Regulação da terceirização e estratégias empresariais: o aprofundamento da lógica desse instrumento de gestão da força de trabalho

AutorVitor Filgueiras
CargoDoutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia, Pós-doutorado em Economia pela Universidade Estadual de Campinas, Auditor Fiscal do Ministério do Trabalho (Brasil), E-mail: fvitor@hotmail.com
Páginas65-93
Regulação da terceirização e estra tégias empresaria is...
Caderno s do CEAS, Salvador, n. 239, p. 742-770, 2016.
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REGULAÇÃO DA TERCEIRIZAÇÃO E ESTRATÉGIAS
EMPRESARIAIS: O APROFUNDAMENTO DA LÓGICA DESSE
INSTRUMENTO DE GESTÃO DA FORÇA DE TRABALHO
Resumo
Este texto analisa a recente expansão das
modalidades de denominaras formas de
organização do trabalho no Brasil,
particularmente por meio da terceirização, e
sua relação com o processo de regulação, pelo
Estado, da limitação da exploração do trabalho.
O objetivo geral do artigo é discutir o processo
de incremento das tentativas de externalização,
pelos tomadores de serviços, da incidência da
regulação protetiva do direito do trabalho. A
regulação da terceirização do trabalho pelo
Estado brasileiro, em que pese a flexibilização
trazida pela Súmula 331 do Tribunal Superior
do Trabalho, no início da década de 1990,
impõe condições, ainda em vigor, que têm se
mostrado como restrições muito superiores
àquelas que os empregadores estão dispostos a
cumprir. Nos últimos anos, tem crescido em
modalidades e relevância a adoção de
diferentes terminologias, pelas empresas, para
definir suas relações produtivas: sistema de
integração, contrato de compras, venda de
frutas no “pé”, contrato de facção,
incorporação, aluguel de cadeira, são algumas
das designações utilizadas pelas empresas para
definir os arranjos formatados nos seus
processos produtivos. Argumenta-se que a
regulação do Estado, ao invés de apreender a
terceirização como uma estratégia de gestão da
força de trabalho, normalmente admite o
pressuposto do aprofundamento da divisão
social do trabalho e, consequentemente, a
dicotomia entre boa e terceirização; desse
modo, as instituições estatais não apenas
deixam de contribuir para eliminar a
terceirização, como tendem a admitir os novos
jogos de palavras dos empregadores,
renovando ou radicalizando a externalização
de responsabilidades.
Palavras-chave:Regulação. Terceirização.
Novas formas de produção.
Vitor Filgueiras
Doutor em Ciências Sociais pela Universidade
Federal da Bahia, Pós-doutorado em Economia pela
Universidade Estadual de Campinas, Auditor Fiscal
do Ministério do Trabalho (Brasil), E-mail:
fvitor@hotmail.com
1INTRODUÇÃO
Este texto analisa a recente expansão das modalidades de denominação da
organização do trabalho assalariado no Brasil, particularmente por meio da terceirização, e
sua relação com o processo de regulação, pelo Estado, da limitação da exploração do trabalho.
A regulação da terceirização do trabalho pelo Estado brasileiro, em que pese a
flexibilização trazida pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) no início da
década de 1990, impõe condições, ainda em vigor, que têm se mostrado como restrições
muito superiores àquelas que os empregadores estão dispostos a obedecer. Evidência disso
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Caderno s do CEAS, Salvador, n. 239, p. 742-770, 2016.
são as reiteradas campanhas empresariais, em todos os Poderes do Estado, com o intuito de
conseguir permissão para adotar a terceirização em todas as atividades das firmas.
As aspirações empresariais têm encontrado dificuldades para se consumar porque,
dentre outros fatores, diferentes agentes sociais (como a academia) têm evidenciado,
reiteradamente, que os trabalhadores terceirizados são vítimas preferenciais da sonegação de
direitos, das formas extremas de exploração e dos acidentes
1. Nesse cenário, os casos
concretos de terceirização analisados pelas instituições do Estado são muitas vezes
considerados ilegais ou, no mínimo, são impostas às empresas contratantes, em maior ou
menor medida, repercussões em termos de responsabilização frente às lesões sofridas pelos
trabalhadores.
Concomitantemente, tem crescido em modalidades e relevância a adoção de
diferentes terminologias, pelas empresas, para definir suas relações produtivas: sistema de
integração, contrato comercial de compras, venda de produtos “em pé”, contrato de facção,
são algumas das designações utilizadas pelas empresas para definir os arranjos formatados
nos seus processos produtivos. Alguns termos não são novos, contudo, ganham outra
dimensão na atual conjuntura. Em comum, eles têm como fundamento refutar não apenas a
relação de assalariamento entre trabalhador e contratante, mas também a existência de
terceirização.
O problema aqui analisado é: qual a relação entre a expansão do uso de diferentes
terminologias, pelas empresas, para arranjos de organização do trabalho que se apresentam
como distintos da terceirização e a regulação do direito do trabalho pelas instituições públicas
no Brasil?
O objetivo geral do texto é discutir o processo de incremento das tentativas de
externalização, pelos tomadores de serviços, da incidência da regulação protetiva do direito
do trabalho. Os objetivos específicos são: 1) analisar como a ocultação da relação entre
tomador e trabalhador se associa à lógica da terceirização, como estratégia de gestão do
trabalho; 2) entender as contradições do padrão de atuação das instituições de regulação do
direito do trabalho relativamente ao uso dessas estratégias precarizantes pelos empregadores.
1 Ver, por exemplo, Coutinho (2015), Filgueiras (2015), Filgueiras e Druck (20 14), Filgueiras e Dutra (2014),
Filgueiras e Cavalcante (2015b), Silva (2013).

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