O sigilo na legislação brasileira

AutorShandor Portella Lourenço
Páginas75-117
O SIGILO NA
LEGISLAÇÃO
BRASILEIRA
A preservação das informações de propriedade das so-
ciedades empresárias depende da conjugação de várias inicia-
tivas. A par da utilização dos mecanismos tecnológicos abor-
dados no capítulo anterior, é preciso que as leis protetoras do
sigilo passem por um contínuo processo de aperfeiçoamento
e debate a fim de inibir as práticas que lhes são contrárias.
Considerando os múltiplos aspectos que circundam
a atividade mercantil, bem como o modo esparso como se
apresenta a legislação que rege o assunto, a opção por uma
abordagem dos diplomas normativos em tópicos autônomos
apresenta-se como medida indispensável à compreensão do
tema. Por essa razão, dividiremos o estudo das leis de acordo
com o ramo jurídico com que mais se identificam.
Além da referência aos diplomas normativos respecti-
vos, os aspectos mais polêmicos envolvendo seus dispositivos
também serão trazidos à discussão, notadamente os relacio-
nados à compatibilidade com a Constituição. Nesse sentido,
a pesquisa da jurisprudência pátria será priorizada de modo a
traçar um panorama fiel da interpretação dessas normas pelo
Poder Judiciário.
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76 segredo do comércio
3.1 Direito do Trabalho
A regular gestão do sigilo na empresa depende, em boa
parte, da colaboração e controle dos funcionários da organi-
zação. Como a produção de bens e serviços provém do tra-
balho desses agentes, torna-se quase impossível mantê-los
distantes dos segredos que envolvem a rotina administrativa
e tecnológica de seus empregadores.
Caso a legislação trabalhista não dotasse o empresário
de poderes e mecanismos de controle dos empregados, a or-
ganização e a proteção dos segredos negociais restariam irre-
mediavelmente inviabilizados.
Dentre todos os elementos que caracterizam o empre-
sário1, a organização dos fatores de produção é o que atinge
de modo mais direto a gestão dos segredos empresariais, já
que é a partir dela que é possível gerir a confidencialidade das
informações que agregam valor ao negócio.
Coelho (2008, p. 13) assim define o elemento orga-
nização:
A empresa é atividade organizada no sentido de que
nela se encontram articulados, pelo empresário, os
quatro fatores de produção: capital, mão de obra, in-
sumos e tecnologia. Não é empresário quem explora
1 O Código Civil (Lei 10.406/02) assim enuncia os elementos fático-jurí-
dicos necessários à caracterização do empresário: “art. 966. Considera-se
empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organi-
zada para a produção ou a circulação de bens ou serviços”. Dessa definição
podemos extrair os quatro atributos necessários à configuração do empre-
sário: a) profissionalismo, b) atividade econômica, c) organização e d) a
produção ou circulação de bens e serviços.
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atividade de produção ou circulação de bens ou servi-
ços sem alguns desses fatores.
Organizar os fatores de produção implica, portanto,
criar métodos e rotinas de produção e trabalho, estratégias de
marketing, prioridade de ações perante o mercado consumidor,
bem como regulamentar e fiscalizar todas as atividade que re-
presentem risco de violação dos segredos empresariais.
Para viabilizar a organização supramencionada, so-
bretudo em relação aos fatores de produção, mão de obra
e tecnologia, foi necessário estipular uma relação jurídica
de subordinação entre empregado e empregador.
Segundo o art. 3º da CLT2:
Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que
prestar serviços de natureza não eventual a emprega-
dor, sob a dependência deste e mediante salário.
Parágrafo único. Não haverá distinções relativas à es-
pécie de emprego e à condição de trabalhador, nem
entre o trabalho intelectual, técnico e manual.
A subordinação jurídica do empregado corresponde,
pois, a um estado de sujeição do empregado às ordens do seu
empregador. Em razão desse dever de obediência do empre-
gado, o empregador se vê investido de um poder jurídico na
direção, coordenação e controle da atividade produtiva.
Ressalte-se, todavia, que a referida subordinação possui
natureza exclusivamente jurídica e não é extensiva à pessoa
do empregado, conforme leciona Delgado (1995, p. 163):
2 Elenca os elementos fático-jurídicos necessários ao reconhecimento do
vínculo empregatício.

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