Segregação socioespacial e desigualdades em Salvador

AutorInaiá Maria Moreira de Carvalho - Gilberto Corso Pereira
CargoDoutora em Sociologia USP, Professora do Programa de Pós graduação em Políticas Sociais e Cidadania da Universidade Católica do Salvador e da Pós Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Humanidades dessa Universidade, do Observatório das Metrópoles e do CNPq. E mail...
Páginas5-22
Segregação socioespa cial e desiguladade em Salvador
Cadernos do CEAS, Salvador, n. 235, p. 5-22, 2015. 5
SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL E DESIGUALDADES EM SALVADOR
Socio-spatial segregation and inequalities, in Salvador
Resumo
Este Artigo discute a segregação socioespacial e a
segmentação urbana na cidade do Salvador, capital do
Estado da Bahia e terceira maior metrópole brasileira.
Destacando a relevância do tema e do chamado “efeito
território” para a produção e reprodução das desigualdades
urbanas, nas grandes cidades brasileiras, o Texto analisa os
padrões de diferenciação do território urbano, em Salvador
e suas articulações com as condições socioeconômicas e
raciais. Reporta-se às transformações ocorridas, mais
recentemente, na estrutura urbana da cidade e conclui
apontando seus impactos sobre as condições de vida e a
vulnerabilidade da população.
Palavras-chave: Segregação socioespacial. Efeito
território. Desigualdades urbanas. Salvador.
Este trabalho analisa o fenômeno da segregação socioespacial e a segmentação urbana a
partir de um estudo de caso sobre Salvador, que foi a primeira capital do Brasil e hoje constitui o
terceiro maior centro urbano do país com uma população de 2.776.607 habitantes, conforme o
Censo Demográfico de 2010.
O fenômeno da segregação, com a diferenciação dos espaços urbanos e seus impactos
sobre a vida dos moradores da cidade, vem sendo discutido desde os primórdios da Escola de
Chicago, considerada como o marco do nascimento da Sociologia Urbana. Abordando a
separação etnorracial e a realidade dos guetos negros, esses estudos se multiplicaram nos Estados
Unidos, levando à associação do fenômeno com a discriminação racial. Posteriormente, porém,
essas discussões chegaram à França e a outros países europeus, onde a segregação tem um caráter
socio-ocupacional. Com o avanço dos debates sobre o seu significado, intensidade,
Inaiá Maria Moreira de Carvalho
Doutora em Sociologia USP,
Professora do Programa de Pós-
graduação em Políticas Sociais e
Cidadania da Universidade Católica do
Salvador e da Pós-Graduação em
Ciências Sociais da Universidade
Federal da Bahia (UFBA). Pesquisadora
do Centro de Estudos e Pesquisas em
Humanidades dessa Universidade, do
Observatório das Metrópoles e do
CNPq. E-mail: inaiammc@ufba.br
Gilberto Corso Pereira
Doutor em Geografia, Professor dos
Programas de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo e em
Geografia da Universidade Federal da
Bahia. Pesquisador do CNPq e do
Observatório das Metrópoles. E-mail:
corso@ufba.br
Segregação socioespa cial e desiguladade em Salvador
Cadernos do CEAS, Salvador, n. 235, p. 5-22, 2015. 6
procedimentos de medida, determinantes raciais ou socioeconômicos e formas de manifestação,
esses estudos chegaram ao Brasil, nas últimas décadas, com pesquisas que evidenciam suas
características e seus impactos sobre o acesso da população aos serviços básicos, sobre a
obtenção de trabalho e renda, o acúmulo de capital cultural e social, a mobilidade urbana e a
exposição à criminalidade e à violência.
Tais pesquisas deixaram patente a relevância do chamado “efeito território” para a
conformação e reprodução das desigualdades urbanas nas grandes cidades brasileiras, a exemplo
de Salvador, em cujos primórdios já se encontrava uma separação no interior do domicílio e no
âmbito da edificação, com os escravos e agregados residindo quase sempre nos andares inferiores
dos sobrados das famílias mais abastadas. Em termos de inserção urbana os primeiros sinais do
fenômeno no espaço construído se manifestaram nas franjas da ocupação contínua, com as novas
moradias edificadas no final do século XIX para famílias ricas, partindo do então centro da
cidade, na direção sul (Campo Grande, Vitória e Graça) e, para as famílias pobres, na direção
norte (Lapinha, Soledade, Cidade Nova), como bem assinala Souza (2000).
Contudo, a apropriação diferenciada do espaço urbano, com seus impactos sobre as
desigualdades, vai-se intensificar e consolidar com o surgimento da Salvador moderna a partir
dos anos 1960, quando se incrementou a ocupação da orla pelas camadas de alta e média renda e
a concentração dos pobres nas áreas então distantes e desequipadas do Miolo, do Subúrbio
Ferroviário e dos limites da capital em Lauro de Freitas e Simões Filho, configurando um padrão
de desenvolvimento em torno de três grandes vetores: a Orla Atlântica como a “área nobre” da
cidade, local de moradia, serviços e lazer, onde se concentram a riqueza, os investimentos
públicos, os equipamentos urbanos e os interesses do capital imobiliário; o Miolo, localizado no
centro geográfico do município, que começou a ser ocupado com a implantação de conjuntos
residenciais para denominada “classe média baixa” na fase áurea do Sistema Financeiro de
Habitação, e que teve a sua expansão continuada por loteamentos populares e sucessivas invasões
coletivas, com uma disponibilidade de equipamentos e serviços bastante restrita; o Subúrbio
Ferroviário teve sua ocupação impulsionada inicialmente pela implantação da linha férrea ainda
no século XIX, passando a sediar loteamentos populares sem controles urbanísticos a partir de
1940, com as suas áreas livres sendo também invadidas. Com isso ele se transformou em um dos
espaços mais carentes e problemáticos da cidade, concentrando uma população bastante pobre e

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