Retomando a polêmica em torno da ação: apontamentos compreensivos a uma disputa terminológica

AutorLucas Buril de Macêdo, Maurício Schibuola
Páginas214-266
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP.
Rio de Janeiro. Ano 12. Volume 19. Número 1. Janeiro a Abril de 2018
Periódico Quadrimestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira (in mem.). ISSN 1982-7636. pp. 214-266
www.redp.uerj.br
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RETOMANDO A POLÊMICA EM TORNO DA AÇÃO: APONTAMENTOS
COMPREENSIVOS A UMA DISPUTA TERMINOLÓGICA1
GETTING BACK THE CONTROVERSY AROUND THE ACTION:
COMPREHENSIVE APPOINTMENTS TO A TERMINOLOGICAL DISPUTE
Lucas Buril de Macêdo
Doutorando em Direito Processual pela Universidade de São
Paulo (USP). Mestre em Direito pela Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE). Graduado em Bacharelado em Direito
pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).
Professor de Direito Processual Civil. Membro da Associação
Norte e Nordeste de Professores de Processo (ANNEP).
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP).
Advogado em Pernambuco. lucasburilmb@gmail.com
Maurício Schibuola de Carvalho
Graduado em Direito pela Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE). Pós Graduando em Direito Processual
Civil Contemporâneo pela Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE). Advogado em Pernambuco.
mau0309@gmail.com
RESUMO: A proposta deste texto é, a partir de uma perspectiva compreensiva,
demonstrar que alguma razão nas várias linhas conceituais em torno da ação.
Basicamente, o intuito é provar que cada um dos célebres empregos do vocábulo ação
tentou descrever um fenômeno jurídico diferente, pelo que, ao contrário de serem conceitos
incompatíveis e excludentes, eles devem conviver e se complementar para uma percepção
total da problemática jurídica. Todavia, certamente convém, por precisão terminológica e
para evitar ambiguidades, a seleção de termos distintos para designar cada um dos objetos
conceituais.
1 Artigo recebido em 15/11/2017 e aprovado em 21/03/2018.
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PALAVRAS-CHAVE: Ação. Actio. Ação Material. Ação Processual. Polêmica.
ABSTRACT: The proposal of this text is, from a comprehensive perspective, to
demonstrate that there is some reason in the various conceptual lines around the action.
Essentially, the intent is to demonstrate that each of the word “action” famous uses tried to
describe a different juridical phenom, whereby, instead of being incompatible concepts
which exclude each other, the ideas should be used together to complement each other for
a complete perception of the legal problem. However, certainly the most adequate is the
selection of different terms to designate each of the conceptual objects, as a requirement of
terminological precision and to avoid ambiguities.
KEYWORDS: Action. Actio. Action in substantial law sense. Action in procedural law
sense. Controversy.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. A Disputa em torno da Ação na formação da ciência
processual; 3. O que é uma Ação; 3.1. Prolegômenos; 3.2. A Ação Material; 3.3. A Ação
Concreta; 3.4. O Direito de Ação; 3.5. A Ação Eclética; 4. Ações e a Polêmica sobre a Ação
Um Conflito Terminológico sobre vários conceitos.
1. Introdução
Há cerca de dois séculos, é assunto recorrente na doutrina o estudo da teoria da ação,
objeto de relevantíssimos escritos com as mais diversas perspectivas, que têm como marco
a antiga polêmica entre WINDSCHEID e MÜTHER. Normalmente, vê-se nos textos sobre
ação, sejam aqueles que têm uma pretensão propositiva ou nos que abordam o tema de
modo meramente descritivo ou didático, várias linhas dedicadas à polêmica quanto ao
verdadeiro significado deste conceito, que tem suma relevância para a ciência processual
chegando parcela da doutrina a apontar ser ele o responsável pelo próprio nascimento do
direito processual como objeto de conhecimento autônomo.
Porém, a problemática que circunda a ação foi bem mais além das ideias sustentadas
na famosa (primeira) polêmica; a famosa disputa em torno do conceito de ação foi
sucedida de tantas outras, com quase tantos conceitos quantos são os autores que
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dedicaram páginas ao assunto.2 Não foram poucos os juristas que dedicaram esforços para
responder à tormentosa questão: o que é uma ação?
Todavia, como se costuma repetir, o interesse pelo estudo detido deste tema iniciou-
se a partir da publicação do livro “A Ação do Direito Civil Romano do Ponto de Vista do
Direito Atual” por BERNHARD WINDSCHEID, em 1856, que daria vida ao exaltado debate
com THEODOR MÜTHER. Ambos os juristas germânicos escreveram textos que, talvez de
um modo que não pudessem prever, marcaram vivamente a história da ciência processual,
e o protagonista da disputa foi justamente o conceito romano de actio mais precisamente
a definição do jurista Celso, reproduzida por Ulpiano, e a sua transição para o direito
pandectista. Até este marco temporal, a actio era estudada sem contraposição relevante,
mas o tema viria a ganhar um papel fundamental na própria afirmação do direito
processual como ciência e inaugura a contraposição entre a teoria imanentista e as teorias
dualistas.
Muito embora o debate sobre a ação tenha sido travado em um passado que já pode
ser qualificado como remoto para a história da jovem ciência processual, isso não significa
que sua relevância seja apenas histórica. De fato, com a afirmação da ação de direito
processual, ou simplesmente “direito de ação”, e a sedimentação da autonomia da ciência
processual, várias outras polêmicas sobre a definição conceitual da ação vieram a lume. Na
doutrina italiana, todos os processualistas clássicos dedicaram linhas para tratar do
problema e quase invariavelmente colocando-se em conflito diversas concepções do que
seria a ação.3 No Brasil, houve um relativamente recente e importante debate, consolidado
na coletânea “Polêmica em torno da ação”, da qual participaram relevantes nomes do
processo civil brasileiro e que oxigenou a clássica disputa.
Neste espaço, pretendemos resgatar, mais uma vez, a problemática em torno da ação.
Não há a pretensão de se esgotar os vários conceitos adotados, que cambiam muito em
2 “O conce ito de ação talvez seja o mais polêmico entre todos os do Direito Processual. Iniciada a
divergência há um século, até hoje não se harmonizam doutrinadores sobre o que seja ação” (BARBI, C elso
Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 1, p. 17; ver
também p. 18, aludindo ao grande número de conceitos).
3 Calamandrei chega a justificar a grande quantidade de contr ovérsias acerca do conceit o de ação na
variação da noção de Estado e da respectiva relação entre ele o cidadão, ou seja, a partir da balança liberdade
e autoridade que se p unha por trás de cad a uma das ideias defendidas: CALAMANDREI, Piero. La relatività
del concetto d’azione. Opere giuridiche a cura di Mauro Cappelletti. Napoli: Morano, 1965, v. 1, p. 429-
431. Semelhantemente, aduzindo que a ação, se observada do ângulo público ou privado leva a diversas
conclusões: MOREIR A ALVES, José Carlos. Direito subjetivo, pretensão e ação. Revista de processo. São
Paulo: RT, 1987, v. 47, p. 109.

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