Redes de votação no Supremo Tribunal Federal

Páginas81-112
Capítulo 3
Redes de votação
no Supremo Tribunal Federal
Quem são os ministros do STF
Danelski (1967) reconhece que as cortes são corpos colegiais que to-
mam decisões baseadas na regra da maioria. Como consequência, os
juízes não podem atingir suas metas atuando individualmente. Um juiz
depende das preferências e das atitudes dos outros juízes do tribunal.
Partindo desta afirmação, neste capítulo vamos olhar para a forma como
os ministros do STF se agrupam para decidir os casos. Mas antes de
procedermos a essa análise, é interessante olharmos para o perfil desses
ministros.
Gadamer (1997) afirma que não existe um processo mecânico para
a determinação do significado de um texto. E na medida em que não
existe tal processo mecânico, a discus são sobre o significado dos textos só
se torna possível em decorrência de uma tradução cultural comum. Para
melhor explicitar essa ideia, o autor utiliza a ideia de horizonte, afirmando
que as pessoas têm a capacidade para ver até os limites de seus respectivos
horizontes, mas não além deles. Com isso, valoriza o papel do contexto
na compreensão e na interpretação. Da importância do contexto decorre
a importância da “posição estrutural” ocupada na sociedade.
Justiça, profissionalismo e política
82
A afirmação de Gadamer se aplica ao caso dos juízes. Os juízes só
podem discutir sobre o significado das leis e dos textos jurídicos porque
compartilham um “horizonte” comum. Daí a necessidade de considerar-
mos na análise o perfil dos ministros do STF, uma vez que esse perfil vai
influir na forma como esses mini stros se posicionam em face das questões
levadas ao julgamento do tribunal.
Levantamos o perfil desses ministros considerando suas trajetórias
de carreira, o local em que obtiveram o título de bacharel em direito, a
passagem por cargos políticos eletivos ou de primeiro e segundo esca-
lão, o fato de terem estudado no exterior e o presidente que os nomeou.
Consideramos que diferenças no sistema de treinamento dos ministros e
no padrão de carreira que eles seguem depois de formados resultam em
diferenças no padrão de comportamento de voto e argumentação. Aqui
observaremos como essas diferenças se ref letem na forma como os minis-
tros se agrupam para votar — no capítulo 4, consideraremos o peso dessas
diferenças juntamente com os fatores dos casos para a determinação do
resultado da decisão e o comportamento de voto individual dos ministros.
As 300 ações selecionadas em nossa amostra envolveram a participação
de 18 ministros que fizeram parte do STF entre outubro de 1988 e março
de 2003.25 E são os dados desses ministros que passamos a discutir agora.
No que se refere à trajetória de carreira, notamos que há um equi-
líbrio no tribunal entre magistrados de carreira e não magistrados, uma
vez que dos 18 ministros que fazem parte da nossa amostra oito tiveram
carreira na magistratura.
Dos que não tiveram carreira na magistratura temos dois proceden-
tes do Ministério Público, na posição de procurador-geral da República,
três ministros da Justiça, um advogado-geral da União, um ministro do
Tribunal de Contas da União, um ministro das Relações Exteriores, um
chefe do Gabinete Civil da Presidência da República e um secretário-
-geral da Consultoria-Geral da Presidência da República. Lembrando
que mesmo os ministros que saíram de postos políticos para ocupar uma
25 Os ministros Djaci Alves Falcão, Luiz Rafael Mayer e Oscar Dias Corrêa zeram parte do STF
no período enfocado até o ano de 1989, mas não foram sorteadas ações nas quais eles participaram.
Redes de votação no Supremo Tribunal Federal
83
vaga no STF tiveram carreiras anteriores no direito, como advogados ou
membros do Ministério Público.
Gráfico 1
Trajetória de carreira dos ministros que integraram o STF
entre outubro de 1988 e março de 2003
Procurador-geral
da República
11% Ministro da Justiça
17%
Advogado-
-geral da União
6%
Magistrado
43%
Ministro do TCU
6%
Político
17%
Isso demonstra que o perfil de carreira dos ministros deixou de ser
predominantemente de magistrados, como era até 1978 (Oliveira, 2011)
e passou a englobar carreiras diferenciadas, abrindo maior espaço aos
“políticos”, que são em sua grande maioria ligados ao Ministério da Jus-
tiça. A diferenciação está presente também na maior abertura às outras
profissões do mundo jurídico, em especial ao Ministério Público.
Gráfico 2
Ministros que integraram o STF entre outubro de 1988
e março de 2003 e que tiveram experiência na política
Sim
50%
Não
50%
A experiência na política refere-se ao fato de o ministro ter ocupado al-
gum cargo eletivo ou de nomeação do primeiro e segundo escalão. Também
aqui há um equilíbrio, com nove dos 18 ministros tendo ocupado algum
cargo político em sua trajetória de carreira antes de chegarem ao STF.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT