Revendo as noções de periferia a partir do seu cinema

AutorGustavo Souza
CargoDoutorando em Ciências da Comunicação pela ECA/USP. Mestre em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ
Páginas178-197
Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.11, n.98, p. 178-197, jan/jun. 2010
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Revendo as noções de periferia a partir do seu cinema
Reviewing the concepts of periphery through its cinema
Gustavo Souza1
RESUMO
A partir da análise dos componentes discursivos e estéticos de alguns documentários
do dito cinema de periferia, este trabalho quer debater em que medidas esta produção
contribui para propor outros imaginários sobre os espaços periféricos. Um fecundo
ponto de partida é a discussão sobre as categorias conexas de pobreza, marginalidade,
exclusão e periferia, utilizadas para qualificar o tipo de cinema aqui em análise. Tal
escolha nos leva a estabelecer uma conexão com estudos das ciências sociais que
vêm se ocupando em apreender os componentes de tais categorias, emprestando a
este texto um caráter interdisciplinar entre cinema e sociologia urbana.
Palavras-chave: Cinema. Documentário. Marginalidade. Heterogeneidade periférica.
ABSTRACT
This paper discuss how the production of the documentary film periphery, through the
analysis of discursive and aesthetic components, contribute to propose other imaginary
about the peripheral areas. A fruitful starting point is the discussion of the related
categories like poverty, marginality, exclusion and periphery, used to classify the film
under review. This option will lead us to establish a connection with studies of the social
sciences that have been concerned to grasp the aspects that make up these categories,
leading the text to an interdisciplinary approach between cinema and urban sociology.
Key words: Cinema. Documentary. Marginality. Heterogeneity of the periphery.
1 Doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA/USP. Mestre em Comunicação e Cultura pela
ECO/UFRJ. Formado em Comunicação Social pela UFPE. Organizou, em parceria com Esther
Hamburger e Tunico Amâncio, o IX Estudos de Cinema Socine (Annablume, 2008); e o X Estudos de
Cinema Socine (e-book, 2009), em parceria com Mariarosaria Fabris, Rogério Ferraraz e Gelson
Santana. gustavo03@uol.com.br
Cad. de Pesq. Interdisc. em Ci-s. Hum-s., Florianópolis, v.11, n.98, p. 178-197, jan/jun. 2010
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1 INTRODUÇÃO
No período que vai do final dos anos 1990 ao início dos anos 2000, o cinema
brasileiro conheceu novos itinerários. O grande crescimento da produção viu-se
acompanhado de um significativo aumento na visibilidade dos filmes, com exibições,
não somente em festivais ou mostras, mas também em salas do circuito comercial.
Nessa expansão da produção nacional, moradores de subúrbios, morros e periferias
começaram a experimentar outra forma de contar histórias: a partir de filmes realizados
em oficinas de cinema e audiovisual espalhadas por diversas cidades brasileiras. Hoje
a compreensão sobre o potencial das imagens e a utilização delas faz com que o
periférico passe de personagem que por décadas c ausou (e ainda causa, de certo
modo) um intenso fascínio entre documentaristas a realizador, contador de suas
próprias histórias.
Nesse horizonte, atentar para as imagens e os enunciados que esses novos
sujeitos do discurso engendram torna-se uma importante tarefa a ser executada. Para
não correr o risco de uma abordagem global e talvez superficial dos resultados das
oficinas, concentro as atenções, neste texto, em documentários que procuram retratar o
cotidiano de bairros periféricos de grandes centros urbanos. Tais filmes encaminham o
debate para a reformulação de imagens e imaginários s obre a periferia ao observar sua
composição e funcionamento de modo singular e heterogêneo.
O cinema realizado em periferias, favelas e subúrbios apresenta como
característica notória a revelação de situações, contextos e problemáticas recorrentes
ao modo de vida e às experiências de moradores de tais localidades. Este aspecto
demasiadamente amplo exige a investigação de alguns dos vários componentes
abrigados sob o termo guarda-chuva que se tornou o cinema de periferia. Amplo e
heterogêneo, ele é atravessado por temas, narrativas, opções estéticas e formatos
audiovisuais bastante distintos. Compreender esse universo repleto de especificidades
é uma tarefa essencial, especialmente quando se buscam nos filmes as indicações que
vão compor o debate. Um fecundo ponto de partida é a discussão sobre as categorias

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