Honorários Advocatícios no Processo do Trabalho

AutorCleber Lúcio de Almeida
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho do TRT da 3ª Região. Doutor em Direito Processual Civil (UFMG)
Páginas397-414

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Introdução

O exercício do direito de acesso à justiça implica custos, dentre os quais os relativos aos honorários do advogado que representar a parte no processo (art. 20 do Código de Processo Civil – CPC). De outro lado, o inadimplemento de uma obrigação gera o dever de indenizar as perdas e danos dele decorrentes, abrangendo a indenização os honorários advocatícios (art. 389 do Código Civil – CC).

Como dos advogados que militam na Justiça do Trabalho não pode ser exigida a renúncia à remuneração dos seus serviços, vedando o art. 658 do CC, inclusive, a presunção de gratuidade do mandato quando o seu objeto corresponder ao daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa, e o inadimplemento de obrigação resultante da relação de trabalho gera a obrigação de indenizar as perdas e danos dele decorrentes1, a problemática da responsabilidade pelos honorários advocatícios tem reflexos no processo do trabalho.

O presente ensaio externa algumas das inquietações que a questão suscita e será dividido em sete partes. Na primeira, trataremos dos honorários advocatícios sucumbenciais. A segunda, é reservada ao exame dos honorários advocatícios indenizatórios (que a doutrina e a jurisprudência denomina honorários advocatícios contratuais). Na terceira, são apontadas as diferenças entre honorários advocatícios sucumbenciais e indenizatórios e examinada a possibilidade de sua cumulação. Na quarta, é analisada a disciplina que a Lei n. 5.584/1970 reservou aos honorários advocatícios sucumbenciais, considerando-a, inclusive, à luz da evolução experimentada pelo direito processual comum no que comporta aos honorários sucumbenciais. Na quinta, é registrada a evolução da jurisprudência sumulada do TST a respeito dos honorários advocatícios sucumbenciais e realizada a sua análise crítica. Na sexta, é examinada a possibilidade de condenar o vencido nos honorários advocatícios indenizatórios no processo do trabalho. Na sétima, são tecidas breves considerações sobre o Projeto de Lei n. 3.392, de 2004, aprovado pela Câmara dos Deputados e que aguarda exame pelo Senado. Ao final, são apresentadas as nossas conclusões.

1. Honorários advocatícios sucumbenciais

O CPC trata de honorários advocatícios devidos em razão da necessidade de recorrer ao processo para a satisfação de direitos não atuados espontaneamente, estabelecendo, no art. 20, caput e § 3º, que

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a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor os honorários advocatícios2.

A condenação ao pagamento destes honorários advocatícios decorre, como permite afirmar o art. 20 do CPC, do fato sucumbência. Tal solução é justificada, consoante Giuseppe Chiovenda, pela exigência de que a atuação da lei não represente “diminuição patrimonial para a parte em favor da qual é realizada”3, o que conduz à conclusão de que os custos do processo devem ser suportados pela parte responsável pelo ajuizamento da demanda.

No entanto, a sucumbência, no sentido de derrota na demanda, não é condição indispensável para que à parte seja condenada ao pagamento de honorários advocatícios4. O princípio da sucumbência (a parte vencida na demanda deve suportar os custos do processo) é uma manifestação do princípio da causalidade (a parte que deu causa ao processo deve suportar os seus custos). A sucumbência constitui, portanto, apenas um indicativo da responsabilidade pelo ajuizamento da demanda.

Assim, no processo civil, considerada a questão à luz do art. 20 do CPC, quem deu causa ao ajuizamento da demanda deve suportar os custos do processo, dentre os quais os relativos aos honorários advocatícios.

Estes são os honorários advocatícios sucumbenciais, denominação que é aqui adotada, mas entendendo-se por sucumbente a parte que deve su-portar os ônus do processo, por ter dado causa ao ajuizamento da demanda5.

2. Honorários advocatícios indenizatórios

O CC disciplina as consequências do inadimplemento das obrigações nos arts. 389 a 420 e define a regra básica regente da matéria nos seguintes termos: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado” (art. 389).

O CC equipara ao inadimplemento a mora do devedor, estabelecendo que se considera em mora o devedor que não efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma devidos (art. 394) e que “responde o devedor pelos prejuízos a que a sua mora der causa, mais juros e atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado” (art. 395).

O CC ainda dispõe, no art. 404, que “as perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional”.

Destarte, ao inadimplemento (não cumprimento da obrigação) e à mora (ausência de cumprimento da obrigação no tempo, lugar e forma devidos) é relacionada uma pena de natureza civil, qual seja o dever de indenizar o credor pelas perdas e danos por ele sofridas, o que abrange os honorários que pagou ao advogado que a representou no processo.

A hipótese é de responsabilidade contratual, cuja configuração pressupõe uma relação jurídica válida previamente estabelecida, obrigação inadimplida por ato imputável ao devedor e o dano decorrente do inadimplemento da obrigação (no casos dos honorários, o danos corresponde ao valor que a parte comprovadamente pagou ao advogado que a representou no processo6).

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Aqui não se trata de honorários advocatícios devidos em razão do processo e da responsabilidade pelo ajuizamento da demanda (honorários advocatícios sucumbenciais), mas de indenização de perdas e danos resultantes do inadimplemento de obrigação ou da mora no seu cumprimento, que abrange os honorários advocatícios pagos pelo credor ao advogado por ele contratado, isto é, de honorários advocatícios indenizatórios ou contratuais.

3. Distinção entre honorários advocatícios sucumbenciais e indenizatórios e possibilidade de sua cumulação

Centrando a atenção na distinção entre honorários advocatícios sucumbenciais e indenizatórios, cumpre observar que:

  1. a condenação no pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais decorre da aplicação do princípio da causalidade: quem deu causa ao ajuizamento da demanda responde pelos custos do processo respectivo, dentre os quais os relativos aos honorários advocatícios. Trata-se, portanto, da obrigação de remunerar os serviços do advogado que representou a parte em juízo, isto é, de obrigação que surge em razão da responsabilidade pelo ajuizamento de uma concreta demanda;

  2. a condenação no pagamento de honorários advocatícios indenizatórios decorre da aplicação do princípio da responsabilidade contratual: o inadimplemento e a mora no cumprimento de uma obrigação geram para o devedor o dever de indenizar os danos sofridos pelo credor, o que abrange os honorários advocatícios. A hipótese é de dever que surge antes e independentemente de qualquer processo: o inadimplemento ou a mora faz surgir o dever de indenizar, ou, dito de outra forma, o descumprimento do dever positivo de adimplir constitui, em si mesmo, fonte do dever de indenizar, no caso de ser proposta demanda visando a satisfação do direito não atuado espontaneamente ou oportunamente. Trata-se, assim, de obrigação pré-processual, que tem origem no direito material e não se relaciona com os deveres das partes em um concreto processo (o art. 20, que trata dos honorários de sucumbência, está localizado no Capítulo II do CPC, que disciplina os deveres das partes do processo judicial, o que significa que o pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais é um dever que surge no e em razão do processo)7;

  3. os honorários advocatícios sucumbenciais pertencem ao advogado (art. 22 da Lei n.
    8.906/1994) e a condenação ao seu pagamento não depende de pedido (consoante prevê o art. 20 do CPC, a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor os honorários advocatícios);

  4. por força da sua natureza indenizatória, os honorários advocatícios indenizatórios pertencem à parte8. A natureza indenizatórias desses honorários impede o seu deferimento de ofício, cabendo ao autor da demanda requerer a condenação da parte contrária ao seu pagamento. O juiz não pode deferir indenização que não foi requerida (arts. , 128 e 460 do CPC e art. 832 da CLT)9;

  5. é lícita a cumulação da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais e indenizatórios, por força da diver-sidade dos seus fundamentos (causalidade da demanda e responsabilidade contratual, respectivamente) e destinatários (advogado e parte, respectivamente). Descumprida a obrigação ou verificada a mora no seu cumprimento, surge, para o devedor, o dever de reparar os danos sofridos pelo credor, inclu-

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sive aqueles representados pelos gastos com a contratação de advogado para efeito de satisfação de seu crédito (parte do patrimônio do credor é revertida ao advogado por ele contratado e esta perda deve ser reparada pelo devedor). Ajuizada demanda pelo credor contra o devedor, deverá este, além de reparar os danos causados àquele (incluídos os gastos com advogado – honorários advocatícios indenizatórios), arcar com os custos do processo a que o seu comportamento deu causa, incluídos os honorários advocatícios (honorários...

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