência tributária.
144. ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. São Paulo: Re-
vista dos Tribunais, 1968, p. 6.
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O TEMPO E O TRIBUTO
Como já tivemos oportunidade de afirmar, a Constituição
Federal é o domicílio primeiro e principal do direito tributá-
rio, isto porque nela se encontram as normas base para todo
sequente processo de positivação. Por isso, o estudo de qual-
quer norma que diga respeito a essa seara deve partir e ter
como ponto de chegada as disposições magnas.
Ao traçar estas normas base do direito pátrio, o texto
constitucional prescreve com hialina clareza que “Todo poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes elei-
tos ou diretamente, nos termos desta Constituição” (art. 1º,
parágrafo único). É dizer, a Constituição, ao mesmo tempo em
que, confere ao povo o status de fonte de todo o poder, avo-
ca para si a incumbência de indicar quem deve exercê-los, e
como eles devem ser exercidos em caráter de representação.
É nítido que o exercício deste “poder” significa mesmo
uma conduta balizada, por isso denominada competência no
seu sentido clássico e nuclear de autorização e proficiência,
isto é, de possibilidade, permissão ou habilidade para realizar
uma ação, para desempenhar uma função. As normas cons-
titucionais não transferem o poder do povo para os Estado,
mas permitem o seu exercício pelos representantes do povo.
O caráter normativo limitador neste campo é proeminente.
Diante da possível variação semântica do termo “poder”,
é possível e forçoso identificar quando este indica, de fato, uma
“competência”, para fins de uma interpretação mais precisa a
respeito do sentido e alcance das normas constitucionais.
Na seara dos tributos a relevância dessa assimilação é
manifesta, isto porque ao empregar a expressão “Limites ao
Poder de Tributar” o constituinte se empenhou em trazer
prescrições minuciosas a respeito do sistema tributário que
carregam duas implicações: (i) a primeira é que ela é uma
condição normativa mínima de ação - sem competência não
se pode agir em determinado sentido, de forma válida; (ii) a
segunda é que nela se encontra a ideia de possibilidade (po-
der/dever), mas também de limitação - uma competência é

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