Resenha de Jurisprudência

AutorSílvia Silva Vargas Marçal
CargoMestranda em Direito pela Universidade Federal do Pará na linha de pesquisa Constitucionalismo, Democracia e Direitos Humanos
Páginas141-158
RESENHA DE JURISPRUDÊNCIA
ANÁLISE DA SENTENÇA SARAMAKA VS SURINAME1 SOB A
PERSPECTIVA DE CLIFFORD GEERTZ: DIREITO E ANTROPOLOGIA
POR UM DIÁLOGO ENTRE HUMANIDADES
SENTENCE ANALYSIS SARAMAKA VS SURINAME FROM THE PERSPECTIVE
OF CLIFFORD GEERTZ: LAW AND ANTHROPOLOGY FOR A DIALOGUE
BETWEEN HUMANITIES
Sílvia Silva Vargas Marçal2
Resumo:A partir de u ma análise detalhada dos conflitos ocorridos entre o povo indígena Saramaka e o
Estado d o Suriname, no que concerne ao reconhecimento legal da capacidade jurídica coletiva desse
povo, bem como seu direi to de propriedade sobre as terras culturalmente consideradas sagradas, o
presente artigo vi sa salientar a função do Direito na compre ensão da diversidade media nte a necessária
proteção n ormativa a ser con cedida às inúmeras for mas de se relacionar presentes no mundo
globalizado. Demonstra-se que há variadas lentes pelas quais diferentes observador es vislumbram e
interagem com a realidade e qu e compete ao sistema jurídico garantir o respeito e a proteção de todas,
esquivando-se da un iformização modernament e disseminada e valorizando as peculiaridades
frequentemente invisibilizadas.
Palavras-chave: Diversidade. Proteção. Ju stiça.
Abstract: From a detailed analysis of co nflicts between indi genous people Sara maka and the State of
Suriname, regarding the legal recognition of collective legal capacit y of people and their property rights
on land considered sacred culturally, this article seeks to empha size the role of law in the u nderstanding
of diversity through th e necessar y legislative protection to be granted the many ways to relate the
present globalized world. Demonstrates that there are vari ous lenses through which different observ ers
see and interact with reality and it is for the legal system to ensure respect for and protec tion of all,
dodging the modern uniform and wide spread valuing the peculiarities often invisibilized.
Keywords: Diversity. Protection. Justice.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Modernamente, vivemos em um ambiente sócio-jurídico repleto de
complexidades produzidas, dentre outros fatores, por inúmeras alterações pelas
quais passaram as formas de relacionamento humano. Este cenário de colagens
inevitavelmente vem se r efletindo no mundo jurídico, inserindo debates por vezes
polêmicos que forçosamente conduzem a uma necessária reavaliação de nossos
institutos jurídicos e processuais, nacionais e internacionais, os quais insistem em
permanecer estáticos quando o Direito e a sociedade demandam uma constante
renovação.
Apesar da inegável ampliação no rol dos direitos humanos e fundamentais
albergados no âmbito externo e interno dos Estados, ainda observamos atônitos aos
diversos processos de exclusão social que corroboram para a compreensão de que
os Estados que se dizem Democráticos de Dir eito apenas almejam alcançar tal
patamar que compreende o respeito e a proteção da diversidade e da diferença.
1 Caso do povo Saramaka vs Suriname, sentença de 28 de novembro de 2007. Disponível em
http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articul os/seriec_172_ing.pdf. Acessado em 25/fev./2011.
2 M estranda em Direito pela Universidade Federal do Pará na li nha de pesquisa Co nstitucionalismo,
Democracia e Direitos Hu manos. Bolsista do Centro de Aperfeiçoa mento de Ensino Superior (CAPES).
Instituição Universidade Federal do Pará – UFPA. Email: sisivrg@hotmail.com.
142 Direitos Culturais, Santo Ângelo, v.6, n.1 0, p.141-158, jan./jun. 2011
A função que compete ao Direito face a essa reestruturação dos moldes
sociais que nos cercam hodiernamente, bem como a efetividade dos meios e
mecanismos capazes de realizá-la são o alvo deste debate.
1 O CASO SARAMAKA VS SURINAME: DOS FATOS
Em 27 de outubro de 2000 foi encaminhada à Secretaria da Comissão
Interamericana de Direitos Humanos denúncia de n.º 12.338 interposta pela
Associação de Autoridades Saramaka (AAS) e doze ca pitães Saramaka em seus
nomes e em n ome do povo Saramaka versando a respeito de supostas violações
cometidas pelo Estado do Suriname con tra os membros deste povo indígena.
Em 02 de março de 2006, a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos aprovou o informe de admissibilidade e de fundo nº 9/06 n os termos da
Convenção Americana se Direitos Humanos, determinando recomendações ao
Estado do Suriname. Em 19 de junho de 2006 esta mesma Comissão concluiu que
o “assunto não havia sido resolvido” tendo em vista que as r ecomendações
sugeridas ao Suriname não ha via m sido adotadas, assim, em 23 de junho de 2006,
de acordo com o ar t. 50 e 613 da referida Convenção Americana, apresentou à
Corte4 uma demanda contra o Estado do Suriname.
3 Os Saramaka acusam o Estado do Suriname de não reconhecer sua capacidade jurídica coletiva de
forma efetiva na proteção de seu direito à propriedade, bem como de não assegurar seu acesso a justiça
para pleitear proteção a seus direitos funda mentais.
4 A Corte Interamericana de Direitos Humanos foi prevista na Convenção Americana de Dir eitos
Humanos. Redigido n o âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA) em novembro de 19 69,
o pacto entrou em vigor em julho de 1978. É composta por 7 (sete) juizes. No caso do povo Sara maka
vs. Suriname, atua ram como juízes Sér gio Garcia Ramirez (pre sidente), Cecília Medina Quir oga (vice-
presidente), jurista Chilena de prestigio internacional com larga trajetória em docência e i nvestigação do
direito internacional dos direitos humanos, advogada, Licenciada em Ciências Jurídicas e Sociais pela
Universidade do Chile, Doutora em Direito pela Universidade de Utrecht na Holanda, professora de
Direito Internacional dos Direitos Humanos na Faculda de de Direito da Universidade do Chile; Manuel
E. Ventura Robles (juiz), eleito juiz da Corte Interam ericana de Direito s Humanos por um período de
seis anos, d e 01 de janeiro de 20 04, pelos Estados Partes da Convenção Americana sobre Direito s
Humanos durante a Sessão Ordi nária XXXIII Assembléia Geral da OEA, realizou várias posições, tanto
em privado e na administração pú blica, em especial no Serviço Exterior da Costa Ri ca na Embaixada da
Costa Rica, em Wa shington, DC e da Missão Permanente da Costa Rica junto à OEA. E le serviu como
secretário da Corte Intera mericana de Direitos Humanos a par tir de janeiro 1990 até dezembro de 2003.
Ele já havia servido com o secretário-assistente de dezembro de 1979 a março de 19 89. Ele também
ministrou curs os sobre t eoria do estado na Faculdade de Direito da Universidade de Costa Rica e foi
professor visitante da Universidade Autônoma da Améri ca Central (Uaçá) e da As sociação Nacional de
Desenvolvimento Econômico (ANFE). T ambém foi orador convidado de diversas in stituições
envolvidas em direitos hu manos por organismos não governa mentais e outras organizações
internacionais; Diego Gar cia Sayán (juiz), Juiz da Corte Interamericana de Dire itos Humanos desde
2003 ao presente, Diretor-geral da Co missão Andina de Juristas de Julho 2001 a julho de 20 02, Ministro
das Rela ções Exteriores do Peru de Novembro 2000 a Julho de 200, Min istro da Justiça do Peru de
Julho Novembro de 2000, Representante da oposição democrática para a Mesa Redonda "da OEA" de
maio a julho de 2000, Congressista da República de 1982 -1992e de 1994 -2000, Diretor E xecutivo da
Comissão Andina de juristas cujo statu s internacio nal privado consultivo com as Nações Unidas e
acordos de cooperação com o Alto Comissariado das Nações Unidas par a os Direitos Humanos, da
UNESCO e da Organização dos Estados Americanos, é também filiada à Comissão Internacional de
Juristas, em G enebra; Leonardo A. Franco (juiz), Internacio nalmente renomado advogado chileno com
uma longa experiência no ensino e na p esquisa internacional dos direitos humanos. Atual Presidente da
Corte Interamericana de Direitos Humanos. Advogado, Bacharel em Direito e Ciências Sociais da
Universidade do Chile, Doutor em Direito pela Universidade de Utrecht, na Holanda. É profess or da
Faculdade de Direito Internacional dos Direitos Humano s da Universidade de Chile. Professor de
Direitos Humanos da Universida de Nacional de Lanus. (Posição atual) Subs ecretário de Política Latino-
Americana do Ministéri o das Relações Exteriores, Comércio Internacional e Cu lto da Argentina.

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