Sartre: uma filosofia em defesa da liberdade e dos direitos do homem

AutorRoberto Carlos Favero
CargoDoutor em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Páginas19-37
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.15, n.2, p.19-37 Mai.-Ago. 2018
ISSN 1807-1384 DOI: 10.5007/1807-1384.2018v15n2p19
Artigo recebido em: 26/05/2017 Aceito em: 28/03/2018
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons
SARTRE: UMA FILOSOFIA EM DEFESA DA LIBERDADE E DA ÉTICA
Roberto Carlos Favero
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Resumo:
Este artigo visa mostrar a amplitude e as derivações do conceito de liberdade em
Jean-Paul Sartre (1905-1980). Nesse sentido, vem investigar, por meio de análise
bibliográfica, as condições de possibilidade de tal conceito como fundamento para um
compromisso ético-moral que se traduza em responsabilidade para com a sociedade.
É possível deduzir um compromisso ético-moral a partir da liberdade? A filosofia de
Sartre contempla uma visão humanista? Tal filosofia, a partir do eixo central de suas
concepções, entendido como liberdade, apresenta-se como práxis, processo de ação
e reflexão na história humana. Sartre, em defesa da filosofia do engajamento, enfatiza
a importância de o homem se entregar à ação prática para alargar os horizontes
possíveis de cada ser humano livre. Para Sartre, a liberdade é a condição própria do
homem e tem por base a atitude de compromisso.
Palavras-chave: Liberdade. Ética. Compromisso.
1 INTRODUÇÃO
Talvez se tenha tornado comum afirmar que o homem vive e respira uma
cultura, fortemente, individualista. Hoje, alimenta-se e se fortalece um império
consumista que o homem ocidental vive na sociedade capitalista e hedonista. A
civilização contemporânea construiu um ideário de convivência social com base na
competição. Logo, o ser humano vê somente vantagens em competir e nenhuma
vantagem em cooperar, em envolver-se, deixando de desenvolver, desse modo, um
engajamento coletivo, o que lhe dá a falsa impressão de que cada um se basta.
E se cada um se basta, o homem está liberado para ser, pensar e agir
deliberadamente, sem medir quaisquer consequências que possam envolver ou
atingir os outros. Nesse cenário, parece não existir dúvidas de que estão todos na
mesma condição de vítimas da fragilidade do laço social. Seria legítimo, então,
perguntar: que papel poderia ser desempenhado pelo homem para reverter tal
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Doutor em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Professor titular da Faculdade
Murialdo, Caxias do Sul, RS, Brasil. E-mail: robertocarlosfavero@yahoo.com .br
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cenário? Como é possível ajudar a compreender e a superar os desafios que se
impõem? Para responder a essas perguntas, recorre-se ao filósofo contemporâneo
Jean-Paul Sartre (1905-1980).
O presente artigo visa investigar a amplitude do conceito de liberdade de Jean-
Paul Sartre
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, sendo que esta implica um comprometimento com as causas histórico-
sociais que afetam a humanidade. Sobretudo, se é possível sustentar que do conceito
de liberdade sartreana deriva um compromisso ético-moral de responsabilidade para
com a sociedade. Para analisar tal problemática, buscar-se-á a resposta, sobretudo,
na principal obra de Sartre, O Ser e o Nada (1943), além de se dialogar com alguns
dos comentaristas mais importantes do pensamento sartreano, como Paulo Perdigão
que em sua obra Existência e Liberdade: uma introdução à filosofia de Sartre, assinala
um lugar importante na compreensão do pensamento de Sartre. Como também, se
fundamenta a análise, a seguir, no trabalho de Yvan Salzmann e sua obra Sartre et l
Authenticité: vers une éthique de la bienveillance réciproque.
A ética pode ser simplesmente impossível se a liberdade, fonte de todos os
valores, recusar a fraternidade. Logo, faz-se necessário compreender a
intersubjetividade como relação processual voltada para o compromisso do ser-para-
outro. Os fundamentos propostos por Sartre, na construção de um mundo melhor,
exigem uma moral da autenticidade e da reciprocidade humana atenta à
complexidade da existência, atravessada pela contingência e pela liberdade,
reivindicando a existência de uma nova lógica, diferente daquela quantitativa e
mercantilista que o homem está, hoje, vivenciando. Trata-se de uma lógica qualitativa
em que o ser humano possa ser respeitado e tenha condições de viver dignamente.
Sartre deixou este grande desafio: que é possível, portanto, não só pensar
diferentemente o ser humano, mas pensar um homem novo e, consequentemente,
repensar a ética atual. O projeto ético assenta-se e, sobretudo, está ligado à liberdade
e ao fazer responsável, a fim de superar as idiossincrasias da má-fé e outros
comportamentos que revelam a injustiça e a falta de compromisso do ser humano.
Portanto, o elogio mais completo que se pode fazer a um pensador como Sartre
consiste em dizer que ele soube assumir e levar às suas consequências mais
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SARTRE, Jean-Paul. O Ser e o Nada - Ensaio de Ontologia Fenomenológica. Trad. Paulo Perdigão.
17ªed. Rio de Janeiro: Vozes, 2009. No original, SARTRE, Jean -Paul. L’Être et le Néant. Paris:
Gallimard, 1948. Todas as citações foram feitas consultando a edição francesa, com apoio da tradução
portuguesa, modificando esta quando necessário segundo melhor juízo.

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