Rugoscopia palatina

AutorGraziela Santos de Oliveira/Jeidson Antonio Morais Marques
Páginas213-226

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Introdução

Etimologicamente, a palavra rugoscopia vem do grego "rughos", que significa rugosidade e "skopein", que significa observação ou exame.

A Rugoscopia Palatina ou Palatoscopia é o processo pelo qual se pode obter a identificação humana.1 É considerada um meio auxiliar ou secundário de identificação, pois universalmente os métodos primários de identificação humana são, sem prioridade: Datiloscopia (Papiloscopia), Arcada Dentária e o estudo do DNA, assim como a Interpol preconiza.

A identificação, por sua vez, é o processo pelo qual se determina a identidade de uma pessoa ou de uma coisa, ou seja, um conjunto de procedimentos e diligências cuja finalidade é levantar uma identidade.2

Um processo de identificação é considerado aplicável quando preenche os cinco requisitos necessários, sendo três biológicos (unicidade/individualidade, imutabilidade e perenidade) e dois técnicos (praticabilidade e classificabilidade).3

A unicidade/individualidade é o requisito que corresponde os elementos específicos de um indivíduo e diferentes dos demais. A imutabilidade baseia-se nas características que não mudam e não se alteram ao longo do tempo. Por sua vez, a perenidade, também biológico, consiste na capacidade de elementos resistirem à ação do tempo e permanecerem até depois da morte.

Tecnicamente, a praticabilidade é um processo que não é complexo, seja na sua obtenção ou no registro dos caracteres. E por último, a classificabilidade é o requisito que possibilita uma certa metodologia no arquivamento dos dados obtidos, bem como rapidez e facilidade na busca dos registros.1

Considerada uma identificação odontológica, a Rugoscopia Palatina tem por base a análise das cristas, dobras ou pregas encontradas na abóbada palatina,4 importante em casos que os métodos primários são limitados ou impossibilitados de alguma forma. Sendo sua base na comparação de registros ante mortem com os registros post mortem, o que proporciona para o perito odontolegista características suficientes para identificar um indivíduo.5

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Estudando a histologia, as rugas palatinas são formadas no terceiro mês de vida intrauterina e originadas do tecido conjuntivo denso da submucosa, fibroso e são recobertas pelo epitélio estratificado.6 Elas permanecem invariáveis durante toda a vida do indivíduo e persistindo vários dias após a morte7, sendo possível o seu uso para identificar, uma vez tendo os registros em vivo, assim como qualquer método de identificação.

A sua localização anatômica é na mucosa do palato duro, da cavidade bucal, tendo a rafe palatina como um sulco ântero-posterior e central (correspondente a soldadura das duas porções da maxila), e como limite o conjunto de cristas lineares8 dispostas assimetricamente — mais ou menos perpendiculares ou oblíquas em relação a rafe — o que as diferencia de outras espécies de mamíferos7 e variando de 3 a 5 para cada lado.9 A visibilidade das rugas palatinas é possível porque a mucosa que reveste o palato é extremamente fina e diante disso reproduz as rugosidades ósseas das apófises palatinas dos maxilares superiores (figura 1).10

As rugosidades estão protegidas de traumas por sua posição no interior da cabeça e do calor através da língua e a almofada de gordura bucal.8 Pelo reco-brimento de estruturas dentárias e esqueléticas, o palato duro — onde estão as rugas — apresenta maior resistência à ação destrutiva ou em menor acentuação, em relação a doenças e agressões químicas, quando observadas e comparadas com outros tecidos moles.8,9 Por esses motivos, é de grande valia seu uso no processo de identificação humana, por exemplo, em acidentes em que não há possibilidade de análise das falanges (datiloscopia), seja por carbonização, ou situações de desarticulações e amputações, quando a cabeça se encontra separada do tronco.4,10

Diante de uma ação com fogo há transformações nos dentes, ossos, músculos da cavidade bucal e nos materiais odontológicos utilizados. Primeiramente, a boca se fecha e trava, protegendo assim os tecidos internos e a língua se entumece e também protege o palato. Sendo assim, as papilas palatinas ficam protegidas e conservadas a sua morfologia anátomo-macroscópica.11

As funções das rugosidades palatinas estão em facilitar o transporte dos alimentos, auxiliar na função de mastigação, na percepção gustativa e tátil e fonação, além de reter a saliva e proteger a mucosa do palato de traumatismos gerados por alimentos duros ou fibrosos12.

Martins Filho (2006)13, em sua dissertação, resume pesquisas de alguns autores sobre as rugas palatinas. Afirma que não há dois palatos com a mesma configuração, o que os torna individuais, e nem há mudanças durante o crescimento e desenvolvimento do palato, apenas de tamanho. Acrescenta ainda que em estudos com gêmeos apresentam padrões similares, mas não idênticos.

A Rugoscopia Palatina estuda as rugas palatinas em forma, tamanho e posição, sendo possível sua aplicação tanto no cadáver recente, como no indivíduo

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vivo,7, 8,9 assim como em indivíduos edêntulos ou cadáveres radicalmente comprometidos.14

O conjunto de rugas palatinas apresenta grandes variabilidades de comprimento, podendo ser únicas ou ramificadas, retilíneas, curvilíneas, angulosas ou sinuosas10 e possuem características de um parâmetro ideal de identificação forense.8 Normalmente, o conjunto fica aquém da metade anterior do palato duro e as rugas anteriores geralmente são mais proeminentes que as posteriores e as últimas nunca cruzam a linha média.15 Outros autores, em seus estudos, concluíram que no sexo masculino há um número ligeiramente maior de rugas quando comparado ao sexo feminino, e ainda um número maior de rugas do lado esquerdo do que do lado direito.12

Classificação das rugas palatinas

Ê notável nas referências que não há unanimidade em relação à descrição histórica das rugas palatinas. Alguns autores citam que a sua história data desde 1753, quando foram descritas pela primeira vez por Winslow, mas, para fins de estudo da anatomia palatina, citam que foi Kuppler em 1897 quem quis identificar características anatômicas raciais.16 Em relação à identificação pessoal elas foram sugeridas primeiramente por Allen no ano de 1889.8

Arbens10 descreveu em sua obra de 1988 que as primeiras investigações sobre as rugas foram realizadas na Argentina no ano de 1916 por Carrea, seguido de Lopes de Léon (1922) e Trobo Hermosa (1932), sendo que Léon foi o primeiro a apresentar uma classificação para as rugas palatinas.

Portanto, é encontrado na literatura que o primeiro sistema de classificação das rugas palatinas foi desenvolvido por Goria em 1911. A sistematização foi feita especificando: 1) o número de rugas e 2) a extensão da ruga em relação aos dentes. As rugas em forma de letra V ou Y foram contadas como uma apenas.17

A classificação por León agrupou as rugas em simples e compostas, sendo que estas resultam da combinação de duas ou mais papilas simples.13 As papilas simples estão associadas a algarismos de 1 a 5 sendo: 1 — reta, 2 — curva, 3 — ângulo, 4 — círculo e 5 — sinuosa. Já as papilas compostas são associadas à combinação das papilas simples, por exemplo: 14 — uma papila reta e uma em forma de círculo (figura 2). Acresentou para seu sistema a classificação biotipológica e classificou os indivíduos de acordo com seu temperamento, sendo: bilioso (B), sanguíneo (S), linfático (L) e nervoso (N).

Trobo Hermosa também classificou as rugas palatinas em grupos: Simples — descritas com letras maiúsculas — de acordo com sua forma — de 'A' a 'F', e; Composta — que resulta da união de duas ou mais rugas — representada pela letra 'X'.5,9No grupo das rugas simples temos: ponto (A), reta (B), curva (C), angulosa

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(D), sinuosa (E) e circular (F) — ver tabela 1. O rugograma é iniciado com as rugas principais, dispostas mais próximas da rafe palatina, indicadas com letra maiúscula e separadas por dois pontos (:). Já as rugas derivadas (das principais) são descritas com letras minúsculas e separadas entre si por um ponto (.), sendo iniciada a análise primeiramente do lado direito.18

Luís da Silva (1934) se baseou no sistema de Lopez de Léon, acrescentando o ponto à lista das papilas simples, o que o considerou a "linha mais simples" e deu a esta o número 6 (seis). As demais formas: reta, curva, angulosa, circular e ondulada são numeradas do número 1 ao 5, respectivamente (ver tabela 2). As rugas chamadas de compostas são a soma das simples encontradas.18 Esta classificação é considerada complexa e de difícil uso.

Logo depois, o pesquisador argentino Ubaldo Carrea, em 1937 (figura 3), aprofundou os estudos das rugosidades e estabeleceu os critérios da rugoestenografia palatal. A sistematização das rugosidades palatinas de Carrea se dá em quatro categorias distintas de...

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