Os signos distintivos e o mercado consumidor à luz do ordenamento jurídico brasileiro

AutorLiliana Locatelli
CargoDoutora em Direito pela UFSC. Professora da Graduação e Pós-Graduação em Direito da URI.
Páginas99-111

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Considerações iniciais

Com o fenômeno da globalização, as mercadorias tendem circular com maior facilidade no mercado de consumo, não se limitando às fronteiras nacionais. A livre circulação de mercadorias, por sua vez, faz com que a concorrência entre os diversos produtos ou serviços se torne mais acirrada, fazendo com que as empresas busquem novos meios para diferenciar-se ante um mercado consumidor que possui cada vez mais possibilidades de escolha.

Dentre os diversos mecanismos de diferenciação de produtos, estão os signos distintivos protegidos pelos direitos da propriedade industrial. Estes signos compreendem as marcas de produtos ou serviços, as marcas de certificação e as indicações geográficas. Cada um deles identifica o produto a partir de uma característica específica, agregando valor no mercado consumidor e permitindo a efetiva proteção dos reais titulares destes direitos.

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Neste contexto, o presente artigo busca evidenciar, à luz do novo perfil do mercado consumidor na era da globalização, o importante papel dos signos distintivos e a proteção jurídica conferida pela legislação nacional aos seus titulares.

1. O mercado consumidor e a globalização

A globalização é um fenômeno de muitas facetas, marcado, entre outros aspectos, pela relativização das fronteiras. Tanto no comportamento do mercado consumidor, como em diversas outras áreas, a globalização tem conseqüências importantes.

Hoje, o consumidor depara-se, em seu país, com uma gama cada vez maior de produtos vindos de todos os lugares do mundo, ao mesmo tempo em que determinados produtos ou serviços são mundialmente conhecidos e consumidos. O global substitui o local, não somente na transmissão de conhecimento, na difusão de cultura, como também no comportamento dos consumidores e no acesso aos produtos e serviços. (CANCLINI, 2005, p. 45). Com novas tecnologias sendo veiculadas diariamente, a vida útil dos produtos também se torna mais exígua e o consumo cresce desenfreadamente.

Neste cenário, com uma oferta cada vez maior e diversificada de produtos no mercado consumidor, a concorrência se acentua e a necessidade de diferenciação destes produtos e serviços se torna imprescindível. Neste contexto, as empresas buscam destacar-se por meio da qualidade, da origem, da publicidade e marketing, do preço, entre outros aspectos. Observe-se:

Diferentemente de alguns anos, onde a preocupação principal das empresas era ter o produto e disponibilizá-lo da melhor forma a seus clientes e consumidores, já não basta ter o produto, disponibilizá-lo, ter preços competitivos, mas sim, criar uma imagem deste produto na cabeça do consumidor, antecipando-se aos seus desejos. (ENDERLE, 2007)

Não raras vezes, produtos que possuem marcas renomadas ganham a preferência do consumidor mesmo quando este tem à sua disposição similares, tanto em utilidade quanto em qualidade, com preços bem mais competitivos.

É possível associar tal comportamento ao fato de que hoje, no mercado de consumo, necessidade e desejo se confundem, e o consumo está aliado ao sentimento de status social. (CANCLINI, 2005, p. 35) Por esta razão, os produtos são adquiridos não somente em razão da sua utilidade ou da relação custo-benefício, mas de acordo com a notoriedade que possuem, a qualidade e os diferenciais que ostentam. Todos estes atributos, por sua vez, são identificados pelo consumidorPage 101por meio dos diversos signos distintivos utilizados pelas empresas, tais como as marcas e as indicações de origem.

Em razão do fato de o consumidor se identificar com tais signos, surge a necessidade de protegê-los juridicamente, restringindo a utilização indevida por terceiros. Neste sentido, então, os ordenamentos jurídicos passaram a ocupar-se, dentro dos direitos da propriedade intelectual, da regulamentação destes signos.

2. Signos distintivos e propriedade intelectual

A propriedade intelectual pode ser classificada em dois grandes ramos: os direitos autorais e conexos e a propriedade industrial, aos quais se acrescentam novos institutos: os cultivares “ para variedades vegetais “ e as topografias de circuito integrado. (PIMENTEL, 2005, p. 295)

Os direitos autorais se referem à propriedade sobre obras artísticas, científicas e literárias e direitos conexos, assim como, hoje, os programas de computador “ softwares. Por outro lado, a propriedade industrial tem como objeto as patentes de invenção, o modelo de utilidade, os desenhos industriais, as marcas e indicações geográficas “ signos distintivos. (PIMENTEL, 2005, p. 295) A legislação nacional de propriedade industrial, regulamenta: (Lei n. 9279/96)

Art. 2. [...]

I- concessão de patentes de invenção e de modelo de utilidade;

II- concessão de registro de desenho industrial;

III- concessão de registro de marca;

IV- repressão às falsas indicações geográficas;

V- repressão à concorrência desleal (Lei n. 9279/96).

O objetivo de se proteger os direitos de propriedade industrial, ou melhor, da propriedade intelectual em sua totalidade, é garantir uma posição jurídica (titularidade) e uma posição econômica (exclusividade) perante estes direitos. Assim, a proteção visa garantir ao titular o exercício dos direitos, tendo em vista a recuperação de investimentos realizados, e uma posição econômica privilegiada e lícita no mercado que o permite, por exemplo, dependendo do direito, transferir ou autorizar a exploração por outrem. (PIMENTEL, 2005, p. 289-290)

No que tange aos signos distintivos, a Lei n. 9.279/96 – que normatiza a propriedade industrial no país –, regulamenta, entre outros institutos, as marcas, marcas de certificação e as indicações geográficas, que serão estudadas a seguir,Page 102tanto no que se refere à sua proteção jurídica quanto ao impacto no mercado de consumo.

2. 1 Marcas de produtos e serviços e marcas de certificação

Entende-se por marca todo e qualquer sinal distintivo, utilizado em produtos ou serviços, que seja visualmente perceptível e não incida nas hipóteses proibitivas da legislação interna, tais como os símbolos oficiais. (Lei n. 9.279/96, art. 122).

As marcas diferenciam os produtos e serviços em razão da empresa no qual são produzidos ou fornecidos, (OMPI, 2000) sem que haja necessidade de se atestar qualquer característica ou qualidade específica.

Estes signos, por sua vez, podem atrair uma maior demanda e notoriedade pelos investimentos em publicidade, pela qualidade oferecida, por serem pioneiros no ramo, entre outros fatores. Algumas marcas, inclusive, gozam de tamanha notoriedade que são confundidas hoje pelo gênero do produto, como, por exemplo, a marca “Bombril”, “Maizena”, entre outras.

O valor econômico deste ativo intangível para as empresas vem sendo reconhecido cada vez mais, sobretudo quando o mercado consumidor transcende as fronteiras...

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