Sentença (Vara do Tarbalho de Camaçari-BA)

Páginas355-392

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Sentença

Vistos etc.

O Ministério Público do Trabalho, qualificado, ajuizou Ação Civil Pública em face de Du Pont do Brasil S/A, também qualificada, pleiteando a) a condenação da Ré em obrigação de não fazer, consistente na abstenção da contratação de cooperativas de mão de obra para quaisquer atividades, sob pena de multa diária de R$ 3.000,00 por trabalhador encontrado; b) a condenação da Ré em obrigação de não fazer, consistente na abstenção da contratação de empresas ou terceiros para a realização de suas atividades-fins, bem como outras ligadas à sua atividade-meio, ressalvados os serviços de vigilância, conservação e limpeza e outros especializados, sob pena de multa diária de R$ 3.000,00 por trabalhador encontrado; c) a condenação da Ré em R$ 740.000,00 a título de compensação por danos morais coletivos; d) o reconhecimento de vínculo de emprego entre os trabalhadores cooperados que prestam serviços vinculados à atividade-fim e a Ré, com a consequente anotação de sua CTPS — Carteira de Trabalho e Previdência Social, bem assim, a condenação no pagamento das verbas trabalhistas correspondentes; e) determinação da rescisão dos contratos de prestação de serviços com a COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos, Cegelec Ltda. e Sólida Soluções Industriais Ltda..; f) determinação de contratação direta pela Ré de mão de obra para o exercício das funções atualmente desenvolvidas pelo pessoal da Cegelec Ltda. e da Sólida Soluções Industriais Ltda.; g) a publicação de edital, após o trânsito em julgado da decisão, para habilitação dos interessados, bem assim, a liquidação e execução de seus créditos. Propugnou, ainda, pela antecipação parcial dos efeitos da tutela pretendida, a fim de que fosse determinada, liminarmente, a) que a Ré se abstivesse de contratar cooperativas de mão de obra para quaisquer atividades, sob pena de multa diária de R$ 3.000,00 por trabalhador encontrado; b) que a Ré se abstivesse de contratar empresas ou terceiros para a realização de suas atividades-fins, bem como outras ligadas à sua atividade-meio, ressalvados os serviços de vigilância, conservação e limpeza e outros especializados, sob pena

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de multa diária de R$ 3.000,00 por trabalhador encontrado; c) a expedição de ofício à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego — SRTE, para que acompanhe o cumprimento da liminar. Atribuiu à causa o valor de R$ 1.000.000,00. Instruiu a sua Petição Inicial com documentos.

O Juiz resguardou-se à apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela, após a oitiva da parte contrária (fl. 1).

Citada, a Ré, em audiência (fl. 479), ofereceu Defesa escrita (fls. 480/565), suscitando preliminares de inépcia da Petição Inicial, ilegitimidade ativa adcausam do Ministério Público do Trabalho, de denunciação à lide e de prescrição bienal e quinquenal. No mérito, sustentou a licitude das subcontratações efetuadas. Afirmou que a COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos preenchia todos os requisitos legais ao reconhecimento de sua legitimidade e que a Cegelec Ltda. e a Sólida Soluções Industriais Ltda. foram subcontratadas ao exercício de "atividades-meios", sem subordinação jurídica e pessoalidade. Aduziu, ainda, que é inviável o seu apenamento por danos morais coletivos, em razão dos fatos alegados. Ao fim, propugnou pela improcedência dos pedidos, instruindo sua Defesa com documentos.

O Ministério Público do Trabalho manifestou-se sobre Defesa e documentos (fls. 642/671).

A Cooperativa dos Inspetores de Equipamentos Autônomos do Estado da Bahia — COOINSP requereu a sua intervenção no feito como litisconsorte ativo (fls. 673/674) — requerimento que restou indeferido, conforme decisão de fl. 759.

Em nova audiência designada (fls. 760/765), a Ré juntou documentos sobre os quais se manifestou o Ministério Público do Trabalho. Naquele ato, o Ministério Público do Trabalho requereu a expedição de ofício à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego — SRTE para conhecimento das alegações e providências.

Ainda, naquela mesma audiência, foi indeferido o pedido de denunciação à lide formulado pela Ré, sob seus protestos. Em seguida, foi dispensado o depoimento das partes e ouvida uma Testemunha trazida pela Ré.

Naquele ato, o Juiz realizou, com o acompanhamento dos presentes, inspeção judicial (fls. 773/777) sobre a qual se manifestaram as partes (fls. 779/ 786 e 788/799).

A Ré juntou novos documentos (fls. 803/818) sobre os quais se manifestou Ministério Público do Trabalho em audiência (fl. 819).

Razões finais remissivas pelas partes. Sem êxito as tentativas de conciliação. É o relatório.

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INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. NOS TERMOS DO PARÁGRAFO ÚNICO, DO ART. 295 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, SOMENTE SERÁ INEPTA A PETIÇÃO INICIAL QUANDO LHE FALTAR PEDIDO OU CAUSA DE PEDIR; QUANDO DA NARRATIVA DOS FATOS NÃO DECORRER LOGICAMENTE A CONCLUSÃO; QUANDO O PEDIDO FOR JURIDICAMENTE IMPOSSÍVEL; OU, POR FIM, QUANDO CONTIVER PEDIDOS INCOMPATÍVEIS ENTRE SI

Sustenta a Du Pont do Brasil S/A, em apertada síntese, que a Petição Inicial é inepta por não incluir no polo passivo a COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos e as empresas Cegelec Ltda. e Sólida Soluções Industriais Ltda.

Aduz, na esteira desse pensamento, que as mencionadas pessoas jurídicas seriam afetadas pela decisão — o que seria impossível, tendo-se em vista a redação do art. 4721 do Código de Processo Civil — CPC.

Razão, contudo, não lhe assiste.

Como se sabe, a aptidão da Petição Inicial é pressuposto objetivo de desenvolvimento válido e regular do processo2. No entanto, nos termos do parágrafo único, do art. 2953 do Código de Processo Civil, a Petição Inicial apenas poderá ser reputada inepta quando lhe faltar pedido ou causa de pedir; quando da narrativa dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; quando o pedido for juridicamente impossível; ou, por fim, quando contiver pedidos incompatíveis entre si.

Logo, tem-se que a situação processual delineada pela Defesa não se subsume a qualquer das hipóteses legais — o que, de imediato, rechaça a tese de inépcia.

Não bastasse, o dispositivo legal invocado (art. 472 do Código de Processo Civil — CPC) não se aplica ao processo coletivo, uma vez que a coisa julgada,

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em tais casos, sujeita-se à disciplina do art. 1034 do CDC — Código de Defesa do Consumidor.

Verifique-se, de qualquer sorte, que os efeitos materiais e processuais de eventual sentença de procedência serão suportados exclusivamente pela Du Pont do Brasil S/A, que deverá adotar as obrigações de fazer e não fazer postuladas e suportará as indenizações e pagamentos pedidos.

Na verdade, a COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos e as empresas Cegelec Ltda. e Sólida Soluções Industriais Ltda. possuem uma relação jurídica acessória com a Du Pont do Brasil S/A, relação essa que pode sofrer influxos decorrentes da decisão a ser prolatada. Por isso, quando muito, as mencionadas pessoas jurídicas poderiam constituir terceiras juridicamente interessadas, conforme clássica definição de Liebman5.

Dentro desse contexto, acaso quisessem, as mencionadas pessoas jurídicas poderiam intervir, espontaneamente (e não a requerimento da Du Pont do Brasil S/A) no feito como assistentes simples (e não litisconsorciais), por terem interesse jurídico mediato na resolução da demanda. Sucede que, dentre as mencionadas pessoas jurídicas, apenas a COOINSP — Cooperativa dos Inspetores Autônomos pediu a intervenção no feito, só que na condição de litisconsorte ativa — o que é inadmissível, ante à induvidosa ocorrência de interesses conflitantes com o Ministério Público do Trabalho.

Rejeita-se, pois, a preliminar em tela.

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ILEGITIMIDADE ATIVA DO MPT. REJEIÇÃO DA PRELIMINAR. A PAR DE A GRANDE MAIORIA DOS PROVIMENTOS JURISDICIONAIS SOLICITADOS DECORREREM DA DEFESA DE INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS (APENAS O PEDIDO "D” ABRANGE O QUE PODERIAM SER CONSIDERADOS INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS), VERIFICA--SE QUE OS DIREITOS POSTULADOS SÃO INDISPONÍVEIS E DE EXTREMA RELEVÂNCIA SOCIAL — CIRCUNSTÂNCIA QUE ATRAI A LEGITIMIDADE DO MPT, NA FORMA DO ART. 6fi, INCISO VII, ALÍNEA "D", DA LC N. 75/1993, CONFORME JÁ DECIDIDO PELO EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR (ENTÃO, JUIZ CONVOCADO) DOUTOR EDILTON MEIRELES, NO PROCESSO N. 0033200-51.2005.5.05.0133 ACIP

Não há, em absoluto, como se acolher a preliminar de ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho, suscitada pela Ré, em sua Defesa.

Com efeito, sustenta a Du Pont do Brasil S/A, em apertada síntese, que a interpretação conjugada dos arts. 6e6, inciso VII, alínea "d", e 837, inciso III, ambos da Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, leva à conclusão de que a mencionada Carta conferiu ao Ministério Público do Trabalho da União a atribuição genérica para a defesa dos interesses individuais indisponíveis, bem assim, dos difusos e coletivos, limitando a do Ministério Público do Trabalho à defesa dos interesses coletivos, quando violados os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

Obtempera, outrossim, que os interesses tutelados na Ação Civil Pública ajuizada têm feição estritamente individual.

Razão, no entanto, não lhe assiste.

De plano, deve-se chamar a atenção para a circunstância de que a expressão "interesses coletivos" estampada no inciso III, do art. 83, da Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, refere-se aos interesses coletivos lato sensu, aí abrangidos os interesses difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos. É o que leciona Fábio Leal Cardoso8, com absoluta precisão:

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Há quem pense (...) que essa legitimidade do Ministério Público, em geral, não estaria afeta ao Ministério Público do Trabalho, pois no art. 83, III, da Lei Complementar n. 75/1993, (...) estaria prevista somente a defesa dos interesses coletivos.

Em verdade, a menção a interesses coletivos na norma citada deve ser lida como defesa de todas as espécies do gênero coletivos, ou seja, os que...

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