A regulamentação da intersexualidade no brasil

AutorÉrika Pretes
Páginas86-104
CAPÍTULO 2
A REGULAMENTAÇÃO DA
INTERSEXUALIDADE NO
BRASIL
Iniciado por ativistas intersexuais nos Estados Unidos da
América (EUA) o debate sobre a pertinência e necessidade de
intervenção médico-cirúrgica em recém-nascidos considerados
intersexuais têm mobilizado diversos setores sociais e vários ramos
do conhecimento. Destacam-se as pesquisas realizadas pelas
ciências médicas, em especial, por setores da pediatria,
endocrinologia pediátrica, cirurgia, das ciências sociais a maior parte
das pesquisas são produzidas por profissionais da psicologia,
psiquiatria, antropologia, história e sociologia.
Tais pesquisas têm como escopo a urgência e necessidade de
cirurgias plásticas em pessoas menores de 18 anos e o livre
consentimento informado, destacam-se as pesquisas que se
baseiam nos saberes da bioética. Entretanto, como apontado por
Julie A. Greenberg, é notória a ausência de pesquisas jurídicas que
tratam das consequências das abordagens médicas realizadas em
pessoas menores de 18 anos.1
No Brasil, ainda são raríssimos os trabalhos acadêmicos na
área do direito que tratem da temática da intersexualidade, cirurgias
plásticas normalizadoras em recém-nascidos e seus
desdobramentos jurídicos.2 A pesquisa jurisprudencial resta
comprometida em razão de tratar-se de questões envolvendo
direitos personalíssimos de pessoas menores de 18 anos, que
correm em segredo de justiça.3
As pesquisas que tangenciam a temática direito ao próprio
corpo e autodeterminação dos sujeitos são realizadas, no Brasil, em
grande parte por juristas que trabalham com bioética e biodireito.
Não temos regulamentação sobre a autodeterminação das pessoas
menores de 18 anos para tomada de decisões em procedimentos
médicos tal qual ocorre em Portugal.4
A Resolução 1.664/2003-CFM publicada no diário oficial no
dia 13 de maio de 2003, define as normas técnicas de manejo e
tratamento daquilo que o Conselho Federal de Medicina (CFM)
considera como Anomalias da Diferenciação Sexual (ADS) e
estabelece as normas técnicas para o tratamento da
intersexualidade em território nacional. A resolução busca dar
amparo técnico e legal aos profissionais de saúde no gerenciamento
médico dos casos em que o paciente – especialmente no manejo de
recém-nascidos for diagnosticado com alguma condição intersex
ou genitália ambígua.5
Aníbal Guimarães Júnior destaca que até o ano de 2003 não
existia, no Brasil, nenhuma norma ou protocolo médico estabelecido
pelo Ministério da Saúde ou Conselho Federal de Medicina (CFM)
para o devido gerenciamento médico da intersexualidade. Até então
cada profissional da saúde procedia de acordo com seus próprios
conhecimentos técnicos sobre o assunto.
2.1. A Recomendação nº 001091/01-8
No ano de 2001, a Promotoria de Justiça Criminal de Defesa
dos Usuários dos Serviços de Saúde do Ministério Público do
Distrito Federal e Territórios (MPDFT) atuou em dois casos de
pacientes intersex atendidos pela rede de saúde do Distrito
Federal.6 Ao constatar a inexistência de norma ou protocolo de
atendimento para tais pacientes, o MPDFT encaminhou a
Recomendação 001091/01-8, “aos diretores e médicos de
hospitais, clínicas e congêneres, públicos e privados, localizados no
Distrito Federal” orientando que as intervenções cirúrgicas em
crianças nascidas com genitália ambígua poderiam ser
realizadas após consulta ao Ministério Público.7
Os casos em que a o MPDFT atuou são mencionados na
Recomendação, entretanto, não tivemos acesso aos autos por se

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