Representantes dos Trabalhadores

AutorJosé Claudio Monteiro de Brito Filho
Ocupação do AutorDoutor em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Páginas302-326

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Como vimos na primeira parte, o sindicato é a entidade que coordena e defende os interesses de determinado grupo, representando-o.

Esta não é a única forma de representação dos interesses dos trabalhadores. Amauri Mascara Nascimento afirma neste sentido, dispondo, entretanto, que o sindicato é a "principal forma associativa dos trabalhadores"1

A representação dos trabalhadores ocorre de diversas formas; por diversos órgãos, entidades e pessoas e nos mais diferentes planos, como veremos mais adiante, dependendo esta ocorrência de cada ordenamento jurídico e do modelo que é ado-tado, compulsória ou espontaneamente, em cada país.

O objetivo deste capítulo é o estudo genérico dos representantes dos trabalhadores, até como passo introdutório do capítulo seguinte, onde será estudada a representação pela comissão de empresa.

Antes de iniciarmos este estudo, todavia, é preciso ressaltar que os empregadores também dispõem de seus representantes, mesmo em países que, ao contrário do Brasil, não possuem entidades patronais com personalidade sindical2, pelo que podemos dizer que, em relação a eles, existe, ainda, diversidade de representação. O tema, entretanto, em confronto com a representação dos trabalhadores, não revela tanta importância, razão pela qual, neste livro, a visão genérica oferecida na primeira parte quanto à representação dos interesses dos empregadores será considerada suficiente, sendo esta segunda parte concebida somente sob a ótica dos trabalhadores.

De se indicar, ainda, que não comporta este estudo a análise da participação dos trabalhadores na empresa, definida por Walkúre Lopes Ribeiro da Silva como "mecanismos através dos quais os trabalhadores participam da gestão, dos lucros ou do capital da empresa"3, a não ser nas hipóteses em que os representantes

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dos trabalhadores exercem alguma forma de participação, ou seja, em modelos de representação em que, por qualquer circunstância, ocorre algum tipo de participa ção4.

12.1. Definição e características gerais

A representação dos trabalhadores, como é cediço, pode tomar as mais variadas formas. Pode ser legal, voluntária, individual, coletiva. Dentro da representação no plano coletivo, pode ocorrer em relação a toda a categoria, bem como pode ser, somente, dos associados e, ainda, pode dar-se somente no seio da empresa em favor de todos os empregados desta ou apenas de parte deles. Pode também ser ordinária, extraordinária, enfim, dos mais diversos tipos.

Mais, dependendo do modelo de sindicalismo que se apresente, bem como pela forma que se tem em dado momento o trabalhador, individual ou coletivamente representado, a representação ocorrerá de diferentes maneiras, do ponto de vista de quem é o representante.

Modelos há em que o sindicato é o único representante dos trabalhadores, assim como há aqueles em que, no interior da empresa, a representação ocorre de mais de uma forma, como é, o que veremos adiante, o caso da Espanha. Para reforçar essa ideia, e a respeito do modelo espanhol, que será bem explorado mais adiante, vale a pena trazer o ensinamento de Fernando Valdés Dal-Ré, quando trata do duplo canal de representação na Espanha, e do que o diferencia dos demais países:

"O que diferencia a Espanha de praticamente todos os países de double channel é que representações eletivas e representações sindicais, comités de empresas e delegados de pessoal, que são órgãos da representação unitária ou eletiva, e seções sindicais e delegados sindicais, que são os órgãos da representação sindical, se encontram, do ponto de vista funcional [...] numa situação de equiparação. Ou seja, tudo o que pode fazer um comité de empresa pode fazer uma seção sindical ou delegado sindical e vice-versa [...] Na Espanha, os comités de empresas são sujeitos de ação sindical."5

É preciso, então, antes de dissecar os diversos tipos de representantes dos trabalhadores, verificar uma definição básica, um género que possa acolher toda a tipologia existente.

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Para isto, pode ser emprestado o significado da expressão "representantes dos trabalhadores" constante do art. 3e da Convenção n. 135, da Organização Internacional do Trabalho (OIT)6

Não que a Convenção n. 135 apresente definição genérica para os representantes dos trabalhadores, apenas é nela afirmado que são eles tanto os representantes sindicais, como os representantes eleitos diretamente pelos trabalhadores, independentemente de sua condição no seio do sindicato ou sindicatos existentes, o que nos dá a ideia necessária para uma definição genérica.

À luz do acima exposto, podemos definir representante dos trabalhadores como toda pessoa, física ou jurídica, ou órgão sem personalidade jurídica que, em virtude de permissivo, expresso ou não, do ordenamento jurídico, tenha a função de representar os trabalhadores, independentemente da forma de representação, da amplitude de seus poderes e da entidade perante a qual o mister será exercido.

É certo que esta definição poderia ser feita de forma sintética e tautológica. Bastaria dizer que representante dos trabalhadores é quem tem a função de representar os trabalhadores.

Desta forma, porém, teríamos definição por demais genérica e que, por isto mesmo, dependendo da ótica do intérprete, poderia sofrer as mais diferentes análises.

Preferimos, por este motivo, como visto, apresentar definição analítica, que permita a identificação do representante dos trabalhadores com base nas seguintes características:

  1. Consideramos como representantes dos trabalhadores tanto as pessoas naturais como as jurídicas, pois a representação ocorre por todas estas pessoas, além dos órgãos sem personalidade jurídica.

    Exemplificando com hipóteses brasileiras, observemos que, no caso do representante dos empregados, previsto no art. 11 da Constituição Federal, trata-se de pessoa física. Já na hipótese da representação dos trabalhadores pelo sindicato, temos esta exercida por pessoa jurídica7

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    Quanto aos órgãos sem personalidade jurídica, dando a esta expressão sentido bem genérico e que, no Direito Sindical, pode ser sintetizado na ideia de coalizão, são eles, em certos casos, representantes dos trabalhadores, podendo ser citada a comissão de negociação prevista no art. 4e, § 2-, da Lei n. 7.783/89 (Lei de Greve), que não é pessoa jurídica, porque não constituída na forma da lei, nem pessoa física, porque importa em um grupo, que delibera e atua em conjunto, prevendo o art. 5e da Lei de Greve até a possibilidade de ela, representando os trabalhadores, estar em juízo8

    Observe-se que estes agrupamentos de trabalhadores9, via de regra em comissão, podem ou não ter o reconhecimento do Estado; porém, mesmo quando o Estado os reconhece, dificilmente lhes dá natureza de pessoa jurídica, razão pela qual os classificamos em separado.

    Não devem, no Direito Sindical, ser considerados raridades, pois até nos primórdios do sindicalismo, os grupos de defesa dos trabalhadores formavam-se à margem da lei, sem reconhecimento estatal, e nem por isto deixavam seus atos de produzir efeitos que, às vezes, eram reconhecidos pelo próprio Estado e, com mais frequência, pelos empregadores.

    Eles surgem, em certas ocasiões, das necessidades imediatas dos trabalhadores, quando estes não podem ou não querem contar com o apoio do "seu" sindicato, como as comissões de empresa organizadas em função de conflito coletivo com o empregador, no qual os trabalhadores não têm o comando de algum representante sindical, organizando-se em separado.

    Estes órgãos, no magistério de António Menezes Cordeiro, podem ser classifica-dos como pessoas especiais, "entes dotados de 'personalidade' jurídica apenas para efeito de certos ramos normativos"10

    Mascaro, por sua vez, afirma que estes órgãos, geralmente, "não são dotados de personalidade jurídica, mesmo quando colegiados"11

  2. A representação, por sua vez, derivará de norma jurídica, independentemente do centro de positivação que a origina, contanto que a fonte seja reconhecida como de Direito Sindical12. Este é, ressalte-se, o posicionamento adotado pela OIT, na Convenção n. 135, como se verifica em seu art. 4e.

    Novamente exemplificando, as duas hipóteses aventadas anteriormente, da representação pelo sindicato ou pelo representante dos empregados na empresa, são

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    previstas no texto constitucional (arts. 8e, III e 11, respectivamente), que é, como já afirmamos, a principal fonte formal do Direito Sindical. Por outro lado, comissão de trabalhadores constituída na empresa, se facultada por ou ajustada com esta, com ou sem a participação do sindicato, para, v. g., analisar e opinar sobre toda e qualquer punição que o empregador pretenda impor aos seus empregados e prevista no regulamento da empresa, seria forma de representação dos trabalhadores, porque instituída pelo regulamento, que é, também, fonte formal de Direito Sindical, embora não a mais usual.

  3. O que efetivamente é importante é que a pessoa, física ou jurídica, tenha a função de representar os trabalhadores, independentemente de esta representação ser legal ou voluntária, de ser forma limitada ou não de representação e, por fim, de perante quem esta função seja exercida.

    Neste sentido, é representante dos trabalhadores tanto aquele que exerce a função por força de representação legal — como é o caso do sindicato e do representante dos empregados, porque deriva de poderes conferidos por norma que emana do Estado —, como quem representa voluntariamente. Nesta última hipótese, tome-se como exemplo o oferecido linhas atrás: a comissão de trabalhadores que analisa e opina sobre os casos de punição de empregados, considerando a previsão no regulamento da empresa de cláusula que...

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