Reflexões atuais acerca dos princípios constitucionais eleitorais e outros informativos

AutorDaniel Castro Gomes da Costa - Tarcisio Vieira de Carvalho Neto
Páginas17-31

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1. Introdução

O Sistema Eleitoral Brasileiro é regido por um Código ultrapassado e caduco, da década de 1960, sob a batuta do regime militar, e é regulamentado por diversas leis esparsas e a cada eleição por Resoluções editadas pelo TSE.

Desta forma, apesar de existir diversos projetos de reforma eleitoral, o certo é que o Direito Eleitoral não acompanhou a evolução dos tempos modernos, formado por uma "colcha de retalhos" de fragmentos legislativos, e por uma base arcaica com conceitos abertos, daí a importância da aplicabilidade dos princípios para enxertar os vácuos existentes.

Assim sendo, há uma gama de princípios constitucionais, processuais, penais e entre outros ramos que são aplicados ao Direito Eleitoral, que tem a sua aplicação garantida com o objetivo de abalizar o arcabouço deste sistema jurídico especializado, bem como explica, justifica ou infirma a validade jurídica de diversos institutos desta seara, como também serve para regulamentar casos concretos, suprindo as lacunas legislativas.

Neste pequeno estudo, logicamente sem nenhuma pretensão de esgotar o assunto e nem classificar os mais importantes, mas de apresentar uma proposta refiexiva necessária à Justiça Eleitoral, criando um ambiente de sustentabilidade do complexo da normatividade eleitoral.

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2. Princípios tipicamente de Direito Eleitoral
2.1. Princípio da Democracia

O termo Democracia tem origem etimológica: demos = povo; e kratos = poder. Assim, extrai-se que a democracia nada mais é do que um sistema de governo em que o povo participa de modo efetivo ou de forma representativa dessa administração de governo. Também conhecido como governo do povo, mas é resumidamente sistema de governo fincado na soberania popular.

O princípio da Democracia está insculpido na Carta Magna já no artigo inaugural, art. 1º, parágrafo único, que diz: "todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição", e apresenta nosso país como um Estado Democrático de Direito.

Tem-se então a democracia representativa ou indireta, e a direta. A demo-cracia representativa derivou da inviabilidade de consulta direta à totalidade do povo para tomada de decisões de interesse geral, passando a ser exercida de modo representativo, em que alguns cidadãos são eleitos a mandato temporário, exercendo cargos políticos e que de modo indireto irão representar os interesses do povo.

Em contrapartida, a Constituição Federal também alberga a Democracia Direta, que é o conjunto de instrumentos colocados à disposição do povo, para que este diretamente participe das tomadas das decisões políticas.

O art. 14 da CF estampa esta proposta:

"Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

I - plebiscito;

II - referendo;

III - iniciativa popular."

No plebiscito, o povo é convocado a participar através do voto, de modo anterior ao ato legislativo ou administrativo, para autorizar ou denegar o Parlamento a discutir e deliberar sobre determinada matéria.

Já o referendo, os cidadãos são convocados a votar posteriormente ao ato legislativo ou administrativo para ratificá-lo ou rejeitá-lo, e assim outorgar ou denegar a validade a um comando legislativo adrede aprovado pelo Congresso.

A iniciativa popular é o instrumento pelo qual o próprio povo encaminha os projetos de leis, defiagrando o nascedouro do processo legislativo, permitin-

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do que determinada matéria seja submetida ao crivo do Parlamento, mesmo que nenhum parlamentar se predisponha a tal mister.

Desse princípio decorre outros, como o do pluralismo político, interligado e decorrente a essa opção constitucional - inclusive é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, V da CF).

O respeito ao pluripartidarismo garante o modelo democrático, porque assegura a participação dos mais diversos segmentos da sociedade no processo político, e afasta qualquer implantação de regimes totalitários, baseado no acolhimento de um único partido único, ou mesmo concentrado no bipartidarismo, como ocorreu na época da ditadura no Brasil, e como ocorre em diversos países latino-americanos.

O impedimento ou sufocamento de criação de novos partidos políticos, ou mesmo a extinção de partidos denominados de "nanicos" deixa o Estado manietado por ideologia anêmica, que já não expressam a vontade popular. Por isso, o pluralismo partidário é sadia à democracia, já que congrega expressões ideológicas polisêmicas de diversos segmentos ou setores da sociedade.

O princípio da democracia, sem dúvida, manifesta e infiuencia todo o direito eleitoral.

2.2. Princípio da Anualidade Eleitoral

O princípio da anualidade eleitoral tem a sua previsão original expressa no art. 16 da Carta Magna e que teve a seguinte redação:

A lei que alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação.

Alterado com a Emenda Constitucional nº 4, de 15.09.1993, apenas para esclarecer e diferenciar a vigência de eficácia, passando sua redação final e atual assim:

"A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data da sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência."

Este princípio é considerado muito importante para a democracia, porque evita o açodamento de mudança no processo eleitoral, seja em matéria sobre o alistamento eleitoral, registro de candidatos, propaganda, votação, apuração, diplomação, quaisquer atos que atinge o processo eleitoral.

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Evita-se, com isso a mudança na "regra do jogo após o início da partida", para não surpreender as partes envolvidas. Impedem-se com isso as leis casuísticas que inevitavelmente levariam ao abuso do poder político e econômico, como também haveria possível desigualdade de condições, que deve se combater entre os candidatos na disputa do certame eleitoral.

Desta feita, a lei que de algum modo alterar o processo eleitoral deve ser publicada um ano e um dia antes da data da eleição, que pela sua previsão ocorre no primeiro domingo de outubro, conforme dispõe o art. 77 da Constituição Federal e art. 1º da Lei n. 9.504/77, para surtir a sua eficácia e aplicabilidade às eleições do ano vindouro.

Então, a lei deve ser publicada, não exige promulgação, no mínimo um ano e um dia antes das eleições. Com efeito, se pelo calendário eleitoral, por exemplo, as eleições do primeiro turno do ano de 2014 serão no dia 2 de outubro, eventual lei que altere o processo eleitoral deveria ter sido publicada até o dia 01 de outubro do ano antecedente, para produzir efeitos imediatos nestas eleições.

Logo, respeitados estes limites temporais - um ano e um dia - a vigência da lei ocorrerá de pronto na data da publicação, e ingressa imediatamente no ordenamento jurídico, como também terá sua eficácia plena e imediata a esta mesma data. Do contrário, publicada a lei até um ano antes das eleições, a vigência continua sendo imediata, porém não terá eficácia para as eleições em curso, ficando contida para as próximas eleições.

É bom destacar que o princípio da anualidade foi erigida a cláusula pétrea no julgamento da ADI n. 3685 pelo STF, por representar a segurança jurídica insculpida no art. 5º, "caput" da Constituição Federal. Assim sendo, nem por emenda constitucional pode ser aniquilado ou modificado referido princípio.

Logicamente, não se observa a este princípio na edição das resoluções expedidas pelo TSE e TRE’s dos Estados.

O Colendo Supremo Tribunal Federal ao julgar procedente o pedido formulado na Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 3.685, que questionava a EC nº 52, por 9 a 2 votos, decidiu que as novas regras que põem fim a verticalização só poderiam ser aplicadas após um ano da vigência da emenda, ou seja, não valeriam para as eleições de 2006.

No acórdão em comento, o saudoso Ministro Carlos Aires Britto tece explicações e defesa ao princípio da anualidade como corolário lógico do regime democrático, a saber:

"... trata-se de um tema delicado. Uma pecinha de cristal. Vou enfrentá-lo, ainda que sinteticamente, na perspectiva de uma visão constitucional de conjunto.

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2. Começo por dizer que o art. 16 da Constituição de 1988, em sua redação originária, tinha a seguinte legenda: ‘Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral só entrará em vigor um ano após sua promulgação.’ 3. Sem nenhum vacilo de interpretação, percebe-se que o dispositivo condicionava ao transcurso de 1 ano completo o vigor das leis que viessem a modificar o processo eleitoral. Isto naturalmente, para obrigara descoincidência entre o ano de alteração das regras do jogo eleitoral e o ano de realização da eleição em si. Logo, e em última análise, o que veiculava o texto normativo era a proibição de uma lei vir a alterar as normas presidentes de uma...

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