A Simulação: Um Problema para o Perito Avaliador

AutorJorge Paulete Vanrell
Ocupação do AutorMedicina, Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais e Licenciatura Plena em Pedagogia
Páginas51-62

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1 Introdução

Traçados os parâmetros referidos no capítulo precedente, para proceder à determinação da descapacidade originada por deficiências permanentes, o médico avaliador deverá colher informações prévias no sentido de verificar, a priori, se:

  1. O processo patológico que deu origem à deficiência, tanto sendo congênito como adquirido, foi previa e corretamente diagnosticado e adequadamente tratado, pela documentação disponível;

  2. As pautas de valoração da descapacidade que se aplicarão se encontrarão embasadas na seriedade das consequências da enfermidade ou sequela, qualquer que esta seja.

  3. As deficiências permanentes serão mesmo aquelas alterações orgânicas ou funcionais não recuperáveis, com melhora da estrutura ou da função do órgão ou segmento afetado;

  4. A avaliação das deficiências permanentes dos diferentes órgãos, sistemas ou aparelhos foi feita mediante parâmetros objetivos e levando-se em conta, sempre, o efeito das sequelas sobre a capacidade para implementar as atividades da vida diária (AVD), isto é, no grau de descapacidade que a deficiência provocou.

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Toda essa atividade a ser seguida, sequencialmente, pelo Perito Avaliador para cada caso examinado, de forma objetiva, colhendo e analisando dados concretos, deve complementar-se, na maioria das vezes, com a necessidade de se aquilatarem queixas e manifestações do periciado, de tipo subjetivo: dores, descapacidade funcional, ativa e passiva etc.

É justamente nesse ponto, crucial e frágil, que o Perito Avaliador pode ver seu trabalho parcialmente comprometido e suas metas ilaqueadas, pela manipulação das informações que receberá do periciado, com a intenção dolosa de ver os resultados adulterados e, consequentemente, os benefícios secundários deturpados.

2 Os ganhos, vantagens ou benefícios

A toda ação corresponde uma reação. A toda atividade corresponde um resultado.

É bem verdade que as reações e os resultados desses princípios basilares nem sempre são evidentes e escancarados. Contrariamente, tais ganhos, ao invés de aparecerem ao primeiro olhar, podem encontrar-se ocultos, escamoteados ou de forma críptica. Todavia, sempre estão presentes.

Esses ganhos ou benefícios costumam dividir-se em primários e secundários.

O ganho primário (benefício primário ou vantagem primária) é representado pelo alívio do conflito emocional inconsciente, pela supressão ou repressão de uma ideia ameaçadora, proibida ou perigosa, que pode ser transformada em um sintoma físico.

O ganho secundário (benefício secundário ou vantagem secundária) é constituído por vantagens mais diretas e imediatas, como atenção, simpatia, companhia e desobrigação pelas responsabilidades do cotidiano. Em muitas ocasiões, o conceito de ganho ou benefício secundário tem sido mal compreendido, e entendido apenas como o proveito material que o paciente pode obter de sua “doença”, ameaçando com

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o agravamento dos seus sintomas, conseguindo cuidados especiais e vantagens materiais.

3 A anatomia da mentira

Ballone1(2006) preleciona que:

A mentira não deve ser entendida como uma espécie de contrário da verdade. Ética e moralmente, a mentira está muito mais relacionada à intenção de enganar do que ao teor de deturpação da verdade e, juridicamente, a mentira está relacionada ao dolo ou prejuízo que causa a outra pessoa ou instituição.

Por outras palavras, a intencionalidade é que define a mentira, estabelecendo o dano ou dolo.

Assim, é o propósito com que se diz alguma coisa que definirá a mentira. Mentir seria dirigir a outrem um enunciado falso, de cuja falsidade o mentiroso tem plena consciência, assim o fazendo com o objetivo de enganar, de levar esse outro a crer naquilo que é dito, dando a entender que diz a verdade.

Como já dissemos, para mentir o que conta é a intenção. É a intenção que define se o que foi dito, verdadeiro ou falso, teve ou não o propósito de enganar.

Muitas vezes, levadas pela insegurança de serem aceitas tal como são, as pessoas podem cair na tentação de enriquecer suas estórias e enaltecer suas habilidades, de forma a causar uma impressão mais favorável em outras pessoas e, com isso, serem mais facilmente aceitas.

Outras vezes, o comportamento contradiz a argumentação lógica, o labor e a honestidade, pois quem usa da mentira pressupõe que tais métodos são incapazes de gerar bons resultados.

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A simulação pode definir-se como um conjunto de artimanhas utilizadas para se obter vantagens secundárias em determinada situação (vantagens estas na maioria das vezes ilícitas). Esse procedimento caracteriza-se pela engenhosidade e pela sutileza. A sua execução, por parte do paciente, exige aprendizado, destreza, carisma, lábia, histrionismo e quaisquer características que permitam a manipulação de pessoas ou resultados, de forma a obter o melhor destes, e da maneira mais fácil possível.

A simulação pode ser considerada outro modo de navegação médica e social típica, em que a integridade de instituições (Previdência Social, Companhias de Seguros, Empresas) e de indivíduos (réus em ações indenizatórias) é efetivamente lesada de uma forma juridicamente definível como dolosa. No entanto, a simulação bem-sucedida pressupõe que se obtenham vantagens sem que...

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