Responsabilidade civil bancária

AutorAlice Saldanha Villar
Páginas117-137

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1 Responsabilidade Civil: Definição

A responsabilidade civil designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo em consequência da ofensa a direito alheio, isto é, da lesão a elementos integrantes da esfera jurídica alheia. Trata-se da obrigação de indenizar os prejuízos causados a outrem, sejam eles de ordem moral ou patrimonial. A responsabilidade civil pode decorrer tanto de ato ilícito de lesão a direito alheio, como de ato lícito, desde que haja previsão legal expressa. Como observa Rui Stoco:139A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, de impor a todos o dever de responder por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana.

2 Espécies de Responsabilidade Civil

A responsabilidade civil é tradicionalmente classificada pela doutrina especializada a partir dos seguintes critérios: a) agente (responsabilidade civil direta e indireta), b) fundamento (responsabilidade civil subjetiva e objetiva) e c) natureza jurídica da norma violada (responsabilidade civil contratual e extracontratual).

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2. 1 Responsabilidade Civil Direta e Indireta

Chama-se responsabilidade civil direta aquela decorrente de fato causado diretamente pelo agente que gerou o dano. Já a responsabilidade civil indireta refere-se às situações em que a pessoa responsável pela reparação do dano não é a causadora direta da lesão. Isso ocorre nos casos em que o agente tem vínculo legal de responsabilidade, como no caso da responsabilidade por ato de terceiro (art. 932, Código Civil), responsabilidade por fato de animal (art. 936, Código Civil) e responsabilidade pelo fato da coisa (art. 937, Código Civil).

2. 2 Responsabilidade Civil Objetiva e Subjetiva

A responsabilidade civil subjetiva é aquela que depende da existência de dolo ou culpa do agente causador do dano. Dessa maneira, a comprovação do dolo ou culpa do agente será necessária para que a vítima receba a indenização. Já a responsabilidade civil objetiva é aquela que não depende da existência de dolo ou culpa do agente causador do dano, mas apenas do nexo de causalidade entre a sua conduta e o dano causado à vítima.

O Código Civil de 2002 adotou a responsabilidade subjetiva como regra geral (arts. 86 e 187, Código Civil), ao passo que a responsabilidade objetiva é adotada como exceção (art. 927, Código Civil):

CC/2002. Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

CC/2002. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. CC/2002. Art. 927. Parágrafo único - Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (grifo nosso).

No Código de Defesa do Consumidor (CDC), a regra é a aplicação da responsabilidade civil objetiva do agente causador do dano, nos termos do disposto nos arts. 12, 13 e 14. O consumidor, portanto,

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para ter direito à indenização, precisará apenas demonstrar o nexo de causalidade entre o dano e o vício do produto ou da prestação de serviços, sendo dispensada a demonstração de dolo ou culpa do fornecedor de serviços ou produtos.

2. 3 Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual

A responsabilidade civil contratual é a que provém da falta de cumprimento ou da mora no cumprimento de qualquer obrigação, ou de um dever jurídico especial. Já a responsabilidade civil extracontratual é a que resulta da violação de um dever jurídico geral, como aqueles que correspondem aos direitos reais e aos direitos de personalidade.140

Vale dizer que: haverá responsabilidade extracontratual se o dever jurídico violado não estiver previsto no contrato, mas sim na lei ou na ordem jurídica.141Na responsabilidade extracontratual, o dano se consuma com a infração do dever legal. Assim, a mora que fundamenta a incidência dos juros moratórios existe desde o fato que levou ao pedido de reparação. É o que determina o art. 398 do Código Civil de 2002: "Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou." Dessa forma, em caso de responsabilidade extracontratual, os juros de mora incidem a partir do evento danoso. Nesse sentido, é a Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça (STJ): "Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.".

Por sua vez, em casos de responsabilidade contratual, os juros de mora incidem a partir da citação, nos termos do art. 405 do Código Civil de 2002: "Contam-se os juros de mora desde a citação inicial". Ora, se há violação à norma contratual, o contratante lesado precisa pedir judicialmente o reconhecimento da violação do contrato. Por isso, somente a partir da citação inicial começarão a fluir os juros de mora.

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3 Responsabilidade Civil Objetiva dos Bancos

Conforme se depreende do art. 3º, § 2º, do CDC e da Súmula 297 do STJ, o código consumerista é aplicável às instituições financeiras:

CDC. Art. 3º, § 2º. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (grifo nosso)

Súmula 297/STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

As instituições financeiras estão inseridas na definição de prestadores de serviços, devendo aplicar o CDC às relações jurídicas firmadas entre as instituições financeiras e os usuários de seus serviços. Sobre o tema, confira o julgado a seguir colacionado:

(...) As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. - "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. - O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. (...) (STF - ADI 2591 DF, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 29/09/2006)

Tendo em vista que o código consumerista é aplicável às instituições financeiras, a elas aplica-se a regra da responsabilidade civil objetiva objetiva decorrente do risco da atividade, descrita a seguir:

CDC. Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

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CDC. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

O sistema de responsabilidade civil no CDC "foi estabelecido tendo por base a teoria do risco da atividade: o empresário tem a liberdade de explorar o mercado de consumo - que, diga-se, não lhe pertence - e nessa empreitada, na qual almeja o sucesso, assume o risco do fracasso. Ou, em outras palavras, ele se estabelece visando o lucro, mas corre o risco natural de obter prejuízo".142Na responsabilidade civil objetiva, não se exige a demonstração de culpa ou dolo, bastando a conduta, o dano e o nexo de causalidade - ou seja, do vínculo entre a ação do agente e o dano causado - para caracterizar a responsabilidade civil e o dever de indenizar. Sobre o tema, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva observa o seguinte:143Não há lugar para a discussão da culpa, a violação do dever de cuidado objetivo, por imprudência, negligência ou imperícia, salvo quando imputada ao consumidor ou a terceiro (art. 12, § 3º, III, do CDC). O dever de reparação surge com o dano causado por defeito de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulações, apresentação ou acondicionamento do produto, ou aparece com o dano resultante de informações insuficientes ou inadequadas sobre a utilização e o risco do produto. Melhor teria sido se a lei houvesse empregado a expressão responsabilidade pelo risco do produto ou serviço, mais correta e precisa do que a expressão vaga e tradicional responsabilidade pelo fato."

Assim, nota-se que a conta do correntista é mero meio para fraude ao banco. O princípio é o de que o risco pela guarda da coisa, no caso, o dinheiro, não é do depositante, mas sim do banco...

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