Representação por Captação e Gastos Ilícitos em Campanha (art. 30-A da Lei nº 9.504/97)

AutorElmana Viana Lucena Esmeraldo
Ocupação do AutorAnalista Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral do Pará
Páginas153-165

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O art. 30-A foi introduzido na Lei nº 9.504/97 pela Lei nº 11.300, de 10 de maio de 2006, com o objetivo de preservar a higidez das contas de campanha eleitoral e proteger a moralidade, sancionando o infrator com a negação ou cassação do diploma. Essa norma veio à tona como resposta aos escândalos sociais, envolvendo a prática do “caixa 2”, representando uma grande conquista para o Direito Eleitoral.

Embora o dispositivo, em análise, refira-se a “abertura de investigação judicial”, esse termo deve ser entendido como “dar início a um processo judicial”, onde será investigado o ilícito. Por isso, alguns doutrinadores e julgados colocam essa representação como uma espécie da AIJE, aqui, conforme explanado no capítulo 2, optou-se por enquadrar como espécie de Representação, tendo em vista que as condutas que violam a lei das eleições desafiam a representação eleitoral, em regra. Sobre esse ponto vide art. 96 da Lei nº 9.504/97.

6. 1 Fundamento Legal

Está prevista no art. 30-A da Lei nº 9.504/97, introduzido pela Lei nº 11.300/06, in verbis:

Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral relatando fatos e indicando provas e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.

§ 1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, no que couber.

§ 2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado.

§ 3º O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 03 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (incluído pela lei nº 12.034, de 29 de setembro de 2009).

6. 2 Objetivo

Visa a punir condutas graves em desacordo com as regras de arrecadação e gastos de campanha, estabelecidas na Lei das Eleições, com fins eleitorais, a fim

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de garantir a igualdade de condições dos candidatos, no aspecto financeiro da disputa eleitoral, uma vez que a captação e os gastos ilícitos colocam o infrator em situação de vantagem em relação aos demais candidatos, bem como garantir a higidez e a regularidade das campanhas eleitorais, preservando a moralidade.

6. 3 Hipóteses de Cabimento

a) Captação Ilícita de recursos com finalidade eleitoral

Realização de qualquer arrecadação de recursos para a campanha eleitoral48em desconformidade com a Lei nº 9.504/97 e com as Resoluções do TSE que tenha relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição.

A conduta ilícita consiste em captar o recurso, ou seja, trazer esse recurso para a campanha eleitoral. Assim, o mero pedido ou a promessa de doação irregular por outrem, não incide no tipo descrito no art. 30-A da Lei nº 9.504/97. É necessário que haja o efetivo aporte ilegal do recurso, sendo desnecessário o seu uso. Eis alguns exemplos:

• Receber, o candidato, o partido político ou a coligação, direta ou indiretamente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas jurídicas, origem estrangeira ou de pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de permissão ou concessão de serviço público (art. 25 da Res.-TSE nº 23.463/15) – Fontes Vedadas.

• A captação de recurso, ainda que lícito, que não tenha transitado pela conta bancária específica do candidato (exceto nos casos em que a abertura desta seja facultativa).

• A arrecadação de recursos antes da solicitação do pedido de registro do candidato, ou antes da inscrição no CNPJ ou da abertura de conta bancária específica para a campanha.

• A arrecadação de recursos, de qualquer natureza, sem emitir o correspondente recibo eleitoral49.

• Recebimento de doações acima do limite legal50.

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• Recebimento de doação em forma diversa da legalmente permitida (cheques cruzados e nominais, transferência eletrônica (TED), depósitos em espécie, devidamente identificados com nome e número do CPF ou do CNPJ do doador).

Arrecadação de Recursos de Fontes Vedadas

O recurso recebido por candidato ou partido oriundo de fontes vedadas deve ser imediatamente devolvido ao doador, sendo proibida sua utilização ou aplicação financeira. Nesses casos, feita a devolução, o comprovante pode ser apresentado em qualquer fase da prestação de contas ou até cinco dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas. Se o recurso for transferido para outro órgão partidário ou candidato, caberá ao donatário fazer a devolução e responderá solidariamente pela irregularidade, cujas consequências serão aferidas por ocasião do julgamento das respectivas contas.

Cabe ressalvar que, nesses casos, se constatado que o candidato se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, a sua devolução não impede a reprovação das contas, tampouco a apuração do fato em Representação por Arrecadação e Gastos ilícitos de recursos (art. 30-A da Lei nº 9.504/97) e/ou do abuso de poder em AIJE (art. 22 da LC nº 64/90) ou AIME (art. 14, § 10, CF).

  1. Gastos ilícitos de recursos com finalidade eleitoral

A realização de qualquer gasto com a campanha eleitoral em desconformidade com a Lei nº 9.504/97 e com as Resoluções do TSE, que tenha relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição.

Exemplos:

• Uso de recursos para pagamento de gastos eleitorais que não provenham de conta específica (quando obrigatória).

• Efetuar, o candidato, gastos além do limite estabelecido em Resolução do TSE com base nos parâmetros fixados em lei, art. 18 da Lei nº 9.504/9751).

• Realização de gastos eleitorais antes do pedido de registro do candidato, antes da inscrição no CNPJ ou da abertura de conta bancária.

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• Realização de gastos eleitorais com doações em dinheiro, bem como de troféus, prêmios, ajuda de qualquer espécie a pessoas físicas e jurídicas (art. 23, § 5º, da Lei nº 9.504/97). Essa vedação vai desde a data do pedido de registro até a data da eleição.

• Realização de gastos eleitorais com a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor, bem como com a realização de showmício e de evento assemelhado para promoção de candidatos, ou a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral52(art. 39, §§ 6º e 7º, da Lei nº 9.504/97). Essa vedação vai desde o início da propaganda eleitoral lícita até a data do pleito.

• Realização de gastos com propagandas eleitorais vedadas pela lei. Exemplo: propaganda em outdoors.

• Realizar gastos acima dos novos limites do total de gastos fixados no parágrafo único do art. 26 da Lei nº 9.05/94, acrescentado pela Lei nº 12.891/13, quais sejam: - 10% com alimentação do pessoal que presta serviços à candidatura ou aos comitês eleitorais; - 20% com aluguel de veículos automotores.

Importante destacar que a captação de recursos ou os gastos devem ser sempre destinados à campanha eleitoral para que caracterize o tipo do art. 30-A da Lei nº 9.504/97. Necessário, portanto, a prova da existência do nexo de causalidade entre a captação ou o gasto ilícito e a campanha eleitoral.

Ademais, não é toda e qualquer arrecadação e gasto ilícito que contrarie as normas eleitorais que implica a imposição das sanções do art. 30-A, mas somente aquela que tenha relevância jurídica e gravidade suficiente para comprometer o bem jurídico protegido pela norma, qual seja, a moralidade das eleições. Falhas, ainda que insanáveis, não revestidas de gravidade e que não extrapolem o universo contábil, não são suficientes para atrair a sua incidência.

(...) 1. Impropriedades na prestação de contas que não comprometem a normali-dade e a legitimidade das eleições. 2. Na conformação da conduta ao art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, deve-se levar em consideração a relevância jurídica do ilícito

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no contexto da campanha, orientando-se pelo princípio da proporcionalidade (...) (TSE - AgR-AI nº 44.095/SP, rel. Min. GILMAR FERREIRA MENDES, DJE, 05/02/2016). (...) 5. As reprovações das contas de campanha dos candidatos e dos partidos políticos não atraem a aplicação automática do art. 30-A da Lei nº 9.504/97, cuja gravi-dade da sanção exige a demonstração de irregularidades capazes de comprometer a legitimidade e a normalidade do pleito eleitoral. Precedentes (...) (TSE – AC nº 29.776/PI, rel. Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, DJE, 12/02/2016)

Omissão de Gastos na Prestação de Contas - O TSE já decidiu que “a omissão na prestação de contas de campanha de despesas em percentual relevante enseja a cassação do diploma prevista no § 2º do art. 30-A da Lei nº 9.504/97” (RO nº 10-54/PI, em 05/09/2013).

A arrecadação ou gasto ilícito tipificado no art. 30-A da nº Lei 9.504/97 pode ocorrer antes mesmo da convenção partidária, desde que os recursos sejam destinados à campanha eleitoral.

Ressalte-se, por fim, que ainda que o candidato nomeie um administrador financeiro para a sua campanha, continuará responsável, solidariamente com aquele, por todos os atos praticados e...

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