Relações de gênero em ruanda no período pós-genocídio: mudanças de fato?

AutorCamila Soares Lippi
Páginas281-304
RELAÇÕES DE GÊNERO EM RUANDA NO PERÍODO
PÓS-GENOCÍDIO: MUDANÇAS DE FATO?
GENDER RELATIONS IN RWANDA ON THE
POST-GENOCIDE PERIOD: REAL CHANGES?
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
Camila Soares Lipp
Bacharel e Mestre em Direito pela UFRJ. Bacharel em Relações Internacionais pelo
Centro Universitário Metodista Bennett. Pesquisadora do Laboratório de Direitos
Humanos (LADIH) da UFRJ. Advogada. E-mail: camilalippi@gmail.com
Resumo
Parte-se, neste trabalho dos seguintes problemas: quais foram as
transformações das relações de gênero em Ruanda na sociedade pós-
genocídio? Houve mudanças de fato no exercício de direitos pelas
mulheres, ou elas permaneceram no plano formal? A hipótese é a de
que, se houve mudanças nas relações de gênero no pós-genocídio,
elas ocorreram apenas no plano formal, não havendo mudanças de
fato, dado que as mudanças partiram do governo, sem participação da
sociedade civil organizada.
Palavras-chave: Gênero, Ruanda, Sociedade Civil.
Abstract
The points of departure of this article are the following questions: which
were the transformations of gender relations in the post-genocide
Rwanda? Were there real changes on the exercise of rights by
Rwandese women, or did those changes stayed on the formal sphere?
The hypothesis is that, if there were real change in gender relations after
the genocide, they occurred only on the formal sphere, not real changes,
due to the fact that those changes were imposed by the government,
with participation of civil society.
Keywords: Gender, Rwanda, Civil Society.
Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 13, n. 13, p. 281-304, janeiro/junho de 2013.
CAMILA SOARES LIPP 282
INTRODUÇÃO
Este trabalho se insere num tema mais geral, que será abordado pela autora
em sua dissertação a ser defendida no mestrado do Programa de Pós-Graduação em
Direito da UFRJ, qual seja: a jurisprudência do Tribunal Penal Internacional para
Ruanda (TPIR) sob uma perspectiva de gênero. Para entender o tema, é importante ter
uma ampla compreensão das relações de gênero em Ruanda, objetivo do trabalho aqui
proposto.
Tendo isso em mente, parte-se dos seguintes problemas: quais foram as
transformações das relações de gênero em Ruanda na sociedade pós-genocídio?
Houve mudanças de fato no exercício de direitos pelas mulheres, ou elas
permaneceram no plano formal?
A hipótese é a de que, se houve mudanças nas relações de gênero no pós-
genocídio, elas ocorreram apenas no plano formal, não havendo mudanças de fato,
dado que as mudanças partiram do governo, sem participação da sociedade civil
organizada.
Os objetivos da pesquisa empreendida eram: verificar se houve de fato
mudanças na efetivação dos direitos das mulheres em Ruanda no período pós-
genocídio; analisar os relatórios dos órgãos internacionais sobre o assunto; contribuir
para a produção de estudos africanos no Brasil; entender o genocídio em Ruanda;
verificar a efetivação dos direitos das mulheres em Ruanda em face dos tratados
internacionais de direitos das mulheres; analisar as relações de gênero em Ruanda
atualmente.
O trabalho se justifica pelo fato de o conflito de Ruanda ter sido esquecido pela
mídia, pela academia e pelas organizações internacionais, sendo importante
compreender as transformações que ocasionou na sociedade ruandesa. Além disso, a
marginalização da África no contexto internacional faz com que haja pouca produção
bibliográfica sobre o assunto.
Quanto ao marco teórico, a pesquisa parte da teoria feminista do Direito,
trabalhando-se com seus conceitos chaves, como gênero (diferenças construídas
social e culturalmente em torno do sexo biológico das pessoas) e de patriarcado (aqui
entendido como uma forma de opressão que expressa a interseção entre raça, classe,
gênero e orientação sexual, e não englobando apenas a dominação de homens contra
mulheres) (VAN MARLE; BONTHUYS 2007, p. 21).
Além disso, compartilha-se aqui da visão de Nancy Fraser de gênero enquanto
categoria bi-dimensional. Com isso, Fraser se refere a injustiças com raízes tanto na
estrutura econômica da sociedade quanto em questões relativas a status social, de
forma que os problemas de redistribuição e de reconhecimento afetam uns aos outros,
sendo ambos primários e co-originais (FRASER, 2003, p. 19).
A metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica, em conjunto com pesquisa
documental, em relatórios de organizações internacionais e em tratados internacionais
de direitos das mulheres. Além disso, este trabalho também foi realizado de forma
interdisciplinar nas áreas de Direito, Antropologia e Ciência Política.
Em primeiro lugar, serão analisadas as relações de gênero em Ruanda antes
do genocídio de 1994. Em seguida, esse fato, que provocou uma ruptura na vida política
do país, é estudado, sendo analisados também a intervenção humanitária da ONU
Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, Curitiba, v. 13, n. 13, p. 281-304, janeiro/junho de 2013.

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