Sartre e a psicanálise

AutorRafael Raffaelli
Páginas322-328

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As relações* entre Sartre e a psicanálise são ambivalentes, pois se de um lado existe uma aporia entre as noções de consciência fenomenológica e inconsciente psicanalítico, por outro lado ambas trabalham dentro de um viés interpretativo na busca de significações.

E, embora tenha criticado as teorias psicanalíticas, o interesse pessoal de Sartre por Freud e pela história da psicanálise é patente em seu alentado e minucioso roteiro para o filme de John Huston, Freud Além da Alma. (SARTRE, 1986)

Para Hyppolite (1971, p.41), Sartre corrigiu a linguagem freudiana positivista através da “psicanálise existencial”, que evita o emprego de metáforas energéticas. Em suma, o erro de Freud seria não distinguir com clareza método e doutrina. Diz ele: “Sartre critica Freud por partir de tendências empíricas, de um dado empírico - em particular a sexualidade. Mas Sartre o substitui por uma liberdade radical pela qual fazemos de nós um ser-no-mundo”.

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Segundo Sartre, os processos empíricos e analíticos são insuficientes para delimitar uma psicologia, devendo-se recorrer também às ferramentas heurísticas de Husserl, a indispensável epoché que coloca o mundo entre parênteses. Pois a tarefa da psicologia, como as demais ciências humanas, não é a análise fatual, mas a interpretação de significados. Para ele, o principal mérito da fenomenologia foi rejeitar os pressupostos empíricos da psicologia tradicional, reivindicando a autonomia do método psicológico em relação às ciências naturais. Assim sendo, rejeitou o p ost u la do r educ ioni st a , a fir ma ndo que os fenômenos psicológicos possuem uma independência em r elação a os fenômenos físicos. (Cf. MORAVIA, 1985, pp.18-19)

Todavia, Sartre reconhece a origem comum da abordagem psicanalítica e da fenomenológica-existencial:

Una sola escuela ha partido de la mesma evidencia originaria que nosotros: la escuela freudiana. Para Freud, como para nosotros, um acto no puede limitarse a sí mismo: remite inmediatamente a estructuras más profundas. Y el psicoanálisis es el método que permite explicitar esas estructuras. Freud se pregunta, como nosotros, en qué condiciones es posible que una determinada persona haya realizado tal o cual acción particular? Y, como nosotros, se niega a interpretar la acción por el momento antecedente, es dicir, a concebir un determinismo psíquico horizontal. El acto le parece simbólico, es dicir, le parece traducir un deseo más profundo, que no podría ser interpretado a su vez sino partiendo de una determinación inicial de la libido del sujeto. Ahora bien, Freud procura constituir así un determinismo vertical. Además, por este sesgo, su concepción remitirá necesariamente al pasado del sujeto. (...) En consecuencia, la dimensión del futuro no existe para el psicoanálisis. La realidad humana pierde uno de sus ék-stasis y debe interpretarse únicamente por una regresión hasta el pasado partiendo del presente. (...)

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Así, nos hemos de limitar a inspirarnos en el método...

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